No fim de fevereiro, a Polícia Civil descobriu dentro de um apartamento, em Novo Hamburgo, uma falsa delegacia. A suspeita é que a estrutura, com banner, camisetas e distintivo, fosse usada para aplicar golpes. Em março, em duas ações do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) foram apreendidos uniformes policiais falsificados. Neste caso, a suspeita é que as facções criminosas estivessem usando as vestimentas para atacar e executar rivais.
No episódio ocorrido no Vale do Sinos os policiais descobriram a réplica da delegacia enquanto investigavam um foragido, suspeito de tráfico de drogas. Esse tipo de cenário, no qual criminosos forjam uma estrutura policial, costuma ser utilizado para aplicar golpes e extorsões. Os estelionatários gravam vídeos se passando por policiais, e simulando estar numa delegacia. É um contexto bastante usado no chamado golpe dos nudes, por exemplo. O suspeito foi preso em flagrante por tráfico de drogas, posse ilegal de munição de uso restrito e uso indevido de uniforme e alusão simbólica à polícia, mas a apuração do caso segue.
— A apreensão por si só já configurou o crime pelo uso de insígnias, banners e símbolos da Polícia Civil. Para que haja avanço das investigações em termos de golpes realizados, precisamos que haja vítimas e em havendo, que elas nos procurem para fazermos o registro policial — explica o delegado Tarcísio Kaltbach, da 1ª Delegacia de Polícia, responsável pela apreensão.
Até o momento, nenhuma vítima se apresentou na polícia relatando algum caso em que possam ter sido usados os materiais apreendidos. Além dos itens falsificados, a polícia apreendeu ainda porções de crack, cocaína, 14 munições de fuzil calibre 556, 24 munições de calibre 38, uma touca ninja e cerca de R$ 1,2 mil em dinheiro.
Execuções
Para além dos golpes, os uniformes policiais falsos também são empregados pelos criminosos para outro delito: as execuções. No último dia 12 de março, a equipe da 1ª Delegacia de Homicídios da Capital monitorava um possível ataque a tiros na Zona Leste, quando conseguiu chegar até um foragido que foi preso com uma pistola, com carregador expandido e seletor de rajadas, além de munição e drogas.
No mesmo local, os policiais encontraram três coletes balísticos, duas capas táticas para colete balístico, placas balísticas sobressalentes e fardas completas semelhantes às da Brigada Militar, incluindo boinas e coturnos. Um adolescente também foi apreendido.
— Os informes davam conta de um violento ataque a tiros e a apreensão corrobora o que os criminosos pretendiam — explicou a delegada Clarissa Demartini, após a apreensão.
Em outubro do ano passado, a Brigada Militar apreendeu com um homem na zona norte de Porto Alegre, no bairro Jardim Leopoldina, três capacetes, capas de colete balístico, fardas completas de combate, dois coturnos, uma camiseta, luva descartável, além de drogas, balança de precisão e dinheiro. Segundo o comandante-geral da Brigada Militar, coronel Cláudio dos Santos Feoli, embora sejam apreensões esporádicas, essas situações sempre causam preocupação.
— No caso das que se assemelham a fardas da BM, geralmente são cópias grosseiras — detalha.
O uso de fardamentos das forças de segurança por parte de facções tem como objetivo, segundo a polícia, evitar ou ao menos postergar a reação dos alvos. Esse tipo de estratégia costuma ser usada quando membros de facções atacam rivais. Outra explicação para o uso seria despertar menos atenção enquanto se deslocam pelo território inimigo. Num dos casos desse tipo, em maio do ano passado, no bairro Campo Novo, na zona sul de Porto Alegre, um homem de 36 anos foi executado por criminosos que chegaram ao local se anunciando como policiais.
— Sempre damos muita atenção a esse tipo de apreensão, que pode ajudar a esclarecer crimes e demonstra o comportamento do crime organizado. O tipo de criminoso que usa esse artifício de se “fantasiar” de policial para enganar outros criminosos, são os que fazem parte de facções, do crime organizado. Os relatos que mais se repetem são da utilização desse tipo de uniforme falso principalmente para execuções — afirma o delegado Mario Souza, diretor do DHPP.
Também em março, durante a investigação de uma facção pelo assassinato de um motorista de aplicativo foram apreendidas duas camisetas falsas da Polícia Civil. Segundo o delegado Souza, o DHPP segue investigando a origem desses uniformes falsificados, e pretende responsabilizar os envolvidos na fabricação.
— O caminho é investigar quem está fazendo isso, apreender esses falsos uniformes. Punir quem está fabricando. E responsabilizar, não só pelos delitos que possam estar ligados a falsificação de uma roupa, mas muito mais apurar se essa situação pode ou não se enquadrar em auxiliar uma facção criminosa, e pode responder até mesmo por fazer parte do crime organizado — diz o diretor do DHPP.
Algumas apreensões
São Leopoldo
Durante uma operação contra uma facção criminosa investigada por homicídios no fim de março deste ano, entre eles a execução de um motorista de aplicativo, a Polícia Civil apreendeu em São Leopoldo, no Vale do Sinos, duas camisetas falsificadas semelhantes às da corporação. Os uniformes falsificados eram usados, segundo a polícia, durante o cometimento de crimes.
— Eles usavam essas camisas, que se parecem com a da Polícia. Se apresentavam como policiais para praticar crimes. É uma cópia. Vamos aprofundar as investigações sobre isso — disse o chefe da Polícia Civil, Fernando Sodré, durante coletiva sobre o caso.
Porto Alegre – Zona Norte
Em outubro do ano passado, a Brigada Militar apreendeu com um homem na zona norte de Porto Alegre, no bairro Jardim Leopoldina, três capacetes, capas de colete balístico, fardas completas de combate, dois coturnos, uma camiseta, luva descartável, além de drogas, balança de precisão e dinheiro.
No mesmo mês, sete homens foram presos com armas, drogas e fardamentos policiais. A ação foi realizada em uma casa no bairro Parque Santa Fé, também na zona norte de Porto Alegre. Foram encontrados um fuzil, seis pistolas, munição, radiocomunicadores e vários fardamentos, coletes à prova de balas e coturnos similares aos usados por policiais.
Porto Alegre – Zona Leste
A Polícia Civil descobriu um depósito de armas e drogas que uma facção criminosa mantinha na Lomba do Pinheiro, na zona leste de Porto Alegre. Foram apreendidos itens que imitavam fardamentos da Brigada Militar (BM), granadas e uma pistola.
Segundo o delegado Thiago Carrijo, titular da 6ª Delegacia de Polícia de Homicídios e Proteção à Pessoa (6ª DPHPP), os objetos e armas apreendidos eram utilizados em homicídios na Capital. Além das falsas fardas da BM, os policiais civis encontraram réplicas de distintivos que reproduziam a identificação da polícia, coldres, cintos táticos, algemas e até coturnos.
Canoas
Em novembro de 2021, uma operação do Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc) apreendeu mais de 300 itens semelhantes ao fardamento policial — como capacetes, coletes e capas balísticas — em uma residência no bairro Igara, em Canoas. Dois homens foram presos. Foram apreendidas 259 placas de coletes balísticos, um par de algemas, capacetes, coldres para arma, balaclavas, coturnos, luvas táticas, patches da Polícia Civil e gandolas camufladas. Também foram recolhidos 11 símbolos da Polícia Civil e calças camufladas, entre outros materiais.