Após receber os restos mortais da Justiça italiana e retornar ao Brasil, a família de Gabriel Luiz Dias da Silva aguarda pelo laudo de necropsia para saber a real causa da morte do modelo e personal trainer de 27 anos. Silva foi encontrado sem vida no apartamento de um amigo em Milão com um saco plástico na cabeça, no dia 12 de janeiro.
Silva vivia na Itália desde 2019. Conforme Priscila Goldani, que se define como "mãe de coração", pois criou Silva desde os 4 anos de idade, o gaúcho exercia atividades de modelo e personal trainer, além de serviços rudimentares para ampliar a renda e auxiliar os pais e os quatro irmãos que residem em Gravataí, na Região Metropolitana.
— Ele sempre foi menino muito trabalhador. Não era garoto de programa como alguns tem especulado. Isso nos deixa muito tristes. Não gerei ele, mas é meu primeiro filho. Aprendi a ser mãe com ele. Ele tinha um coração bondoso. O que fizeram foi um crime com todos que o amavam — desabafa, aos prantos.
Priscila conta que, segundo a advogada que representa a família no acompanhamento das investigações, a magistrada italiana responsável pela apuração dos fatos solicitou exames complementares ao laudo de necropsia para definir a causa e eventuais circunstâncias relacionadas à morte de Silva.
O proprietário do apartamento, um homem de 71 anos, responde em liberdade ao inquérito. Ele é considerado suspeito de omitir socorro e de ocultar o cadáver, pois há indícios, de acordo com a família, de que o modelo estaria morto desde o dia 11 de janeiro.
Em um primeiro depoimento, o italiano teria afirmado que Silva estava morto no amanhecer de 12 de janeiro e que os dois estariam no mesmo quarto. Mais tarde, buscou retificar seu testemunho, dizendo que Silva estava em um quarto de hóspedes e os dois, antes de irem dormir, teriam consumido drogas e grande quantidade de bebida alcoólica.
A alegação do suspeito é de que Silva teria cometido suicídio. Contudo, de acordo com os resultados da necropsia e dos demais exames, a investigação poderá dirigir-se para a linha de apuração de um homicídio.
— O Gabriel não cometeria suicídio. Nada indicava que isso pudesse ocorrer com ele. Era rigoroso com o cuidado da saúde, amava a natureza e a vida. Não usava drogas e não cometia excessos com bebida. Precisamos saber a verdade, o que realmente aconteceu com nosso filho — define Priscila.
Pais enfrentam peregrinação por ajuda para resgatar restos mortais do filho
Foram dias de grande angústia e incerteza até que Priscila e o pai de Silva, Luciano Luiz Silveira da Silva, reuniram recurso suficiente para viajar até Milão para resgatar o corpo de filho.
Para chegarem à Itália, foi necessária a realização de uma "vaquinha". Reuniram cerca de R$ 15 mil doados por amigos, familiares e até pessoas desconhecidas que ficaram sensibilizadas com a história.
Chegaram em Milão no dia 29 de janeiro. Precisaram viajar para poderem ter uma cerimônia de despedida. Tiveram que optar pela cremação ainda na Itália, já que o traslado do corpo para o Brasil custaria cerca de R$ 80 mil, valor que a família não dispunha.
— Recebemos ajuda aqui no Brasil e também na Itália, mas apenas das pessoas que enxergaram o nosso sofrimento. Não tivemos nenhum suporte do governo — lamenta Priscila.
Finalmente, no dia 31 de janeiro, os pais de Silva puderam realizar um breve velório antes da cremação, estabelecida como forma mais viável de trazer os restos mortais à Terra Natal. Em 3 de fevereiro, a família estava de volta à Gravataí.
Cinzas vão fertilizar muda de árvore em jardim da família
A família de Gabriel Luiz Dias da Silva decidiu que irá enterrar as cinzas do personal trainer no jardim da casa onde pretendem morar em Gravataí. Os restos mortais serão colocados debaixo de uma muda árvore.
— Nada pode trazer o abraço, a presença, o carinho de volta pra nós. Colocar as cinzas no plantio de uma árvore representa para nós a continuidade do amor pela vida e pela natureza que o meu filho cultivava — explica.
Priscila conta que Silva mantinha uma relação franca e transparente com os familiares. Em 2017, aos 21 anos, ele assumiu sua homossexualidade para os pais.
— Ele me contou e disse que tinha receio de entristecer o pai com a notícia. Disse a ele que nós o amaríamos em qualquer situação, que o nosso desejo era ver ele feliz do jeito dele — descreve.
Segundo a mãe adotiva, um ex-namorado italiano participou das cerimônias de velório e cremação. Nesse encontro com os pais, teria confirmado que Silva não fazia programas íntimos e que vinha se esforçando, buscando trabalhos como garçom e faxineiro, para economizar dinheiro e apoiar os pais na compra de uma casa maior para toda a família em Gravataí.
Itamaraty afirma que prestou apoio nos limites legais
O Ministério das Relações Exteriores argumentou, em nota enviada à GZH, que prestou o auxílio previsto em lei para os casos de morte de brasileiros no Exterior. "Por meio do Consulado do Brasil em Milão, prestou a assistência cabível aos familiares do nacional, em conformidade com os tratados internacionais vigentes e com a legislação local", diz o texto.
Segundo o Itamaraty, em caso de "falecimento de nacional no exterior", os consulados brasileiros podem prestar orientações gerais aos familiares, apoiar seus contatos com autoridades locais e cuidar da expedição de documentos, como o atestado consular de óbito.
"O traslado dos restos mortais de brasileiros falecidos no exterior é decisão da família. Não há previsão regulamentar e orçamentária para o pagamento do traslado com recursos públicos", conclui a nota.