Em agosto do ano passado, ao fiscalizar um navio com a bandeira da Libéria, a Guarda Civil espanhola encontrou 182 pacotes, com 198,35 quilos de cocaína. A droga estava submersa, junto ao casco da embarcação, dentro de bolsas, e protegida com cordas e pesos. O navio que chegava a Las Palmas havia partido do Porto de Rio Grande, no sul do Estado. Nesta terça-feira (16), a Polícia Federal desencadeou a Operação Escafandria contra o grupo que seria o responsável pelo envio das remessas de entorpecentes para a Europa a partir da costa brasileira.
O Porto de Rio Grande, assim como o de Paranaguá, no Paraná, era utilizado pela organização criminosa, segundo a investigação, como local para inserção das drogas nos cascos dos navios. Os traficantes agiam de forma que a tripulação da embarcação não teria conhecimento sobre o transporte das cargas de droga. Ao longo dos últimos dois anos, a Polícia Federal buscou mapear como agia o grupo, que atuava no Rio Grande do Sul e em outros Estados.
A investigação da PF apontou que o esquema fazia o uso de mergulhadores para poder se aproximar das embarcações e acoplar os entorpecentes aos compartimentos dos navios de forma discreta. Os traficantes costumam usar as caixas de mar (localizadas na parte externa da embarcação, abaixo da linha da água) para prender e esconder as remessas.
— Eles se utilizavam do modus operandis de mergulhadores para contaminação e inserção de drogas nos cascos dos navios que aportavam no Porto de Rio Grande. Inseriam diversos pacotes em malas, bolsas estanque, que não permitiam a entrada da água. O foco deles, pelo que temos identificado, é a cocaína — explica o delegado da PF Matheus Vivacqua Cechet, que concedeu coletiva à imprensa nesta terça-feira sobre a operação.
Segundo a PF, os criminosos ingressavam no canal de entrada do porto, durante a noite, com pequenas embarcações, com lanchas, para se aproximar dos navios. Ali, eles dispensavam os mergulhadores, carregando as drogas, a uma certa distância das embarcações. Os mergulhadores seguiam até os navios e prendiam os pacotes nos compartimentos. Por vezes, essas operações de tráfico internacional de drogas ocorriam também em alto mar.
Quando o navio chegava ao destino, a organização criminosa tinha integrantes aguardando para fazer a retirada dos pacotes, usando a mesma técnica.
— É um modus operandis que apresenta inclusive risco para os mergulhadores. Em alguns casos, pode ocorrer alguma fatalidade. É algo bem perigoso e exige toda uma logística, tanto para a inserção da droga como para a preparação. Eles realizam diversas idas aos locais, estudos, antes, para então efetuar a contaminação — diz Cechet.
Destinos
Além da Europa, segundo a PF, foram identificados outros possíveis destinos das remessas de drogas enviadas pelo grupo. No entanto, o caso confirmado do envio foi este que resultou na apreensão na Espanha no ano passado. Os policiais ainda apuram há quanto tempo os traficantes estavam lucrando com o esquema. As investigações tiveram início ainda em 2022. A suspeita é de que a organização criminosa já estivesse atuando há pelo menos um ou dois anos.
Segundo a polícia, o grupo tinha uma célula em Rio Grande, de onde eram também as duas principais lideranças, mas possuía ramificações em outros Estados. Os mergulhadores, por exemplo, eram do Paraná. Eles viajavam ao Rio Grande do Sul sempre que precisavam fazer a operação de envio.
— Eles chegavam em Rio Grande, e tinham todo o apoio logístico, com uso de embarcações próprias, lanchas — explica o delegado.
A ofensiva
Durante a Operação Escafandria foram cumpridos 12 mandados de prisão preventiva e 26 de busca e apreensão no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e no Paraná. As ordens judiciais foram cumpridas pelos policiais federais, com apoio da Receita Federal, da Marinha e da Brigada Militar. As ações também contam com a cooperação policial internacional, com a participação da Europol e da polícia da Alemanha.
Quatro prisões foram efetuadas em Rio Grande, uma em Florianópolis e quatro no Paraná. Ainda foi preso um brasileiro, que estava residindo na Alemanha. Este último, assim como o preso em Santa Catarina, é apontado como uma das lideranças do esquema. O homem havia se mudado recentemente para a Europa. Existem dois alvos da operação que não foram encontrados até o momento.
Foram apreendidas embarcações, como lanchas e barcos de pequeno porte, em Itajaí, em Santa Catarina, apreendidos veículos, e aparelhos celulares. Durante o cumprimento das buscas, ocorreram três flagrantes por posse de armamento, e foi identificado um laboratório de drogas. Segundo a PF, ainda é investigado se há envolvimento de alguma facção criminosa no esquema.