É difícil antecipar os resultados do Freio de Ouro, que geralmente são decididos nos últimos instantes das provas. Já o destino dos campeões – macho e fêmea – é mais previsível: a reprodução. Outra consequência natural é a valorização. Esse aumento de passe varia conforme a genética. Em média, pode chegar a 500% nos machos e 200% nas fêmeas.
Após vencer nas pistas, os animais permanecem na cabanha de origem, especialmente as fêmeas, que têm capacidade restrita de gerar descendentes. No caso dos machos, é comum o criador optar pela venda de cotas do animal. Uma certeza é que os vencedores da principal prova da raça crioula no país estão predestinados a espalhar Brasil afora sua genética.
– Dificilmente o criador negocia este animal, pois ele fica valorizado para a venda de coberturas – explica o presidente da Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos (ABCCC), Eduardo Suñe.
Quem trilhou caminho diferente foi o cavalo JA Libertador. Neste ano, ele volta às pistas para disputar a prova que ganhou em 2015. Esse retorno é possível porque ele ainda é jovem, está prestes a completar sete anos. Na época, o JA não era a principal aposta da cabanha, recorda o criador José Antônio Anzanello, da Santa Edwiges, de São Lourenço do Sul, na região sul do Estado. Outro animal estava sendo treinado, mas morreu em novembro de 2014, meses antes da competição.
A alternativa foi intensificar os treinamentos do JA, que estava começando a se preparar para disputar a prova só em 2016. A comercialização ocorreu antes da conquista do primeiro título, logo após vencer o Bocal de Ouro, para um condomínio que hoje reúne seis criadores do Paraná e de São Paulo. O cavalo ficou com Anzanello até o dia da consagração, em Esteio.
– Ele é um cavalo excepcional. Vendi sabendo que tinha chance de ganhar o Freio, pois foi um dos melhores que já produzi. Decidir vender foi mais difícil que entregá-lo – explica Anzanello, que tem direito a 10 coberturas por ano durante toda a vida do cavalo.
Coletas de sêmen suspensas e retorno aos treinamentos
Até o final de 2017, JA Libertador havia parado com os treinamentos e se dedicava somente à reprodução. Para voltar às pistas do Freio de Ouro, desde o início do ano foram suspensas as coletas de sêmen. Agora, o equino está sendo preparado no Centro de Treinamento Guto Freire, em Santo Antônio da Patrulha, no Litoral Norte. O trabalho já rendeu resultados. Há pouco mais de dois meses, arrematou o Freio de Prata na competição da Federação Internacional de Criadores de Cavalos Crioulos (FICCC), considerada a copa do mundo do cavalo crioulo.
– Após a prova, ele voltará para a estação de monta (período pré-determinado para acasalamento), primeiro no Paraná e depois em São Paulo – adianta o criador Onécio Prado Junior, da Estância Tamareira, de Santa Rita do Passa Quatro (SP), dono de 60% do animal.
A rotina de um campeão destinado à reprodução é tranquila. No caso de JA Libertador, passa o dia solto no piquete, separado de outros animais para evitar lesões. Pelo mesmo motivo, a monta natural não é prática comum. As coletas de sêmen são feitas de duas a três vezes por semana. A alimentação é à base de pasto, além de suplementação com alfafa e ração.
Potenciais ganhadores podem ter venda antecipada
A comercialização antecipada de um possível campeão, como ocorreu com JA Libertador, vendido após vencer o Bocal de Ouro por ser um forte candidato ao título, não é um fato incomum no mercado de cavalo crioulo. Isto porque há criadores que investem para ter a oportunidade de pisar na pista do Freio de Ouro e desfrutar da emoção de competir.
– Existem pessoas que, na véspera da grande final da prova, compram a possibilidade de estar na Arena do Cavalo Crioulo e disputar o título. Essa adrenalina do competidor ajuda a mover o mercado – explica o criador Rodrigo Teixeira, da cabanha Harmonia, de Santa Vitória do Palmar, no sul do RS, sobre o perfil destes investidores.
