Chegamos a um ponto da pandemia em que, ao longe, se enxerga uma luz no fim do túnel. Mas ela não está garantida. Muitos prosperam gerando medo e desconfiança; o velho dividir para conquistar nunca foi tão atual. Mas, se as mentiras ganharam palanques nos meios de comunicação e nas redes sociais, a ciência também ganhou.
Então:
• Se você está cansado de usar máscara e já não sabe mais onde exatamente vale a pena usar, saiba que isso não pode ser determinado por decreto. É ciência. É vacinando e testando. Quando todos estivermos vacinados com três doses, poderemos dispensar a máscara na maioria dos ambientes. Líderes e governos realmente interessados em proteger pessoas estariam fazendo campanhas para isso, exigindo passaporte vacinal completo e distribuindo máscaras KN95 até atingir esse objetivo vacinal.
• Falar que vacina não funciona porque vacinado testa positivo mostra que a pessoa não entende como funcionam vacinas. Vacinas não evitam infecção. Nunca foi assim. O que importa é que evitam que hospitais e necrotérios se encham. No fim de 2020, os dados dos primeiros estudos clínicos de vacinas de mRNA mostraram que elas preveniam infecção; escrevi sobre isso, por ser surpreendente. Mas isso durou um mês. E faz sentido: não é bom para o seu corpo ter níveis de anticorpos tão altos o tempo todo. Cada reforço de vacina que for feito aumenta temporariamente os anticorpos; mas, especificamente para a covid-19, todos os dados mostram que três doses, em pessoas sem comorbidades, são suficientes para proteger das variantes.
• Aliás, anticorpos não devem ser usados para medir proteção. Nem neutralizantes. Eles são medidas que fazemos e que compõem uma ideia de proteção junto com dados epidemiológicos de doenças e de testes. Níveis de anticorpos caem com o tempo. O que importa em uma vacina é se ela gera células B e T de memória. Essas células são o suprassumo da evolução do sistema imune; são células tronco, especializadas, e que se multiplicam rapidamente se você se encontra com o patógeno de novo – e te protegem.
• Falando em células T, nesta semana um abaixo-assinado de 60 imunologistas foi enviado para a FDA, a Anvisa dos americanos, pedindo que seja exigido que todos os estudos de vacinas façam a análise da resposta T. O fato de todos os estudos clínicos precisarem apenas mostrar dados de anticorpos tem dificultado a nossa compreensão completa de como proteger da covid-19. Anticorpos perdem a eficácia contra variantes, mas a proteção se mantém provavelmente por mecanismos específicos de células T. O certo é futuramente exigir esses dados para quem quiser aprovar uma vacina. E instrumentalizar os cientistas do país para que isso vire um serviço público.
Qualquer variação desses quatro pontos é ignorar as evidências e tentar agradar alguém. Agrados não salvam vidas. E líderes que ignoram a ciência, também não.