A crise diplomática causada pelas queimadas na floresta amazônica deu o tom do quarto pronunciamento oficial do presidente Jair Bolsonaro desde o início do mandato. O líder brasileiro disse na noite desta sexta-feira (23), em cadeia nacional de rádio e televisão (assista acima ou leia a íntegra no final da matéria), que "incêndios florestais existem em todo o mundo e não podem servir de pretexto para possíveis sanções internacionais".
A disparada das notificações de queimadas na Amazônia, que entre janeiro e 21 de agosto aumentaram 84% em relação ao mesmo período de 2018, viraram manchete no mundo inteiro. Nesta sexta-feira (23), o presidente da França, Emmanuel Macron, afirmou que Bolsonaro "mentiu" e disse que a crise na Amazônia pode comprometer o acordo entre União Europeia e Mercosul.
"Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, o presidente da República só pode constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para ele na cúpula (do G20) de Osaka", declarou o Palácio do Eliseu, estimando que "o presidente Bolsonaro decidiu não respeitar seus compromissos climáticos nem se comprometer com a biodiversidade".
Bolsonaro, posteriormente, respondeu a Macron no Twitter.
"Lamento a posição de um chefe de Estado, como o da França, se dirigir ao PR brasileiro como 'mentiroso'. Não somos nós que divulgamos fotos do século passado para potencializar o ódio contra o Brasil por mera vaidade. Nosso país, verde e amarelo, mora no coração de todo o mundo".
O presidente brasileiro disse ainda que países desenvolvidos ofereceram ajuda para reduzir as queimadas e afirmou que eles se prontificaram a "levar a posição brasileira junto ao G7", em uma referência aos Estados Unidos.
— É preciso ter serenidade ao tratar dessa matéria. Espalhar dados e mensagens infundadas dentro ou fora do Brasil não contribui para resolver o problema. E se prestam apenas a uso político e a desinformação — disse.
Exército contra o fogo
No final da tarde desta sexta-feira o governo federal decretou a Garantia da Lei e da Ordem (GLO) nos nove Estados da Amazônia legal: Acre, Amazonas, Roraima, Rondônia, Pará, Tocantins, Amapá, Mato Grosso e parte do Estado do Maranhão.
De acordo com o decreto, o emprego das Forças Armadas durará um mês e abrange também áreas de fronteira, terras indígenas e unidades federais de conservação ambiental, que requererem "ações preventivas e repressivas contra delitos ambientais" e "levantamento e combate a focos de incêndio".
Polêmicas e apoios
O fogo já arde na Amazônia desde o fim de julho, mas foi só a partir da segunda-feira (19), quando a nuvem negra de fumaça transformou o dia em noite em São Paulo que o clima esquentou. De lá pra cá trocas de críticas e promessas de apoios partiram de diversas partes do globo.
Alguns dos principais líderes europeus compraram briga com Bolsonaro. O presidente francês, Emmanuel Macron, decidiu propor uma mudança na pauta do G7, encontro das principais potências econômicas do mundo que acontecerá em Biarritz (sudoeste da França) . Ele considera fundamental debater as questões do desmatamento na Amazônia. Sua proposta ganhou coro na Irlanda. No início do mês, a Alemanha já havia anunciado o corte de verbas para proteção da Floresta brasileira devido a política ambiental praticada pelo atual governo do Brasil.
Macron denunciou as queimadas utilizando uma foto de um fotógrafo que já faleceu e isso foi o estopim para trocas de farpas em âmbito pessoal entre os líderes de França e Brasil. Bolsonaro foi chamado de mentiroso pelo líder francês, que agora, devido aos problemas ambientais, se opõe ao tratado de livre comércio entre União Europeia e Mercosul. A réplica veio com uma acusação do presidente brasileiro de que o europeu quer "potencializar o ódio contra o Brasil por mera vaidade".
No meio deste turbilhão, o presidente norte americano Donald Trump disse que a relação entre Brasil e Estados Unidos está mais forte do que nunca e prometeu ajudar o na luta contra as queimadas, mas não disse como.