Trajetória semelhante teve Ganadero da Harmonia, campeão do Freio em 2006. O cavalo, que disputou três ciclos, foi vendido pela família Teixeira um ano antes de conquistar o ouro, quando venceu o Freio de Bronze, em 2005. Atualmente, o equino tem nove proprietários. Mas a família permanece com direito ao uso das coberturas por tempo indeterminado. Hoje, Ganadero vive na Schmitt & Gonzales Central de Reprodução Equina, em São Jerônimo, na Região Metropolitana.
Lá, o avô garanhão tem cocheira individual para passar a noite e, durante o dia, vai para o potreiro, local de lazer.
– O Ganadero é muito mimoso e tem vida de cavalo, se atira no barro e brinca, diferentemente de quando competia – conta Fernando Gonzales, sócio da central de reprodução.
Cotas negociadas horas antes de prova final
Harmonia Temprano, filho de Gadanero e campeão do Freio em 2016, teve cotas vendidas poucas horas antes da prova final, recorda Teixeira, que ainda possui cota de 12,5% do exemplar. O restante foi dividido entre 18 criadores. Atualmente, Harmonia está em uma central de inseminação, em Pelotas, no sul do Estado, onde divide espaço com outros quatro cavalos.
Pai e filho desfrutam do sossego destinado aos ex-campeões. Temprano passa um turno pastejando, em recreação, e outro encerrado, já que tem algumas lesões de atleta. As coletas de sêmen ocorrem três vezes na semana.
– É um manejo bem tranquilo. É um animal sem estresse, que leva uma vida normal de equino – brinca Teixeira.
A dinastia Oraca
Uma das candidatas ao título de campeã é Oraca III da Vendramin, filha de Oraca do Itapororó, da Estância Vendramin, de Palmeira (PR). Consagrada em 2013, ao conquistar o Freio de Ouro, a mãe é um dos exemplares mais valorizados da raça. Foi recorde nas provas funcionais, com a maior pontuação da história da competição. É a única égua a receber nota 10 em morfologia.
– A Oraca do Itapororó foi um divisor de águas para a estância e ainda nos dará muitas alegrias com seu legado – afirma o criador Aldo Vendramin, que não cogita vender cotas da égua.
A rotina de Oraca é “embelezar a estância”. Passa o dia no piquete, convivendo com outras éguas. Sua alimentação é à base de pasto. Ela recebe cuidados veterinários em tempo integral.
Sobre a importância das fêmeas, Vendramin pontua que os animais que se destacam sempre têm “boas mães” no que diz respeito à genética.
Descendentes
Ganadero da Harmonia (macho) – 22 anos
965 filhos registrados, sendo que cinco filhos e três netos disputam o Freio de Ouro 2018:
Filhos
- Data Venia Fuzileiro
- Encantto Della Tersa
- Harmonia Ultimato
- História Do Encantto
- Índia Do Encantto
Netos
- Buenacho da Gema
- Hermosa da Tamareira
- Tr Entonado
Oraca do Itapororó (fêmea) – 14 anos
11 filhos registrados, sendo que uma filha disputa o Freio: Oraca III
Harmonia Temprano (macho) – 10 anos
124 filhos registrados
JA Libertador (fêmea) – Seis anos
60 filhos registrados
Controle genético
O regulamento da Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos (ABCCC), homologado pelo Ministério da Agricultura, prevê algumas recompensas aos vencedores do Freio de Ouro. Segundo o superintendente de Registro Genealógico da entidade Frederico Araújo, os parâmetros são fixados para garantir reserva de mercado e controle genético da população de equinos. Confira:
Fêmeas
Podem transferir dois embriões por ano – para as éguas não premiadas, o limite é um embrião ou gravidez a cada doze meses.
Machos
Premiados ampliam de 120 para 150 o número de coberturas no período de doze meses.