Pelo terceiro mês consecutivo, o Rio Grande do Sul apresentou queda no registro dos estelionatos. Em maio, foram 7.103 casos comunicados à polícia – no mesmo período do ano passado, tinham sido 7.955, ou seja, a redução é de 10,7%. Ainda assim, a média é de 229 ocorrências desse tipo por dia. Os dados fazem parte dos indicadores de criminalidade divulgados mensalmente pela Secretaria da Segurança Pública do Estado.
Ao longo dos últimos dois anos, combater o crescimento dos golpes, especialmente aqueles praticados pela internet, tem sido um desafio para a segurança. Além das trapaças mais antigas, já conhecidas, como o conto do bilhete premiado, os estelionatários foram criando novos métodos para enganar as vítimas e obter lucro fácil. Na tentativa de conter esse tipo de crime, uma das apostas é a prevenção. Por isso, foram lançadas cartilhas informativas e um aplicativo com orientações sobre os principais casos de estelionato.
A repressão, por meio de operações contra o crime organizado, também tem sido estratégia das polícias para tentar frear os casos. Isso porque, muitas vezes, o mesmo grupo está por trás de uma série de ações. Na semana passada, a Polícia Civil realizou a Operação Delta, que teve como alvo um grupo apontado como responsável por movimentar mais de R$ 1 milhão em golpes envolvendo anúncios online (com falso depósito) e o "golpe dos nudes". Pelo menos 40 pessoas, em oito Estados, foram vítimas da mesma quadrilha, que acabou presa.
Mesmo com essas ações, em média, somente em maio, os estelionatários fizeram pelo menos 1,6 mil vítimas por semana no RS. Moradora de Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana, uma dona de casa de 50 anos – que preferiu não ser identificada – procurou a polícia. Ao tentar vender um Corsa, acabou envolvida numa trapaça. Após anunciar o carro em suas redes sociais, foi procurada por um golpista, que disse ser corretor de imóveis e estar em busca de um carro com aquelas características para incluir no negócio de um terreno.
— Ele disse que queria fazer o pagamento por Pix à vista e me pediu para retirar o anúncio. Marcou de ir olhar o carro e me pediu antes para enviar o Renavam (Registro Nacional de Veículos Automotores) para conferir se não tinha restrição. Na hora, até desconfiei se não tinha perigo. Nunca vendi nada pela internet, estava desconfiada. Mas enviei. Ele disse que no outro dia a pessoa com quem ele estava negociando o terreno iria olhar o carro — recorda.
O comprador realmente apareceu no outro dia e a dona de casa acreditou que o negócio estava certo. No entanto, ele lhe entregou R$ 2 mil em dinheiro e fez o restante do pagamento, no valor de R$ 5 mil, para o golpista. Acreditando que isso fazia parte da negociação, a dona de casa aguardou pelo recebimento do valor, que não entrou na conta. Quando foi bloqueada no WhatsApp, percebeu que se tratava de um golpe.
— Quando conversamos, vimos que nós dois fomos enganados. Os dois lados foram vítimas. Ele contou uma história bem diferente para o rapaz. Disse que eu era uma familiar que ele estava ajudando e por isso ele me entregou os R$ 2 mil. Acreditava que o golpista é que era o dono do carro. Não sei como uma terceira pessoa conseguiu enganar os dois lados. Fiquei bem traumatizada e com pena deles. Eles saíram prejudicados. Não conseguiram ter o dinheiro de volta. Eu acho que nem vou conseguir vender o carro agora. Fiquei com muito medo, muito desconfiada. Só quero alertar outras pessoas. Eu sou muito desconfiada e mesmo assim eu caí — afirma a dona de casa.
Ela e o casal lesado procuraram a Polícia Civil, e o caso está sob investigação. Mas nem sempre é isso que as vítimas de golpes fazem. Muitas vezes, por diferentes fatores, como vergonha ou mesmo descrença de que o caso poderá ser resolvido, acabam não informando o crime à polícia. Há episódios em que as vítimas também demoram a se dar conta de que caíram em um golpe. Tudo isso impacta nos indicadores desse tipo de delito.
