Você já viu um porco morrendo? Ou, antes, já “ouviu”? É uma experiência aterrorizante. O porco grita e guincha e se debate em tamanho desespero que você sente vontade de correr para salvá-lo e cuspir na cara do humano assassino. Agora imagine o que deve ser um matadouro de suínos. Pois Chicago, no século 19, era conhecida por seus matadouros. Em nenhum lugar do planeta matava-se mais porcos do que em Chicago. Leia essa descrição da visita de um grupo de pessoas ao mais famoso desses lugares, a Union Stock Yards:
“Eles observaram os porcos, numa procissão infindável, sendo suspensos pelos pés e logo levados, aos berros, pelo cabo para as câmeras de abate; lá, homens com facas encrostadas de sangue habilmente lhes cortavam a garganta. Os porcos, alguns ainda vivos, eram mergulhados num tanque de água fervendo, e submetidos a uma raspagem dos pelos – pelos esses que eram guardados em recipientes debaixo das mesas de raspagem. Ainda exalando vapor, cada porco ia passando de uma posição para outra, onde homens empapados de sangue executavam com uma faca as mesmas incisões, vezes sem conta, até que, à medida que o porco avançava, postas de carne úmida começavam a desabar com uma pancada surda nas mesas.”
Ao terminar esse parágrafo de “O Demônio na Cidade Branca”, do jornalista americano Erik Larson, por Deus, quase virei vegetariano. Mas o tema central do livro não são os métodos da indústria de processamento de carne suína no século 19. O tema central, na verdade, são dois. Um é a feira mundial realizada em Chicago em 1893, evento que transformou a cidade e onde, entre outras novidades, foi inventada a roda-gigante.
Larson relata com minúcias o trabalho dos arquitetos que montaram a feira, é muito interessante. Um dos personagens é o genial Olmsted, urbanista que morava na mesma cidade em que morei, Brookline, e que foi o responsável pelo planejamento do Central Park, de Nova York. Essa parte do livro deveria ser lida nas faculdades de arquitetura.
A outra parte é mais sombria. É a história do primeiro serial killer americano, H.H. Holmes, que estava no grupo em visita ao matadouro – ele e duas de suas vítimas. Esse homem nasceu em meados do século 19 em New Hampshire, estado do Nordeste extremo, a região mais civilizada do país. Como acontece com muitos psicopatas, Holmes era filho de um pai violento e abusivo. Apesar disso, ele era brilhante na escola. Os outros alunos, invejosos de seu desempenho, perseguiam-no. Faziam bullying. Um dia, para assustá-lo, pegaram-no à força e o levaram para a consultório de um médico, onde havia um esqueleto humano. Eles o trancaram na sala e o deixaram ali. Mas Holmes, em vez de se amendrontar, ficou fascinado. A visão do esqueleto acionou algum botão sinistro dentro dele.
Adulto, Holmes tornou-se médico e começou sua carreira de crimes. Até então, o único serial killer conhecido era Jack, o Estripador, muito famoso, mas uma bandeirante, se for comparado a Holmes: Jack matou seis mulheres em Londres; Holmes foi condenado por 27 assassinatos, mas suspeita-se que tenha sido o autor de cerca de 200. Ele próprio, depois de preso, dizia estar se transformando no demônio. E Erik Larson, apesar do seu materialismo jornalístico, relacionou fatos que mostraram que isso podia ser verdade. Holmes não apenas tinha prazer de matar, ele se comprazia ao admirar o sofrimento e a impotência de suas vítimas, algumas delas crianças pequenas.
Não vou me aprofundar, para não dar spoiler. Leia o livro. Depois me conte que tal. Acho que você vai gostar.