Em minha nova encarnação como estudante, percorro o campus da UFRGS como uma viajante que revisita um país estrangeiro depois de 30 anos – fazendo anotações mentais do que mudou e do que permanece igual, reconhecendo e ao mesmo tempo estranhando a paisagem, as pessoas e a mim mesma nesse cenário.
A estudante que eu fui senta-se ao meu lado na sala de aula – parecida, mas completamente diferente da que eu sou agora. Alguns dos meus professores ainda estão lá e muitos antigos colegas agora são professores, mas eles evidentemente também não são mais os mesmos. Essa constante sobreposição de novas experiências e memórias, de nostalgia e expectativa, parece deixar tudo em suspenso, irreal, agudo. Como se eu estivesse realmente a passeio em um país estrangeiro – mas sem nenhuma vontade de voltar para casa tão cedo.
De tudo o que observei nos primeiros meses de exploração desse território redescoberto, nada saltou aos olhos de forma tão imediata quanto o novo arranjo de cores da paisagem humana. No início dos anos 1990, a universidade pública em que eu me formei não era muito diferente das escolas particulares em que eu havia estudado. Eram raros os alunos e mais raros ainda os professores negros.
Parece justo e razoável que a universidade pública seja mais parecida com o país
Um levantamento divulgado pelo IBGE na semana passada confirmou o que qualquer um pode observar a olho nu no campus: em 2019, o número de estudantes negros nas universidades públicas superou pela primeira vez o de alunos brancos e está mais próximo da composição da população (pretos ou pardos representam 55% dos brasileiros). Trata-se de uma pequena grande revolução. Não apenas porque parece justo e razoável que a universidade pública seja mais parecida com o país, mas porque a variedade de alunos e suas diferenças provocam transformações no que se pesquisa e no que se ensina, ampliando o conhecimento para novas direções, o que é sempre uma boa notícia.
O Brasil que conhecemos nunca mais será o mesmo depois que incorporar novos pontos de vista ao saber estabelecido. Será como voltar a um país e descobrir que, na primeira visita, mais da metade dos habitantes estava fora. E não por vontade própria.