Três fatores motivaram Fábio Celestino, 42 anos, e Elmo Bressani, 64, a criar um sistema de controle focado no céu de Porto Alegre: radioamadorismo, aviação e o pôr do sol do Guaíba. Engenheiros na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a dupla instalou no 16º andar de um apartamento do bairro São Geraldo, na zona norte, câmeras do tipo PTZ – do inglês, a sigla define Pan (movimentos panorâmicos), Tilt (a possibilidade de locomover o equipamento verticalmente) e Zoom (capacidade de aproximação).
De uma sacada, a primeira lente, de resolução 4K, registra navios que passam pelo vão móvel, os prédios do Centro Histórico, a orla da Capital e a paisagem dos fins de tarde.
— A paixão começou com o pôr do sol. Tive a ideia de botar para transmitir esse espetáculo. Mas aí, depois, colocamos a câmera voltada pro aeroporto. Então surgiram os áudios, e a partir dos áudios, os relatos das luzes. Foi assim — detalha Bressani sobre o começo, seis anos atrás.
Da janela em outro ponto do imóvel, os equipamentos miram a pista do Aeroporto Salgado Filho, com o mesmo horizonte observado pelos pilotos que chegam ao Estado. As conversas entre os comandantes e a torre de controle são interceptadas por uma antena direcional VHF instalada no apartamento de Celestino, distante três quilômetros do terminal de pouso e decolagem.
— A radioescuta é praticada no Brasil e no mundo, só não podemos interferir — pondera, sobre a legalidade da atividade.
O alcance das antenas tem espectro que cobre a Capital, o litoral do Rio Grande do Sul e parte de Santa Catarina.
A partir do servidor em sua casa, Celestino envia o áudio, sincronizado com as imagens roteadas pelas câmeras de Bressani. Rádios receptores, monitores, cabos de rede e nobreaks fazem parte da estrutura, 24 horas no ar.
No Youtube, dobrou número de inscritos
O conteúdo tem caráter educativo, com objetivo de entreter o público e instigar os curiosos, segundo Celestino, também programador dos sites:
— É um hobby. Hoje quase não monetiza nada, mas se um dia pagar o custo da luz, de deixar os computadores ligados 24 horas, já está bom.
As páginas do Youtube são Câmera Pôr do Sol Guaíba e Câmera Porto Alegre Airport. O número de inscritos dobrou nos últimos dias, com 5 mil e 14 mil respectivamente, em especial desde sexta-feira (4), quando um piloto da Azul fez os primeiros alertas de objetos luminosos não identificados (ovnis), uma situação ainda não explicada. Os registros divulgados nos canais dos engenheiros na internet se repetiram por cinco dias consecutivos.
— O momento atual é o mais curioso que já vimos nas imagens. Só nessa noite (de terça para quarta, 8 e 9), tivemos 2 mil pessoas ao vivo na live. É espantoso — classifica Celestino.
Além da íntegra, cortes são feitos nos momentos mais instigantes da gravação. Legendados, os compactos rapidamente ganham as redes sociais — algumas publicações ultrapassaram 20 mil visualizações na última semana.
Privacidade foi questionada no condomínio
De início, eles enfrentaram um desafio: vizinhos no condomínio onde o sistema opera demonstraram temor de ter sua privacidade invadida pelas lentes. Os engenheiros apresentaram um relatório onde especificaram que os equipamentos são direcionados dos prédios para fora, sem filmar o dia a dia dos moradores. Apontaram também que a legislação permite gravações, desde que não invada o espaço alheio.
— O Fábio limitou o ângulo de ação, para evitar a exposição dos vizinhos. Jamais mira a câmera pra lá — lembra Bressani, apontando para o apartamento ao lado.
Com acesso público e em tempo real, não há histórico de imagens captadas fora do contexto defendido pelos dois.
A dupla também mantém um perfil no Instagram e um site onde são publicadas fotos e imagens ao vivo. A programação permite que, a cada 15 minutos, seja modificado o cenário em quadro. Nos horários de rush, os usuários preferem focar no trânsito, garantem os engenheiros.
Questionados sobre o mistério que envolve as aparições, ambos sorriem. Não entram em consenso neste tema.
— Um farolete desse tamanho, não pode ser um drone — pondera Bressani, lembrando de uma das imagens.
— É diferente de tudo que já vi, não seguem mesmo aspecto de luzes de aviação. Mas eu não chuto, com certeza, em nada — ressalva o colega.