Nos corredores do governo federal e entre especialistas do setor energético, há uma sensação de urgência na expansão da fronteira de exploração do petróleo em alto-mar em direção ao sul do país. A região está contemplada no leilão de 92 blocos para exploração do combustível a ser realizado em outubro, e que se estende até Santa Catarina.
O cálculo feito por gestores públicos e consultores é de que o país está sujeito a uma janela de oportunidade para extrair essa riqueza do seu subsolo e incluir novas regiões nesse processo, como as proximidades da costa gaúcha, em razão de a matriz energética mundial estar em processo de transição em busca de fontes menos poluentes.
Parte desses blocos está localizada em uma bacia que passa pela costa gaúcha, mas não há municípios do Rio Grande do Sul diretamente envolvidos no leilão previsto para esse ano. Áreas localizadas nas imediações do Estado podem ser contempladas na licitação seguinte, programada inicialmente para 2022, e se beneficiar do pagamento de compensações financeiras — os chamados royalties
O relatório de 2020 da Agência Internacional de Energia (IEA) aponta, por exemplo, uma queda de 8,5% na demanda por petróleo e 3,3% por gás natural no último ano em razão do impacto da pandemia. Ainda assim, nesse mesmo período, a busca por fontes renováveis cresceu 0,9%. A análise da IEA avalia que a curva de demanda por petróleo deve "achatar" em cerca de 10 anos e se manter estável até 2040 (até onde vai a previsão).
Esperar demais para extrair o combustível da costa brasileira pode fazer com que o cenário mundial se torne cada vez menos atrativo para projetos que são de longo prazo e custos altíssimos. Ou seja, a janela econômica tende a se fechar.
— Quanto mais tempo passar, como estamos em transição energética, menor fica a chance de essas riquezas serem exploradas pelo Brasil. Se isso não ocorrer em breve, vai ficar muito petróleo no chão — avalia o ex-diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e e diretor-presidente da empresa do setor de energia Enauta, Décio Oddone.
Para a diretora da ONG Instituto Arayara, Nicole Oliveira, essa pressa deixa o país sob maior risco ambiental.
— A ANP sabe que o petróleo está com os dias contados, por isso tenta desburocratizar ao máximo e acelerar a exploração — analisa Nicole.
O professor da área de Mineralogia e Petrologia da UFRGS Luiz Fernando De Ros concorda que o mundo vive um período de transição, mas não prevê uma queda brusca na demanda pelos combustíveis fósseis.
— A transição (energética) começou, mas o caminho é muito longo. Outras fontes de energia renováveis ainda têm um custo de produção muito alto. É um processo que vai levar décadas, e deverá preservar alguma demanda de petróleo em áreas como a petroquímica — observa De Ros.