Há, exatamente, 5.067 pizzarias em São Paulo. Li isso em um jornal que o Alexandre Barreto me enviou.
O Alexandre Barreto é um amigo gaúcho que mora na capital paulista e, aos domingos, sem falta, janta em alguma pizzaria da cidade. Se ele não quiser repetir pizzaria paulistana, tudo bem, pode ir todos os dias a uma diferente durante 13 anos e oito meses.
Sinto-me atraído por esse gênero de projeto. Conhecer todas as 1,2 mil Ilhas Maldivas, comer todos os 1,5 mil tipos de cachorro-quente da Alemanha, ler todos os 88 romances da Comédia Humana, de Balzac. Se fizesse algo assim, sei que teria uma sensação agradável de dever cumprido. Disse que ia fazer, e fiz. Seria algo a se jactar nas mesas de bar. Mas e as outras coisas que esperam para ser provadas, como renunciar a elas? Porque a vida, afinal, é feita de escolhas e, por consequência, de perdas. Ao optar por um caminho, você desistiu dos outros. Cinco mil noites de pizza significam cinco mil noites sem bacalhau à Gomes de Sá, sem filés à parmegiana e sem, oh!, tagliatelli al ragu.
Agora mesmo, renunciei aos Estados Unidos para voltar ao Brasil.
– Mas não estava bom lá? – perguntam-me alguns, não sem certa malícia, ao que respondo com nenhuma:
– Estava.
– Você não gosta tanto daquele lugar? – eles insistem, e concordo:
– Gosto!
Mas o Brasil é a minha casa. Você decerto gostaria de passar alguns dias em um daqueles hotéis seis estrelas, como o Saint Andrews, de Gramado, mas, ao cabo de algum tempo, quererá voltar para casa, porque só em casa você se sente de fato à vontade. E foi exatamente o que aconteceu comigo e com a minha família. Nós queríamos voltar para casa.
Já fiz muitas renúncias na vida, e procuro não me arrepender delas. Procuro olhar para frente.
Já fiz muitas renúncias na vida, e procuro não me arrepender delas. Procuro olhar para frente. Mas as renúncias que mais me custaram, as que mais doeram foram renúncias a mim mesmo. É sério, não estou fazendo psicologia de Facebook. É algo que experimento na prática e que, suponho, você também experimenta de vez em quando.
Chega um momento da vida em que uma parte de você já não tem mais validade, você tem de arrancá-la, jogá-la fora e ir embora. Isso ocorre devido a várias circunstâncias, e a principal delas é o tempo. O passar dos anos não muda apenas a elasticidade dos seus músculos e a cor dos seus cabelos: muda o seu espírito. Você se transforma em outro, com outras necessidades e vontades, e agora terá de abdicar de antigos hábitos, de vidas já vividas. Isso é bastante difícil. Tem gente que não aceita que mudou, não admite desistir de nada, e aí o sofrimento é inevitável.
Uma renúncia bem feita, uma desistência consciente, uma abdicação serena podem ser um alívio. Podem ser o caminho para a paz.
Portanto, nada de temer na hora de fazer escolhas. Não terei meus 5 mil dias de pizza paulista. Ficarei com meu modesto arroz de carreteiro gaúcho.