Diferentes revistas científicas vêm publicando estudos sobre como a pandemia alterou o comportamento e afetou a saúde mental das pessoas. Aumento de relatos de depressão, ansiedade, insônia, pânico. Então, quando noto alguém com comportamento alterado, hoje, mesmo um desconhecido, meu primeiro impulso é tentar ser compreensiva. Afinal, todos estamos sob estresse intenso.
Há alguns dias precisei ir ao banco. Horário reduzido, máscara, fila espaçada do lado de fora – como tem de ser. Na pandemia, várias agências fecharam, muitos funcionários estão em trabalho remoto. Na fila, ouvi uma voz se elevando. Era um homem na minha frente, gritando com o vigilante do banco. Olhei duas vezes: a vigilante era uma mulher. O homem reclamava do tempo da fila para ser atendido. Um absurdo, tinha uma senhora que não conseguia ficar em pé na fila e estava cansada. A vigilante calmamente explicou que a senhora podia entrar para se sentar enquanto esperava. Era hora de almoço, e a caixa – só havia uma no momento – precisara ir ao banheiro. Ao ouvir isso o homem aumentou o tom: caixas não deveriam ir ao banheiro. Se era para demorar tanto, melhor fechar e não atender ninguém.
A caixa voltou e atendeu a senhora. O homem voltou sua atenção para outra funcionária para que ela largasse o telefone e fosse atender clientes. Essa, que era a gerente, se aproximou da porta e relatou que atendia clientes pelo WhatsApp. Gritando que isso não estava certo, o homem se afastou e saiu da fila.
Chegou minha vez, e entrei para pagar os boletos. Foi quando ouvi outra voz masculina: outro homem gritava com a vigilante, agora tentando colocar o corpo na abertura da porta que ela tentava manter estreita. Ele ouvira o primeiro, e agora estava ali para endossar as reclamações. A gerente explicava a redução de pessoal. A demora na hora do almoço infelizmente era esperada.
A caixa imprimiu o número da ouvidoria para que o homem encaminhasse a queixa. Ele recusou, elevando a voz: a gerente era incompetente, e a caixa, velha. Colocou a mão pela abertura da porta. Um funcionário do banco veio e se colocou entre o homem e a vigilante, inquirindo se podia ajudar. E então o outro imediatamente baixou a voz, recuou e respondeu que a queixa não era contra ele, mas – e apontou – contra todas “elas”. E se foi.
Eu, a vigilante, a gerente e a caixa nos entreolhamos. Não, esse comportamento não tem nada a ver com a pandemia. Ele é mais antigo do que todas as pandemias; e vai continuar acontecendo, enquanto não for denunciado e adequadamente punido.