Por dia, eu consumo dois ovos no café da manhã. Uma caixinha oscila entre R$ 12 e R$ 14, e não dura uma semana na geladeira. Já acho caro.
Como se não bastasse, inventaram de diminuir a embalagem de 12 unidades para 10. É anacrônico falar “uma dúzia de ovos” como na infância, agora é uma dezena de ovos. Cabe à matemática escolar procurar novos exemplos para Joãozinho e Mariazinha.
O preço aumenta, a quantidade diminui. O que me confunde é a humanização dos bichos, e a desumanização dos consumidores, que vão gastar num PF (prato feito) em casa ou no restaurante, no mínimo, R$ 30. É hoje tão caro almoçar no lar quanto na rua. É de se esperar o galinheiro cheio de mordomias, com a carga horária controlada no momento de botar o ovo. Se passou do expediente, a galinha precisa deixar para o dia seguinte. Não são admitidas horas extras impróprias e o descumprimento da CLT.
No frigir dos ovos, nós não conseguimos nos sustentar ao sustentar a sustentabilidade.
Nesta semana, minha esposa surgiu com uma caixa que custou mais de R$ 20. Eu falei que era um roubo, que ela tinha sido enganada, que ela encontraria a mercadoria pela metade do preço no supermercado.
Recebi um sermão, um pitaco, um para-te quieto! Ela me explicou que eu estava fora de moda, que se tratava de ovos caipiras de galinhas soltas, de galinhas felizes. Por isso, a diferença astronômica de valor. Ela defendia o estilo de vida da galinha.
São novos tempos culturais, uma mentalidade fiscalizadora e esclarecida, que leva em conta a procedência dos produtos, dedicando-se a evitar maus-tratos aos animais.
Vejo nobreza na mudança do comportamento alimentar e na transformação tecnológica dos avicultores.
Prometo me adaptar.
É a verdadeira revolução dos bichos, não mais uma sátira de George Orwell.
Não há mais gaiolas. Não há mais os caixotes tristes. Não há mais o cheiro de penas no ar e a melancolia do confinamento forrado com palha. As promessas para as aves são de paraíso na Terra.
Quem não acredita deve visitar as granjas para testemunhar as galinhas passeando, contentes, espontâneas e alinhadas ao ócio. É necessário revisar os costumes, quebrar a casca do preconceito, privilegiar a qualidade em detrimento da quantidade. A avareza nada é perto dos propósitos lúcidos por uma mesa mais orgânica e saudável.
Eu já começo a delirar, já imagino galinhas hippies cantando Janis Joplin e dançando peladas pela fazenda. Só não tenho como decretar o que torna uma galinha feliz.
O que é a felicidade para ela? Pentear o seu penacho, ou beijar a crista do galo, ou bater as asas freneticamente, voar e alcançar o telhado, ou acordar depois do meio-dia?
Ninguém perguntou para a galinha.
Ainda nem descobrimos o que veio primeiro: ela ou o ovo.