A figura de um frágil homem de óculos, imobilizado na cadeira de rodas, falando sobre as origens do universo e do tempo com voz robótica emitida por um computador marcou para sempre o imaginário daqueles que viveram – e viverão – a partir dos anos 1980. Escrevo esta frase balançando a cabeça, já maravilhada pelo que ela significa. Vivemos em um mundo onde a imagem é soberana, em que modelos e atletas são cultuados como heróis, e onde a profundidade intelectual é frequentemente menosprezada. Como, então, isso aconteceu?
Stephen Hawking nasceu em uma família inglesa de classe média, mas conseguiu ingressar nas prestigiosas universidades de Oxford e Cambridge, pois desde cedo reconheciam nele talentos excepcionais. Dono de uma mente matemática e profundamente curiosa, driblou os desejos do pai de que fosse médico, e ingressou no programa de Física Teórica. Com 21 anos, foi diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrófica, doença degenerativa progressiva, e lhe deram três meses de vida. Obviamente tais previsões não se confirmaram, e apesar de viver em uma cadeira de rodas desde os 27 anos, teve uma carreira meteórica, obtendo a mesma posição em Cambridge antes ocupada por Newton e Charles Babagge. Carl Sagan escreveu a apresentação da primeira edição de seu livro que seria best-seller por anos a fio, Uma Breve História do Tempo. Ali, contava em linguagem acessível todo o conhecimento da humanidade sobre o universo.
Sua missão era explicar de forma simples, para todos os não cientistas, o quanto o ato de pensar poderia transcender a forma, o espaço, o tempo. Tarefas árduas como essa nunca o desanimaram. O corpo do rapaz estava aprisionado na cadeira, mas sua mente de físico teórico era livre como um passarinho – voava como o Super-Homem, gostava de dizer. Hawking era ácido, rápido, agudo em suas observações. Florescia ao contestar paradigmas. Com senso de humor afiado, desafiava colegas quanto às suas ideias. Apostou que buracos negros não existiam, e perdeu.
Com a mesma graça e sagacidade, demonstrou que não eram tão negros assim, pois aprisionavam luz, mas deixavam escapar ondas de radiação. Sei de uma amiga, que complementava sua bolsa de doutorado em Cambridge trabalhando como garçonete no restaurante universitário, que ele era namorador. Imóvel, dava entrevistas e participava de seriados como Star Trek e The Big Bang Theory. Adorava a vida, estava enamorado do universo, e não podia descansar enquanto não soubesse tudo sobre ele.
No dia do aniversário da morte de Galileu Galilei e do nascimento de Albert Einstein, dia 14 de março; no dia em que nos EUA os matemáticos comem torta (pie) para comemorar o dia de Pi – a letra grega com valor 3.14 (March 14), Stephen Hawking nos deixou, com 76 anos. Para aqueles que enxergariam nessa coincidência um simbolismo místico, ele soltaria uma risada sintética (e sarcástica). Não aceitem explicações simplistas sobre o universo, ele diria; procurem sempre entender a verdadeira natureza de tudo o que nos cerca. Sentiremos sua falta. Mas, no meu coração, sei que ele deixou sementes nos cérebros de muitas meninas e meninos, que não descansarão enquanto não nos assombrarem com suas maravilhosas descobertas.