Um complexo esquema de lavagem de dinheiro que seria coordenado por um dos líderes de uma facção criminosa do Vale do Sinos foi descoberto pelo Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc). A apuração resulta na Operação Beatus, desencadeada na manhã desta quarta-feira (11), que tem como alvo as finanças desta organização.
São cumpridos 17 mandados de prisão preventiva e 48 de busca e apreensão. Ao menos oito pessoas já haviam sido presas.
Além disso, a polícia conseguiu a indisponibilidade de uma série de bens, como fazendas no oeste gaúcho, que seriam usadas pelo grupo criminoso para o transporte de drogas com uso de aeronaves e para a lavagem de dinheiro, veículos e imóveis de alto padrão.
A Polícia Civil obteve ainda os bloqueios de contas bancárias de 29 pessoas jurídicas e físicas. Com todas as medidas, a operação busca o sequestro de ao menos R$ 122 milhões.
Entre os 17 alvos de prisão preventiva está um dos líderes do grupo criminoso, que atualmente está foragido. A reportagem apurou que se trata de Juliano Biron da Silva, 42 anos, que é alvo de ordens de prisão desde outubro por crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Em 2020, Biron foi condenado também em outro caso de repercussão, que envolveu o assassinato de um fotógrafo em Canoas. São alvo ainda três homens, considerados gerentes financeiros, além de demais operadores do esquema, como “laranjas”.
— Eles circulavam muito dinheiro no sistema financeiro, de forma discreta e sofisticada. Conhecem os sistemas de prevenção dos bancos e empresas. Investem na economia de forma difusa, e criaram um pool (grupo que se une com objetivo em comum) de empresas reais e de fachada — afirma o delegado Adriano Nonnenmacher, da Delegacia de Repressão a Lavagem de Dinheiro do Denarc, que coordena a investigação.
Esquema milionário
Durante o período da investigação, segundo a Polícia Civil, esse núcleo da organização criminosa movimentou altas somas de dinheiro, chegando a R$ 577,9 milhões nos últimos dois anos.
Em fases anteriores, no entanto, como na Operação Consortium — na qual a polícia mostrou que a mesma facção se unia a outra, numa espécie de consórcio, para trazer drogas do Paraguai para o Estado — deflagrada em 2022, foram identificadas outras movimentações milionárias. A soma movimentada pelo grupo ao longo dos últimos cinco anos se aproximaria de R$ 1 bilhão, segundo a Polícia Civil.
— Atingimos com essa operação o topo da pirâmide criminosa. A investigação mirou indivíduos que movimentaram vultosas quantias oriundas do crime, além do sequestro e da apreensão de bens imóveis e carros de luxo, demonstrando que as autoridades estão atentas e nenhum criminoso, independente da sua condição financeira, estará imune à responsabilização criminal por parte do Estado — afirma o diretor do Denarc, delegado Carlos Wendt.
As provas obtidas durante a investigação indicam que o grupo agia com sofisticação, realizando uma espécie de emaranhado no sistema bancário. Segundo a polícia, eram realizadas rotineiramente centenas de operações dissimuladas no sistema financeiro, com pulverização dos valores entre os integrantes da organização.
Também seriam usadas empresas reais e de fachada para ocultar os valores ilegais. Os sócios “laranjas” teriam como papel integrar os valores obtidos de forma ilícita, por meio do tráfico de drogas, por exemplo, ao seu capital, para mascarar a origem. A organização usava outras formas mais clássicas de ocultar o dinheiro “sujo”, como a aquisição de propriedades, imóveis e veículos de alto padrão.
Em razão disso, a polícia conseguiu que sejam indisponibilizadas 15 fazendas no interior do Estado — localizadas em cidades como Garruchos, Santo Antônio das Missões e Palmares do Sul — e outros 13 imóveis de alto valor na Grande Porto Alegre, na Serra e em Santa Catarina. Também há ordem de apreensão de veículos, como Land Rover, utilitários, caminhões, BMW, Tiguan, Nivus e Evoque.
A operação é apontada pelo Denarc como a maior da história da Polícia Civil do RS em sequestros de ativos obtidos por meio do tráfico de drogas.
— É um esquema muito complexo e robusto de lavagem de dinheiro. Não trabalham somente com um produto, utilizam vários. Foi a investigação mais técnica que fizemos até hoje. O Denarc investigou e responsabilizou todas as lideranças do narcotráfico das três principais facções em atuação no Estado. É um recado que a polícia dá para eles e para a sociedade. Com a retirada desses R$ 122 milhões acreditamos que vamos conseguir frear um pouco essa organização criminosa — diz o delegado Alencar Carraro, diretor de Investigações do Denarc.
As cidades
Os mandados são cumpridos em municípios como Porto Alegre, Canoas, Alvorada, Cachoeirinha, Novo Hamburgo, Parobé, Charqueadas, Montenegro, Capão da Canoa, Imbé, Gravataí, Gramado e Palmares do Sul, além de outros do oeste gaúcho.
A investigação, segundo a Polícia Civil, também alcançou cidades de outros Estados, como Camboriú, em Santa Catarina, Curitiba, no Paraná, Paraíso, no Tocantins, e Corumbá, no Mato Grosso do Sul. São cumpridos mandados de busca e prisão no Tocantins, no Mato Grosso do Sul e no Paraná. A operação conta com cerca de 200 policiais civis do RS e dos outros três Estados.