Celebridades repercutem as queimadas
Diversas estrelas do esporte e das artes, no país e no exterior, se pronunciaram lamentando a tragédia ambiental no Brasil. O ator Leonardo DiCaprio , a top model Gisele Bündchen, a atriz Cara Delevigne e a cantora Demi Lovato foram apenas algumas das personalidades que se manifestaram.
Na tristeza com o que acontece com a floresta amazônica não faltaram as fake news e um craque do futebol foi driblado por uma delas. Na tarde desta quinta-feira (22), Cristiano Ronaldo postou uma foto alertando sobre o fogo que consome a Amazônia, mas a imagem era do Rio Grande do Sul, na reserva do Taim, em 2013.
Leia a íntegra do pronunciamento de Bolsonaro
"Boa noite.
Dirijo-me a todos para tratar da nossa Amazônia que, nas últimas semanas, tem atraído crescente atenção do Brasil e do mundo.
A Floresta Amazônica é parte essencial da nossa história, do nosso território e de tudo que nos faz sentir ser brasileiro. Nossas riquezas são incalculáveis, tanto em matéria de biodiversidade quanto de recursos naturais.
Devido à minha formação militar e à minha trajetória como homem público, tenho profundo amor e respeito pela Amazônia. A proteção da floresta é nosso dever.
Estamos cientes disso e atuando para combater o desmatamento ilegal e quaisquer outras atividades criminosas que coloquem a nossa Amazônia em risco. É preciso lembrar que naquela região vivem mais de 20 milhões de brasileiros, que há anos aguardam dinamismo econômico proporcional às riquezas ali existentes.
Para proteger a Amazônia não bastam operações de fiscalização, comando e controle. É preciso dar oportunidade a toda essa população, para que se desenvolva junto com o restante do País. É nesse sentido que trabalham todos os órgãos do governo.
Somos um governo de tolerância zero com a criminalidade. E na área ambiental não será diferente. Por essa razão, oferecemos ajuda a todos os estados da Amazônia Legal. Com relação a aqueles que a aceitarem, autorizarei operação de Garantia da Lei e da Ordem, uma verdadeira GLO ambiental. O emprego extensivo de pessoal e equipamentos das Forças Armadas, auxiliares e outras agências permitirão não apenas combater as atividades ilegais, como também conter o avanço de queimadas na região.
Estamos numa estação tradicionalmente quente, seca e de ventos fortes, em que todos os anos infelizmente ocorrem queimadas na Região amazônica. Nos anos mais chuvosos as queimadas são menos intensas. Em anos mais quentes, como nesse, 2019, elas ocorrem com maior frequência.
De todo modo, mesmo que as queimadas deste ano não estejam fora da média dos últimos 15 anos, não estamos satisfeitos com o que estamos assistindo. Vamos atuar fortemente para controlar os incêndios na Amazônia.
É preciso, por outro lado, ter serenidade ao tratar dessa matéria. Espalhar dados e mensagens infundadas, dentro ou fora do Brasil, não contribui para resolver o problema, e se prestam apenas ao uso político e à desinformação.
O Brasil é exemplo de sustentabilidade. Conserva mais de 60% de sua vegetação nativa, possui uma lei ambiental moderna e um Código Florestal que deveria servir de modelo para o mundo. Temos uma matriz energética limpa, renovável e com ela estamos dando importante contribuição ao planeta.
Diversos países desenvolvidos, por outro lado, ainda não conseguiram avançar com seus compromissos no âmbito do Acordo de Paris. Seguimos como sempre abertos ao diálogo, com base no respeito, na verdade e cientes da nossa soberania.
Outros países se solidarizaram com o Brasil. Ofereceram meios para combater as queimadas, bem como se prontificaram levar a posição brasileira junto ao G7. Incêndios florestais existem em todo o mundo e isso não pode servir pretexto para possíveis sanções internacionais.
O Brasil continuará sendo, como foi até hoje, um País amigo de todos e responsável pela proteção da sua floresta Amazônica.
Boa noite."