Morador de Nonoai, no norte do Estado, Cidinei Nogueira, 39 anos, relata ter sido alvo de um golpe em maio, mas até hoje não procurou a polícia. Ao tentar comprar um veículo, um Siena 2013, o operador de máquinas encontrou um anúncio num grupo do Facebook. Pelo telefone, passou a negociar a compra do carro pelo valor de R$ 30 mil. Acertou que daria uma entrada de R$ 3,5 mil e parcelaria o restante. O suposto proprietário disse que estava em Florianópolis, Santa Catarina, e precisaria viajar até Nonoai para entregar o carro.
— Ele disse que a mulher dele falou que precisava ter uma garantia antes de fazer 10 horas de viagem. Então, acabei mandando R$ 1 mil. No caminho, ele disse que estava em Concórdia e o carro estragou. Me mandou inclusive a localização e foto em um posto de gasolina. Mandei mais R$ 600 e até hoje o carro não chegou. Falei que ia na polícia e ele me bloqueou — relata.
Desconfiar sempre
Titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos e Defraudações do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o delegado André Anicet alerta tanto para o risco de as pessoas realizarem negociações pela internet com desconhecidos, sem garantia de que receberão o pagamento ou o bem adquirido, como para o compartilhamento de documentos ou mesmo imagens pessoais, que podem ser usados por criminosos.
— Após enviado, o documento ou a foto pode ser compartilhado milhares de vezes. Pode ser usado inclusive para abrir contas. Desconfiar sempre, este é o alerta que sempre faço e repito — reforça.
Além de desconfiar, o delegado alerta para as vítimas nunca passarem dados pessoais quando recebem, por exemplo, contato por telefone, informando ser de uma agência bancária. Outra dica é reduzir o limite do Pix no aplicativo do banco. Caso seja alvo de algum golpe, o prejuízo pode ser menor do que se tiver um limite de alto valor.
— Tem casos que eles mandam instalar aplicativos espiões, que fazem espelhamento da tela do smartphone. Com isso, conseguem ter acesso a todas as senhas e logins da vítima e fazer transferências bancária. Se receber esse tipo de contato, desligue o telefone imediatamente. Faça contato com a agência bancária, com o gerente — orienta o delegado.
Confira outras dicas
- Golpistas, em geral, oferecem vantagens para atrair a vítima e têm pressa para obter lucro. Fique atento a isso
- Não envie dados pessoais ou cópias de documentos para desconhecidos
- Se estiver acertando qualquer tipo de aluguel, seja por temporada ou permanente, visite o imóvel antes de fechar o negócio
- Na hora de comprar algo pela internet, desconfie se o site só aceitar pagamento por boleto ou transferência, se tiver falhas ou erros na página e se o único contato for por WhatsApp
- Desconfie de publicações na internet que ofereçam serviços e bens por um valor abaixo do preço de mercado
- Não adquira produtos pela internet sem antes se certificar de quem está vendendo. Mesmo que seja um perfil conhecido, só efetue o pagamento após conversar diretamente com a pessoa
- No momento do pagamento, seja por Pix ou transferência, confira se o nome do destinatário é o mesmo de quem está adquirindo o produto
- Não repasse códigos recebidos no celular, por exemplo. Essa é uma das principais estratégias usadas para hackear contas no WhatsApp e no Instagram
- Certifique-se de que a pessoa com quem você está conversando, por WhatsApp, por exemplo, é ela mesma. Para isso, uma dica é telefonar para a pessoa
- Desconfie de ligações de desconhecidos e nunca repasse informações pessoais
- Durante a venda de algum item, só entregue o produto após o dinheiro entrar na conta ou receber o valor. Não confie em comprovantes de transferência porque eles podem ser falsificados
- Se tiver um familiar idoso, oriente a pessoa sobre os golpes mais comuns e como se prevenir deles
- Caso seja vítima, registre a ocorrência. É possível utilizar a Delegacia Online. Reúna todas as informações que podem servir como provas, como dados bancários, conversas por mensagens e fotografias
Fonte: Polícia Civil do RS