Sinto uma doce melancolia quando contemplo minha caixa de e-mails abarrotada. São tantos e tão suculentos... Nem falo dos milhares a responder. Não. Penso naqueles que são enviados apenas com o intuito de me informar a propósito de algum tema relevante. Quantas pedras preciosas não se esconderão ali, quantas novidades que poderiam enriquecer minha cultura e me tornar uma pessoa melhor, e não consigo ler tudo...
Nesta terça-feira, dei o que, no século 20, se chamaria de “passada d’olhos” pelos e-mails. Fui rolando o mouse como se folheasse uma revista, e me encantando. Havia um sobre o Ken Humano. Aliás, existem diversos Kens Humanos, sabia? Um deles virou transexual. No caso, virou a Barbie. Sério, foi ele (a) quem disse isso. Vi as fotos de antes (Ken) e depois (Barbie). São bem impactantes.
Um e-mail mais antigo contava que 29 de agosto se tornou o Dia Internacional do Gamer, o que deve ter sua importância.
“Você gostaria de viver em um ambiente mais acolhedor e produtivo?”, perguntava o seguinte. Respondi para mim mesmo que sim. Gostaria. Tomada essa decisão, fui em frente.
Lá estava: “Como diferenciar gagueira, disfemia e disfluência”. Eis um artigo útil. Porque certamente não sei qual é a diferença entre gagueira, disfemia e disfluência. Conheço alguns gagos, mas nenhum disfêmico ou disfluente. O meu amigo Carlos Wagner, um dos repórteres mais premiados da história do jornalismo brasileiro de todos os tempos, é meio gago – já foi mais. Um dia, quando era mais, estava no carro da Zero, em viagem pelo interior, e pediu para o motorista parar num desses armazéns de beira de estrada, para comprar um carrinho de brinquedo para o filho. Entrou na loja e cumprimentou o atendente:
“Bo... bo... bom dia!”
O outro respondeu:
“Bo... bo... bom dia!”
O Wagner pensou: esse cara está de sacanagem. Mas resolveu não se deixar provocar. Continuou:
“Quan... quan... quan... quanto é esse ca... ca... carrinho?”
“É trin... trin... trin... trinta r-r-r-rrre-reais!”
Aí o Wagner se irritou:
“Que que f-f-f-foi, seu sssem-vvvvergonha?”
“Sssssem-vvvvergonha é t-tu!”
E se puseram a discutir furiosamente. Dois gagos, ambos achando que o outro estava gozando da sua gagueira. Ou disfemia ou disfluência, vá saber.
Alguns e-mails que recebo me oferecem dinheiro. Por Deus. Tem uma senhora generosa da Coreia do Sul que, sabendo-se no fim da vida, quer me dar sua herança, porque não tem filhos. Basta eu fornecer meus dados bancários e responder algumas outras perguntinhas para ela depositar na minha conta.
Outro: “Veja Urszula Radwanska em um minivestido que abalou a internet”. Uau! Desculpe, mas tive de ver aquele minivestido dentro do qual estava Urszula Radwanska, abalando a internet. Abri as fotos. Descobri que Urszula é uma tenista polonesa. Seu vestido era, de fato, mini, mas não fiquei abalado. Sou mais resistente que a internet.
O próximo foi uma descoberta sensacional: “Edward Niño Hernández, da Colômbia, é o menor homem do mundo”. A matéria era ilustrada por uma foto de Edward ao lado de um labrador bege mais alto do que ele. Interessante.
Houve dois e-mails que atirei direto no lixo. Um, em letras maiúsculas, jurava: “ESSA MENSAGEM É IMPORTANTE”. Se é importante, não precisa tamanha eloquência. Fora! O segundo falava de alguma mulher “poderosa e empoderada”. Não leio nada que contenha a palavra empoderada. Dá azia. Fora!
São milhares de e-mails se oferecendo. Muitos tentadores, como: “Em quarentena, Viviane Bordin faz a alegria dos seguidores postando fotos de biquíni”. Como não ver essas fotos que fazem as pessoas alegres? Vi. Fiquei um pouco alegre.
Tinha também: “Por que elas gostam tanto das preliminares”.
Ou: “Dicas sobre como abrir um brechó”.
E: “Ken Humano fica solteiro na quarentena”. Mas não se espante, não é o Ken que se tornou Barbie. É um certo Ítalo Costa, que, no texto, “revelou os motivos que levaram à sua separação”. Não li acerca dos motivos, mas não me surpreendi. Os Kens Humanos são instáveis. Aprendi isso passeando pelos ricos caminhos da minha caixa de e-mails.