Em 2021, o desfecho inesperado de um jantar de comemoração de Dia dos Namorados resultou em uma dor que perdura. Na noite daquele 12 de junho, Munike Fernandes Krischke, 45 anos, deslocava-se de carro, junto com o marido, até um restaurante. Quando passavam sob uma das alças de acesso à nova ponte do Guaíba, um paralelepípedo arremessado contra o veículo atravessou o vidro e atingiu a mulher, que não resistiu.
Dois anos depois, a investigação segue em andamento. Sem entrar em detalhes, a Polícia Civil afirma que identificou o autor do arremesso do paralelepípedo, que avalia se pedirá medidas cautelares à Justiça e que deve concluir o inquérito na próxima semana. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a CCR ViaSul, que administra a via, afirmam que intensificaram o policiamento na região e que adaptações foram feitas.
À época da morte de Munike, a principal linha de investigação da polícia era de que a pedra teria sido arremessada para que o carro parasse e então fosse efetuado um assalto. Mas a polícia não descartava ato de vandalismo.
Munike deixou um filho, que hoje tem oito anos e mora com o pai, em Porto Alegre. Era ela quem cuidava da mãe, de 72 anos, com quem dividia um terreno — levava a idosa ao médico, fazia o mercado, pagava contas no banco. Hoje, esse trabalho é dividido entre suas duas irmãs. Uma delas, Sabrina Krischke, 43, montou na casa que era de Munike sua sala de costura, para poder trabalhar perto da mãe. A lembrança da irmã é constante e se intensifica à noite, conta:
— Todo dia, quando chego aqui, tenho a sensação de que ela vai aparecer, de que vai surgir a qualquer momento. Sinto que vou encontrá-la e descobrir que aquilo não foi verdade. Dá uma tristeza, uma saudade muito grande. A gente tem um sentimento de não entender por que isso aconteceu. De noite, quando vou para minha casa e deixo minha mãe sozinha, é a pior parte, porque antes a Munike ficava aqui. Eu sei que minha mãe chora quase todas as noites, mesmo dois anos depois. Principalmente nesse mês, ficamos todos mal. O tempo passa, mas não adianta, ele não apaga.
Sabrina lembra da irmã como uma pessoa divertida, alegre e mãe exemplar. A cada 15 dias, o filho de Munike vai para a casa das tias e da avó, para ficar com a família materna. No mês passado, ele tomou conhecimento do que realmente aconteceu com a mãe.
— Ele é pequeno, então, a gente tinha dito que ela teve um problema de saúde, no coração. Mas agora explicamos o que ocorreu. Ele fez algumas perguntas, ficou tentando entender por que a mãe morreu. No geral, a gente fala mais sobre ela do que do ocorrido com ele, para manter a imagem que ele tem da mãe — explica.
Em relação ao avanço no caso por parte da polícia, Sabrina afirma que a família não havia sido avisada:
— Para nós, indifere quem foi que fez esse arremesso. Eu não vou ter minha irmã de volta, minha mãe não vai ter a filha de volta. O que a gente quer é a responsabilização dos que deveriam garantir a segurança naquele local. Porque pode ocorrer de novo, pode ter mais vítimas. Com a punição, vão tomar providências. O que foi feito até agora, na nossa visão, não é suficiente.
A família da vítima ingressou com uma ação cível contra a CCR e a União, já que a via onde ocorreu o fato é federal. A ação encontra-se em fase de instrução na 2ª Vara da Justiça Federal, ainda sem decisão final.
Adaptações na região do ataque
Após a morte de Munike, o Ministério Público Federal (MPF) abriu expediente para verificar as medidas que deveriam ser adotadas para prevenir novos ataques no local. Em 2021, diversas reuniões foram feitas com representantes da CCR Via Sul e alguns órgãos públicos, como PRF, Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC).
O MPF tafirma que, além das reuniões e de fazer recomendações sobre mudanças, fez diligências no local do fato, enviou ofícios à prefeitura de Porto Alegre (para que realizasse limpeza no local e arredores, recolhendo objetos que possam ser usados em outros ataques), ao Comando da Polícia Militar e à Superintendência da PRF, para que fossem tomadas ações preventivas de segurança nos locais em que ocorrem casos de arremessos de pedras.
Uma das recomendações feitas pelo MPF à CCR é que fosse agilizada a ampliação da iluminação no local — o que já estava previsto em contrato junto à concessionária. A CCR também concluiu a instalação de câmeras de monitoramento, que era uma obrigação contratual e já estava em execução na época do fato. A concessionária ainda instalou placas informando que a rodovia é monitorada por câmeras e faz ciclos de inspeção da rodovia, com circulação de viaturas de tráfego a cada 90 minutos.
De acordo com o MPF, uma das sugestões, no entanto, não foi colocada em prática. A entidade havia recomendado que a CCR instalasse grades ou cercas que dificultem o arremesso de objetos em veículos. Conforme a procuradora Claudia Paim, a possibilidade vem sendo estudada.
— A questão é que, dentro da engenharia de trânsito, não há previsão para se colocar gradis ou outros equipamentos de contenção em trechos de rodovias como o em que ocorreu o acidente. Nós expedimos recomendação para que a ANTT e o Dnit façam estudos técnicos necessários para a implementação desses equipamentos, então, precisaremos ainda estudar se isso será ou não exigido da concessionária — diz a procuradora.
A CCR argumenta que a colocação desses equipamentos não estava prevista em contrato. Se isso for mudado, os valores previstos devem ser reajustados.
Já a PRF afirma que reforçou o policiamento no local, considerado mais seguro após as adaptações.
— Hoje, esse trecho é muito mais seguro do que era na época do fato. As câmeras estão em funcionamento, há iluminação em pontos estratégicos e também fazemos, em conjutno com a prefeitura, a limpeza no local, para recolher materiais que poderiam ser jogados nos veículos na via. Nosso setor de inteligência tambem atua no reforço ao policiamento. Além disso, contamos muito com o apoio das pessoas que trafegam ali, que nos ajudam com denúncias de possíveis delitos. As equipes vão atrás e fazem as abordagens — afirma o chefe da comunicação social da PRF no Estado, Douglas Paveck Bomfim