Os dois acusados de assaltar e disparar contra o motorista de aplicativo Enedir Wüst, 49 anos, foram absolvidos pela Justiça, que entendeu não haver provas suficientes para a condenação. Os réus foram denunciados pelo Ministério Público (MPRS) por latrocínio tentado, após o assalto que ocorreu em agosto de 2022, em Novo Hamburgo. Desde então, a vítima estava se recuperando de um disparo que o atingiu na cabeça durante a ação. No sábado (22), ele não resistiu e morreu em decorrência de sequelas, segundo a família.
Conforme o Tribunal de Justiça do Estado (TJRS), "em síntese, os réus foram absolvidos na decisão de primeiro grau pela falta de provas contundentes". O Ministério Público afirma que entrou com recurso contra a absolvição em maio deste ano.
O despacho é de abril deste ano e foi proferido pelo juiz Guilherme Machado da Silva, da 2ª Vara Criminal de Novo Hamburgo. Como o processo corre em segredo de Justiça, a sentença não foi divulgada anteriormente.
O caso aconteceu na noite de 7 de agosto do ano passado, um domingo, na Rua São Jerônimo, no bairro Jardim Mauá. No ataque, dois criminosos que trafegavam em um Ka tentaram abordar a vítima, que estava em um Onix parado em um semáforo. Os homens teriam emparelhado o carro com o veículo da vítima e disparado, segundo a polícia.
Conforme a investigação, o motorista bateu contra o muro de uma casa. Os criminosos ainda tentaram abrir a porta do Onix da vítima após a colisão, mas não conseguiram e fugiram. Nada foi levado.
A investigação sobre o crime levou ao indiciamento dos dois homens por latrocínio (roubo com morte) tentado, em setembro do ano passado. O Ministério Público (MP) fez a denúncia no mesmo mês, e os dois viraram réus. Com a morte de Wüst, o crime deve ser entendido como consumado.
A dupla está presa em razão de outros crimes, segundo o delegado Alexandre Quintão, de Novo Hamburgo.
— Os dois homens confessaram a prática do crime na delegacia, além de termos reunidos outras provas. Eu não iria indiciar e pedir a prisão preventiva deles sem a convicção de que eram os autores — afirmou o delegado.
Morte após quase um ano
Na manhã do último sábado (22), Wüst teve complicações e não resistiu. A causa da morte foi traumatismo craniano grave e ventriculite cerebral (inflamação dos ventrículos do cérebro), ambas decorrentes de complicações após o motorista ser baleado no assalto, segundo familiares. O motorista estava internado desde 12 de junho, quando o quadro piorou.
Wüst é lembrado por pessoas próximas como calmo e prestativo, que estava sempre disposto a ajudar a família. Nas horas livres, Wüst gostava de apreciar a natureza e passear de motocicleta, especialmente aos sábados à tarde. Às vezes, o trajeto era acompanhado por algum amigo, ou então terminava com um grupo de motociclistas reunidos em algum canto do município onde vivia.
Formado em Administração, ele atuava na profissão havia quase 30 anos e era apaixonado pela função. Começou a atuar como motorista de aplicativos temporariamente, para ter alguma renda depois que a empresa onde trabalhava foi comprada e os funcionários foram demitidos.
Conforme a esposa Elizabete Viaziminski, ele já acertava uma nova vaga em outra empresa, e só trabalhou como motorista naquele domingo porque, durante a semana, estaria envolvido com os trâmites do futuro cargo.
— Ele só foi fazer aplicativo naquele domingo porque na semana seguinte tinha entrevistas marcadas para esse novo trabalho, estaria envolvido com isso. Já tinha toda a papelada para começar. Lembro que falei para ele não ir. Ele tinha medo de trabalhar com aplicativo de noite, então fazia durante o dia. Era de tarde, 15h15min, quando ele saiu de casa e me disse: "Vou fazer um pouco e logo volto". Às 17h15min aconteceu o assalto. Me ligaram antes das 18h, quando cheguei no hospital ele já estava no bloco cirúrgico.
A vítima não chegou a completar quatro meses atuando na função, segundo parentes.
Motorista queria ajudar irmão
Havia ainda outro motivo que levou o administrador a trabalhar como motorista de aplicativos, segundo familiares. Em março do ano passado, um irmão dele, Jair, sofreu um acidente de moto e foi internado.
Assim, a renda extra como motorista serviria também para ajudar nos custos dos dois sobrinhos pequenos, enquanto o irmão se recuperava. Após alguns dias internado, Jair acabou morrendo.
— Ele era assim, sempre ajudava todo mundo. Se alguém da família precisasse, ele corria para ajudar. Era uma pessoa boa, cuidava dos irmãos, dos pais. Acabamos perdendo os dois em um intervalo de um ano e pouco. Vi dois irmãos partirem. A gente está arrasado — diz outro irmão, Vanderlei Wüst, 47 anos.
Vítima lidava com sequelas
Desde o assalto, Wüst enfrentava problemas deixados pelo disparo que o atingiu, entre idas e vindas do hospital. Ele teve um AVC hemorrágico em dezembro do ano passado, durante um dos procedimentos a que foi submetido.
Em casa, tinha o apoio da esposa Elizabete, com quem era casado havia quase 25 anos. Técnica em Enfermagem, ela se afastou do serviço por alguns meses para cuidar do marido. Depois, contrataram uma cuidadora para ficar Wüst durante o dia. Também compraram aparelhos para fisioterapia, feita em casa junto com um profissional.
— Ele nunca reclamou de nada. Nem dos exercícios que precisava fazer, da condição em que estava. Era uma pessoa fácil de lidar, a gente também incentivava muito ele a se dedicar a recuperação.
Segundo ela, apesar de toda a readaptação causada pelo assalto, Wüst se mantinha o mesmo no dia a dia e no contato com a família:
— Ele sempre foi uma pessoa calma, na dele, era paciente e calmo. De uma educação exemplar. Isso nunca mudou nele.
Depois de ser baleado, Wüst passou por cirurgia e voltou para casa após 36 dias internado. A esposa lembra que a recuperação havia sido considerada muito positiva na ocasião:
— Para uma lesão assim, ficar praticamente um mês no hospital é pouco tempo. Foi um milagre a recuperação dele.
Na presença de familiares e amigos, ele foi velado no domingo (23).