No fim de agosto, um caso de feminicídio foi descoberto em Pelotas, no sul do Estado. Após o desaparecimento de Leandra Vitória Franco Rossales da Silva, 25 anos, familiares dela desconfiaram da situação. O corpo da jovem foi localizado no mesmo dia, carbonizado num matagal nas proximidades de onde ela residia com o namorado. A investigação apontou que a vítima foi morta com um disparo de arma de fogo e depois teve o cadáver incendiado.
O então namorado Lucas Loi Potenza, 27 anos, foi preso em flagrante e mais tarde se tornou réu pelo crime. Os pais dele, João Luiz Potenza, 70, e Maria de Lurdes Loi Potenza, 72, também foram detidos, mas libertados após pagamento de fiança. O casal foi denunciado por suspeita de ter auxiliado o filho a ocultar o corpo da jovem. Mas, no caso deles, foi concedido um benefício legal: a suspensão condicional do processo. Trata-se de uma espécie de acordo entre a acusação e defesa, previsto na legislação para alguns casos.
Segundo o promotor de Justiça Márcio Schelee Gomes, responsável pela denúncia, o benefício é um direito legal aplicado neste caso, em razão de alguns fatores. Entre eles, estão o tempo de pena previsto para o crime de ocultação de cadáver, que é de reclusão de um a três anos. Também é considerado o fato de os acusados serem primários e possuírem bons antecedentes.
O próprio MP propôs a suspensão do processo, mediante o pagamento de dois salários mínimos ou prestação de serviço para a comunidade por seis meses, entre outras obrigações. Além disso, os dois estão proibidos de se ausentarem de Pelotas pelo prazo superior a 15 dias sem prévia autorização judicial e devem comparecer a cada três meses na Justiça para informar o endereço e justificar suas atividades.
Para que sejam cumpridas essas condições, segundo o Judiciário, houve cisão (divisão) do processo. O acordo foi firmado na última terça-feira (26) entre as partes. Os dois devem cumprirem as obrigações pelo período de três anos. Caso eles descumpram alguma das exigências, podem ser submetidos ao júri pelo crime de ocultação de cadáver. Maria de Lurdes ainda responde por favorecimento real, por ter tentado esconder o revólver que teria sido utilizado no crime.
Neste caso, segundo a advogada criminalista Valéria Amorim, que representa a família da vítima Leandra Vitória, também pesou o fato de que os acusados são maiores de 70 anos.
— A idade é um fator porque, em caso de condenação, por terem mais de 70 anos na data da sentença, a pena aplicada cairia pela metade. O mesmo ocorre com menores de 21 anos. Isso, infelizmente, tornou-se uma das maiores dores da família. Eles terem a oportunidade de receber esse benefício. Mas é uma brecha na lei, que permite isso — explica a advogada.
O que diz a lei
Nos crimes em que a pena mínima for igual ou inferior a um ano, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime.
Contraponto
O advogado Konstantin Knebel, um dos responsáveis por representar Lucas Loi Potenza e os pais dele, informou que a defesa prefere não se manifestar neste momento sobre o caso.
Prevenção ao feminicídio
- Se estiver sofrendo violência psicológica, moral ou mesmo física, busque ajuda imediatamente. Não espere a violência evoluir. Converse com familiares, procure unidades de saúde, centros de referência da mulher ou a polícia. É possível acessar a Delegacia Online da Mulher
- Caso saiba que alguma mulher está sofrendo violência doméstica, avise a polícia. No caso da lesão corporal, independe da vontade da vítima registrar contra o agressor, dado a gravidade desse tipo de crime
- Se estiver em risco, procure um local seguro. Em Porto Alegre, por exemplo, há três casas aptas a receberem mulheres vítimas de violência doméstica
- Siga todas as orientações repassadas pela polícia ou pelo órgão onde buscar ajuda (Ministério Público, Defensoria Pública, Judiciário)
- No caso da lesão corporal, o exame pericial para comprovar as agressões é essencial para dar seguimento ao processo criminal contra o agressor. Procure realizar o procedimento o mais rápido possível
- Caso passe por atendimento em alguma unidade de saúde, é possível solicitar um atestado médico que descreva as lesões provocadas
- Reúna todas as provas que tiver contra o agressor, como prints de conversas no telefone. No caso das mensagens, é importante que apareça a data do recebimento
- Se tiver medida protetiva, mantenha consigo os contatos principais para pedir ajuda. A Brigada Militar mantém em pelo menos 114 municípios unidades da Patrulha Maria da Penha que fiscalizam o cumprimento da medida
- Se tiver medida protetiva e o agressor descumprir, comunique a polícia. É possível acionar a Brigada Militar, pelo 190, ou mesmo registrar o descumprimento por meio da Delegacia Online. Descumprimento de medida pode levar o agressor à prisão
Fonte: Polícia Civil e Poder Judiciário do RS
Onde pedir ajuda
Brigada Militar
- Telefone - 190
- Horário - 24 horas
- Serviço - atende emergências envolvendo violência doméstica em todos os municípios. Para as vítimas que já possuem medida protetiva, há a Patrulha Maria da Penha da BM, que fiscaliza o cumprimento. Patrulheiros fazem visitas periódicas à mulher e mantêm contato por telefone
Polícia Civil
- Endereço - Delegacia da Mulher de Porto Alegre (Rua Professor Freitas e Castro, junto ao Palácio da Polícia), bairro Azenha. As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias. Há 23 DPs especializadas no Estado
- Telefone - (51) 3288-2173 ou 3288-2327 ou 3288-2172 ou 197 (emergências)
- Horário - 24 horas
- Serviço - registra ocorrências envolvendo violência contra mulheres, investiga os casos, pode solicitar a prisão do agressor, solicita medida protetiva para a vítima e encaminha para a rede de atendimento (abrigamentos, centros de referência, perícias, Defensoria Pública, entre outros serviços)