
A chuva que causou as enchentes do final de abril e do início de maio em diversos pontos do Rio Grande do Sul e deixou mais de 140 mortes foi agravada por um bloqueio atmosférico, que manteve a nebulosidade por muitos dias nas regiões gaúchas.
O evento é diferente do que havia atingido o Estado em junho, setembro e novembro do ano passado. Nas ocasiões, as mortes e a destruição, especialmente em regiões como Litoral Norte e Vale do Taquari, foram causadas por ciclones extratropicais. Em comum entre os dois fenômenos estão suas características de eventos extremos e atípicos.
Mas qual a diferença?
No caso dos ciclones extratropicais, normalmente esses sistemas se formam no oceano e se afastam do continente. No ano passado, na situação ocorrida em junho, quando 15 pessoas morreram no Vale do Caí, Vale do Sinos, Litoral Norte e Região Metropolitana, o ciclone se comportou de forma anômala: nasceu no oceano e se movimentou para o continente, levando consigo muita umidade.
Em setembro, quando 54 óbitos foram registrados em regiões como Vale do Taquari, Norte e Serra, outra anormalidade fez com que o ciclone se formasse no continente e, depois, fosse para o oceano. O mesmo aconteceu em novembro, mês em que cinco mortes aconteceram em cidades da Serra, do Noroeste e da Região Metropolitana.
Já o bloqueio atmosférico verificado desde o final de abril faz com que sistemas que costumam passar pelo Estado permaneçam aqui por mais tempo, em vez de se deslocarem para Santa Catarina, Paraná e o Sudeste. Com isso, o calor da umidade se estabeleceu no RS, e nuvens de tempestade que durariam algumas horas se mantiveram por aqui durante vários dias.
Há influência das mudanças climáticas?
A chuva que causou as enchentes do final de abril e do início de maio no Rio Grande do Sul foi mais intensa em razão das mudanças climáticas induzidas pelo ser humano, aponta a ClimaMeter. A estimativa é de que tenham tornado a chuva 15% mais intensa do que seria.
Fenômenos como El Niño e La Niña acontecem como sempre, favorecendo momentos de mais chuva e menos frio ou mais frio e menos chuva. A diferença, hoje, é que agravantes como o aumento da temperatura média global têm feito com que situações que costumavam ser atípicas se tornem comuns: se grandes cheias no Guaíba se repetiam a cada 60 a 80 anos, hoje podem ocorrer até mesmo duas vezes por ano.
E, se as mudanças climáticas afetam o mundo inteiro, no Brasil, o Rio Grande do Sul é um dos locais mais atingidos.
E daqui para a frente?
Se já vinham dando indícios de aumentarem desde 2015, no ano passado as enchentes se tornaram rotina no Rio Grande do Sul, dando sinais de que vieram para ficar. Entre especialistas, a compreensão é de que os parâmetros de monitoramento desses fenômenos mudaram.
As mudanças climáticas — termo que significa, em resumo, que o globo está mais quente e que isso faz com que o clima tenha seu comportamento alterado — se manifestam de formas diferentes. De modo geral, são eventos extremos: há regiões com mais ondas de calor, ou secas duradouras em lugares onde elas não aconteciam, ou chuvas intensas em menos tempo.
Qual a extensão dos estragos?
A forte chuva causou cheias de rios em diversas regiões e deixou mais de uma centena de mortos. De acordo com o boletim da Defesa Civil estadual, divulgado às 18h deste domingo (12), a chuva causou 143 mortes. Pelo menos 806 pessoas se feriram. Há pelo menos 125 desaparecidos, seis a menos do que o boletim das 12h deste domingo.
O RS tem 538,743 mil desalojados e 81,2 mil pessoas em abrigos.
Em Porto Alegre, onde quatro mortes foram registradas, o nível do Guaíba aumentou 4m04cm em seis dias. De 1m31cm em 29 de abril, atingiu a marca recorde de 5m35cm na madrugada de 5 de maio, deixando bairros alagados e afetando diversos serviços, como fornecimento de energia, na capital gaúcha.
O período entre os dias 2 e 3 de maio foi o mais intenso, com a água subindo mais de 1 metro a cada 24 horas. A intensidade surpreendeu moradores, que precisaram deixar as suas casas de forma repentina, e a gestão municipal, que enfrentou diferentes problemas técnicos com o sistema contra enchentes. As marcas da histórica enchente de 1941 também foram superadas.