O Centro de Atendimento Sócio Educativo Feminino do Complexo da Cruzeiro, em Porto Alegre, foi interditado pela Justiça a pedido da Defensoria Pública do Estado. O local é responsável por abrigar sete meninas que cumprem medidas socioeducativas. A interdição, que tem prazo de dez dias prorrogáveis, será mantida até que seja totalmente alterada a lotação (remoção) dos servidores que atuam no local.
“Deverão ser substituídos por agentes lotados nas unidades da Capital que tenham ingressado na carreira pública após a publicação da Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), ou seja, 18 de janeiro de 2012.”
A interdição não determina a remoção das abrigadas, mas sim que qualquer pedido de vaga para ingresso de nova apreendida seja analisado pelo juizado responsável. A decisão é em caráter liminar.
Essa não é a primeira decisão envolvendo a atuação da Fundação de Atendimento Socioeducativo do RS (Fase). Em dezembro, quatro servidores foram afastados por suspeita de agressão na mesma unidade, só que na ala masculina.
No pedido encaminhado à Justiça, a Defensoria aponta uma série de irregularidades que seriam cometidas no local. Entre elas, uma diferença no tratamento entre os educandos homens e mulheres.
“As mulheres sofrem com o hipercontrole dos corpos e das roupas, além da hipervigilância do comportamento e das conversas. Ao passo em que os meninos podem usar suas próprias roupas e conversar com os seus pares sobre suas vidas, as meninas não podem usar suas roupas por serem curtas ou justas, a pretexto, dentre outras coisas, de que homens trabalham na unidade. Também sofrem uma grande cobrança com relação às atividades de limpeza” cita trecho do pedido assinado pelos defensores públicos Paula Simões Dutra de Oliveira, Rodolfo Lorea Malhão e Fernanda Sanchotene.
Na decisão com 54 páginas, publicada na segunda-feira (14), a juíza Karla Aveline de Oliveira transcreve conversa que teve com reeducandas e advogados em fevereiro deste ano, em que ela relata abusos, como a proibição de conversarem entre si:
"Adolescente: a gente quer conversar qualquer coisa. A gente quer interagir. Às vezes até com elas (agentes). A gente não pode ter convívio, a gente não pode se dar. A gente não pode se encostar.
Advogado: E se abraçar, pode?
Adolescente: não, não pode, tia. A gente não pode se encostar."
A Defensoria Pública ainda acrescentou que necessidades básicas como ir ao banheiro e tomar água precisavam de autorização, e que camisas de time eram proibidas para evitar brigas. Em outro trecho, há menção para revistas e agachamentos antes e depois da visita de familiares, o que é vetado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Esclarece ainda que não haverá prejuízo ao atendimento das adolescentes atualmente em cumprimento de medida socioeducativa no local, ressaltando o compromisso da Fundação na garantia dos direitos dos adolescentes.
Contraponto
A Fase informa que está averiguando os fatos trazidos na presente ação e os encaminhamentos necessários para o cumprimento do despacho, em sede de decisão liminar, já estão sendo cumpridos.