Um dos frutos mais simbólicos do Rio Grande do Sul, o butiá serve como fonte de inspiração para a moda. A partir das folhas dos butiazeiros, ateliês gaúchos criaram produtos que aliam design diferenciado e apelo sustentável, estimulando o plantio da espécie. Um dos itens que ganham espaço neste contexto, atraindo atenção até mesmo de grandes redes varejistas, é a bolsa confeccionada com a palha retirada das palmeiras.
A Apoena, de Giruá, na região das Missões, é uma das empresas que têm na folha dos butiazeiros sua principal matéria-prima na fabricação do acessório. O nome da marca, que significa “aquele que enxerga longe” em tupi-guarani, e o uso do butiá fazem alusão direta às origens e à cultura do município de 16 mil habitantes onde está instalada a empresa.
Criada em 2015 pela estilista Maiara Bonfanti, a Apoena fabrica em torno de cem bolsas por mês, em processo totalmente artesanal. Do plantio do butiá ao acabamento das bolsas, tudo é feito dentro da empresa. As palhas são obtidas a partir de 20 árvores próprias cultivadas para esse fim. No entanto, a empresa tem plantados outros 250 pés, aproximadamente, que devem estar aptos para o manejo nos próximos dois anos. A área, que não chega a um hectare, é certificada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente.
— Fazemos a colheita das folhas nos períodos de luas cheia e crescente. Retiramos, no máximo, 30% das folhas de cada pé, e para voltarmos na mesma árvore levamos três meses. Esse respeito (à recuperação dos butiazeiros) é fundamental para que o produto seja sustentável — explica Maiara.
Apelo emocional
A cada ano são lançados cinco modelos de bolsas, que chegam ao consumidor com preços entre R$ 184 e R$ 254. A Apoena costuma comercializar os produtos em feiras, eventos e pela internet. Recentemente, a empresa fechou parceria com a Lojas Renner, criando dois modelos exclusivos para venda nas lojas físicas espalhadas pelo Brasil e no e-commerce da marca.
— Apostamos nesse produto por acreditar que valoriza a mão de obra das mulheres artesãs de Giruá, o modo ancestral de produção do artesanato e respeita o manejo sustentável dessa planta — diz Eduardo Ferlauto, gerente sênior de sustentabilidade da Renner.
A designer e doutoranda em engenharia têxtil Gabriela Jobim destaca que a maneira como a trama das folhas é conduzida nas peças remete à tradição indígena da região missioneira:
— O grande valor desse material é o apelo emocional que ele tem, por estar associado à cultura local. O butiá faz parte do dia a dia das pessoas da região.
A especialista observa que os consumidores demonstram cada vez mais interesse em saber como e onde os produtos são feitos antes de comprá-lo. No caso das bolsas feitas a partir dos butiazeiros, Gabriela vê o processo artesanal de fabricação, a preocupação ambiental e a geração de empregos e renda na comunidade como diferenciais de mercado em relação a artigos de materiais sintéticos e vindos do Exterior.
Árvore está ameaçada de extinção
O Rio Grande do Sul abriga oito tipos de butiazeiros, todos ameaçados de extinção. O biólogo e analista ambiental da Secretaria Estadual de Meio Ambiente Leonardo Urruth informa que o avanço da agricultura e dos perímetros urbanos das cidades fez com se perdesse, ao longo do tempo, boa parte das palmeiras em solo gaúcho.
No intuito de combater esse processo, o Estado adotou uma estratégia de conservação da biodiversidade por meio da promoção do uso sustentável de vegetação nativa, inclusive o butiá. Para isso, todo interessado em realizar a atividade extrativa precisa obter uma certificação, que estabelece os limites do uso e busca minimizar impactos ambientais decorrentes da exploração dessas espécies.
— O uso de partes das plantas promove agregação de renda para as famílias, especialmente de agricultores familiares. A partir da existência de retorno econômico, é comprovada a maior proteção aos pés de butiá, e isso, inclusive, gera maior interesse pelo plantio de sementes e mudas — justifica Urruth.
A certificação é emitida gratuitamente pela secretaria e tem validade de cinco anos, com possibilidade de renovação automática. Após o interessado fazer o requerimento, técnicos visitam a propriedade e definem as possibilidades de extrativismo e as medidas de proteção das plantas.
O Rio Grande do Sul tem cerca de 150 produtores habilitados a manejarem espécies nativas.