Desembarcando do avião em um voo São Paulo-Boston, numa fria manhã de outubro, há uns 15 anos. Recém-chegados sonolentos, avançando lentamente a caminho da alfândega, dois americanos conversando atrás de mim. "O que você foi fazer no Brasil?", um deles perguntou. "Faço parte de um time internacional que avalia universidades, estava avaliando no Brasil." Pausa. "Ah, OK", assentiu o primeiro. E continuou: "E as universidades deles são boas como as nossas?". Até hoje é difícil descrever o que eu senti ao ouvir a resposta do avaliador de universidades. Ele nem demorou a falar. Soltou um "Nah" – um não daqueles que querem dizer "nem pensar".
Todos os anos, menos de 1 mil das 20 mil universidades avaliadas no mundo inteiro entram no ranking. A avaliação usa parâmetros diversos: qualidade da educação, qualidade da pesquisa (compreendendo quantidade e impacto internacional das publicações, bem como citações dos pesquisadores), internacionalização do corpo docente e discente, empregabilidade dos formandos, visibilidade da universidade na sociedade, impacto da produção intelectual e das patentes, relações com o setor produtivo. Nunca uma universidade brasileira esteve entre as 100 primeiras. Entre as 20 melhores, o parâmetro que faz a diferença – o mais significativo, e importante – é a qualidade da pesquisa. Quem domina, quem faz a diferença, é quem cria conhecimento.
Todas as seis primeiras do ranking, do CalTech à Universidade de Harvard, disponibilizaram online gratuitamente a maioria das suas aulas. A receita das grandes universidades não depende mais dos cursos que oferecem, mas da pesquisa básica realizada, e que o setor produtivo utiliza para inovar em diferentes mercados. Estudando imunidade antiviral, pesquisadores da Harvard descobriram o medicamento que hoje revolucionou o tratamento de câncer, e que é produzido e vendido por grandes empresas de medicamentos. O ranking em si não é o objetivo, mas a consequência da adoção de valores internacionais de estimulo para gerar progresso.
Até hoje lembro o frio na barriga que senti ao ouvir a certeza na voz do ranqueador, como quando achamos que fizemos algo muito errado. Sou parte dessas universidades. Como ele podia desprezar tão rapidamente o esforço de milhares de pesquisadores brasileiros?
Mas isso foi há 15 anos. Hoje, eu sei que ele está absolutamente certo. Não adianta as universidades brasileiras terem cientistas maravilhosos e desperdiçarem seu potencial por falta de apoio. É preciso um plano não apenas institucional, e sim nacional, de estímulo à geração de conhecimento. Um esforço de sociedade: leis, cumprimento de leis, estímulo, recursos, cobrança e reconhecimento, que funcionem em um ciclo propulsor. Salas de aula, como postos de gasolina e lojas de shopping, não mais existirão daqui a 15 ou 20 anos. Resta saber se o mesmo acontecerá com o futuro do país.