Por Marcelo Dutra da Silva
Professor da Universidade Federal do Rio Grande (Furg)
A chamada “Tese do Crescimento Zero” foi o primeiro ataque direto às teorias de crescimento econômico contínuo, propagadas pela visão expansionista do modelo econômico que pregava acesso ilimitado aos recursos do planeta. Foi apresentada pelo Clube de Roma, em 1972, em seu relatório intitulado The Limits to Growth (“Os limites para o crescimento”). O texto apontou para a necessidade de respeitar a finitude dos recursos naturais, começando por frear o crescimento da população global e das atividades industrializadas, o que levaria à estabilização do crescimento econômico. A posição rapidamente repercutiu no mundo e descontentou alguns países, sobretudo aqueles “em desenvolvimento”.
O relatório acendeu um debate caloroso que culminou, em junho daquele mesmo ano, na conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente humano, a Stockholm Conference Eco, presidida pelo canadense Maurice Strong, em Estocolmo (Suécia). Foi a primeira conferência global sobre meio ambiente, um marco histórico no debate de políticas voltadas às questões ambientais. Porém, novamente esse debate encontrou a resistência das nações em desenvolvimento, sob a alegação do direito de crescer e que “não seria justo impedir o desenvolvimento dos países pobres” (o “Crescimento a qualquer custo”). E lá se foram 50 anos.
A Conferência de Estocolmo propagou o primeiro grande alerta global para os perigos da degradação ambiental e as ameaças, inclusive, à existência humana, algo que permaneceu aceso na ideia do desenvolvimento sustentável, lançado para o mundo já no final da década de 1980 pela Comissão Brundtland, com a publicação do relatório Nosso Futuro Comum, em consideração às gerações futuras, diante dos padrões elevados de produção e consumo.
O debate prosseguiu entre líderes das principais economias do mundo. Foi assim na Eco 92, na Rio+20 e nas diversas conferências que se sucederam, particularmente as que têm como foco as mudanças climáticas e as políticas de desenvolvimento para empreendermos na direção de uma “economia verde”, de crescimento econômico com características de sustentabilidade. As emissões de gases do efeito estufa tornaram-se a nova tônica nas discussões sobre o desenvolvimento das nações, que evidentemente não puderam mais deixar de considerar a destruição da natureza, o uso de fontes alternativas de energia, o bem-estar social e, claro, mudanças nos hábitos de consumo.
Não demorou muito, e os negacionistas se apresentaram, rejeitando as evidências científicas, em uma tentativa de desacreditar o conhecimento e as medidas apontadas como necessárias ao enfrentamento do novo cenário climático. É consenso, no entanto, que o clima está diferente, e as pessoas já conseguem perceber isso. A elevação do nível dos oceanos é inevitável, e não é muito difícil reconhecer que o ambiente de praia está ficando menor. Extremos de chuva, vento e seca estão cada vez mais frequentes e intensos. Em algumas regiões do Brasil, a falta de água está comprometendo a capacidade de produzir alimentos, e certamente as mudanças no clima trarão prejuízos também à economia.
Infelizmente, o aprofundamento do debate não condiz com um bom momento político do nosso país. Decisões tomadas pelo governo brasileiro sugerem forte retrocesso no que diz respeito ao tema. Nossa posição desenvolvimentista renova as velhas reivindicações pelo direito de destruir para crescer, na mais completa distorção da realidade, que se impõe pela sobrevivência humana, pela racionalidade quanto ao uso dos recursos, pelas mudanças dos hábitos de consumo, pela conservação da biodiversidade e pela manutenção dos serviços prestados pela natureza.
Ingressamos em uma espécie de espiral de desconstrução, em que políticas públicas de meio ambiente são desmobilizadas e/ou enfraquecidas, favorecendo práticas ilícitas, tais como invasão de terras indígenas, desmatamento ilegal, mineração criminosa, tráfico de espécies e contrabando de madeira. A região da Amazônia é o alvo principal, mas o retrocesso legal alcançou Estados e municípios de outras regiões, colocando a totalidade de nossos biomas, paisagens e sistemas sob ameaça.
E a resposta virá no baixo desempenho da economia, ali adiante.