Quando entra dezembro, com seus sinos bimbalhantes, voltam à TV os clássicos anúncios institucionais de fim de ano. Gostava daquele da Varig, Papai Noel voando a jato pelo céu. O Zaffari também sempre lança uma propaganda interessante. Faz a gente chorar. Mas os imbatíveis são os da RBS e da Globo – por causa das músicas. Sem tocar as músicas da RBS e da Globo no fim do ano, o ano não acaba. É como Carnaval sem Mamãe Eu Quero.
Aliás, tem algum problema com Mamãe Eu Quero? Sei que muitas marchinhas de Carnaval foram vetadas por sua incorreção política. A mulata bossa-nova, a que caiu no hully gully, por exemplo, caiu também na polêmica, porque "mulato" vem de "mula". A associação é óbvia – a mula é um animal híbrido, cruza de jumenta com cavalo ou de égua com jumento, enquanto mulato é o filho de homem branco com mulher negra ou vice-versa. A origem da palavra, então, é racista, mas será que a palavra ainda o é? As palavras vão evoluindo conforme o uso, seu sentido pode se transformar tão radicalmente, que elas, depois de adultas, muitas vezes não têm mais nada a ver com a forma como nasceram.
Hoje, todo mundo odeia a maldita versão da Simone. Mas houve tempo em que esse troço era executado em todo o comércio no mês de dezembro.
No caso da mulata, não noto sentido pejorativo. Ao contrário, a mulata surge como uma espécie de prova de sucesso da miscigenação, o produto refinado da mistura de raças, um libelo contra a eugenia e a favor da pluralidade étnica. Viva a mulata! Abaixo o preconceito!
Mas eu falava de músicas de fim de ano, não de Carnaval. Aqui em Boston, tem uma rádio, a 106.7, que, já em novembro, começa a tocar músicas de Natal o dia inteiro, sem descanso, e só para depois do Ano-Novo. Já escrevi sobre essa rádio, todas as lojas ficam sintonizadas nela, nesta época do ano. É irritante.
Tenho implicância com temas de Natal por causa daquele crime que a Simone fez com a música natalina do John Lennon. Então é Natal, a festa cristã... Hoje, todo mundo odeia a maldita versão da Simone. Virou unanimidade. Mas houve tempo em que esse troço era executado em todo o comércio no mês de dezembro. Você passava em frente às Lojas Americanas na Rua da Praia e a Simone estava cantando "pro rico e pro pobre num só coração". Então, traumatizei. Qualquer dingobéu me dá coceira.
Já do tema da Globo eu gosto, principalmente porque aparecem aqueles artistas cantando na TV. Fico imaginando que eles estão numa festa e que é muito divertido. Claro que sei que não é assim, é uma gravação, eles estão ali a trabalho, deve ser inclusive bastante cansativo, mas é bom pensar em uma festa com aquela turma. Lembro de uma festa de fim de ano que fiz uma vez, em Santa Catarina. Fiz a festa na minha casa e foi uma má ideia, porque, na manhã seguinte, parecia que meus convidados eram das hordas de Átila, o Huno. Houve até um episódio em que uma morena chamada... Mas como é que cheguei aqui? Queria, na verdade, escrever sobre algo um pouco maior do que anúncios institucionais de TV e festas de Ano-Novo, como o confronto entre a vida e a morte. A vida e a morte merecem uma coluna só para elas. Deixo para amanhã.