Cerca de 400 policiais civis cumprem nesta quarta-feira (22) 502 medidas judiciais, sendo 21 de prisão, 63 de busca, além de apreensão de imóveis, veículos, bloqueios de contas bancárias e de demais atividades financeiras contra duas facções gaúchas — uma tem base na zona sul de Porto Alegre e outra no Vale do Sinos — que estavam em guerra na Capital. No início do ano, mais de 20 pessoas morreram em razão dos confrontos entre os criminosos. Uma organização criminosa que atua em todo o Brasil a partir de presídios paulistas também é alvo da ofensiva policial, que ocorre em 10 Estados. Até as 8h30, 14 pessoas haviam sido presas.
Os três grupos, por meio de 58 investigados, movimentaram em apenas um ano o valor de R$ 347,8 milhões, num grande esquema de lavagem de dinheiro. A chamada Operação Pegasus, que conta com ação de helicóptero, é coordenada pela direção do Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc) diretamente do Ministério da Justiça em Brasília.
A maioria das ordens judiciais são cumpridas no Estado: Porto Alegre, Canoas, Cachoeirinha, Alvorada, Eldorado do Sul, Santa Vitória do Palmar e Chuí. Além de bens e atividades financeiras, estão na mira 11 líderes do tráfico, 12 operadores financeiros, alguns laranjas , e cinco doleiros. No restante do país, os alvos são gerentes financeiros, laranjas e empresários. Os suspeitos são de Garopaba, no litoral catarinense, Matinhos e Palotina, no Paraná, Franco da Rocha e Francisco Morato, em São Paulo, Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, Pouso Alegre, em Minas Gerais, Goiânia, capital de Goiás, Salvador, na Bahia, Porto Velho, em Rondônia e Humaitá, no Amazonas.
Investigação
Adriano Nonnenmacher, delegado titular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Lavagem de Dinheiro do Denarc, comanda a investigação. Segundo ele, o esquema de lavagem de dinheiro adotado tem como objetivo pulverizar ou fracionar ao máximo a distribuição do dinheiro oriundo do tráfico de drogas no Estado. A investigação identificou orientações para investir em empresas reais, ou seja, não montar estabelecimentos apenas de fachada, além da compra de dólares, investimentos na bolsa de valores e em 41 operadoras de criptomoedas em todo o Brasil. Tudo para dificultar o rastreamento.
Para o delegado, o que chama a atenção é que tudo começou com a prisão de um traficante e a apreensão de fuzis no bairro Cascata, zona sul de Porto Alegre, em 2019. Nonnenmacher, aliás, já esteve à frente, em 2020, de uma ação que apurou o fato de uma destas facções ter uma fazenda no Mato Grosso do Sul com quase três vezes o tamanho de Porto Alegre. No ano passado, o delegado coordenou outra ação envolvendo o mesmo grupo paulista atuando aqui no Estado por meio de investimentos na bolsa, em criptomoedas, além de carros e imóveis de luxo.
— Fizemos quebra de sigilo telefônico, já que ele teve celular apreendido, e aprofundamos o trabalho ao descobrir diversos contatos dele com operadores financeiros gaúchos e de São Paulo. Ele havia feito três depósitos para três paulistas em Franco da Rocha, donos de empresas — diz Nonnenmacher.
Com a quebra do sigilo fiscal e também de ações na bolsa de valores, a polícia pôde iniciar a apuração sobre mais um esquema de lavagem de dinheiro e que, nesta quarta-feira, deu origem à “Operação Pegasus” em 10 Estados. A investigação apontou a existência de células interligadas nestas regiões — há outras ainda sob investigação — e todas ligadas a um grupo de operadores financeiros, tanto pessoas físicas quanto jurídicas, em São Paulo. Entre 2019 e 2020, o Denarc chegou ao valor de R$ 347,8 milhões movimentados pelas duas facções gaúchas e por outra paulista.
Lavagem de dinheiro e apreensões
Em suma, após o dinheiro da venda de drogas ir do Rio Grande do Sul para São Paulo, ele era repassado para contas bancárias e para empresas de outros oito Estados. Depois disso, voltava para São Paulo, já sem as comissões dos envolvidos, mas com alguns rendimentos, e era novamente investido na bolsa, em criptomoedas e também algumas porcentagens retornavam para operadores gaúchos. No Estado, ainda era enviado para doleiros ou depositado novamente na conta de laranjas e até mesmo usado para aquisição de bens, bem como para investir no tráfico.
Durante a investigação, um grande operador logístico e financeiro gaúcho foi preso, em 2019, com 1,5 tonelada de maconha e R$ 500 mil em espécie pela 4ª Delegacia do Denarc, sendo alvo de nova prisão preventiva nesta quarta quarta-feira, bem como apreendidos na zona leste da Capital, em outra ação, fuzis, munições e cocaína pela 2ª Delegacia do Departamento.
— Suspeita-se que somente este alvo teria movimentado cerca de 8 toneladas de drogas para o Estado, através de uma transportadora de Ponta Porã, também alvo no dia de hoje (quarta-feira) com bloqueio de bens da pessoa jurídica e prisão de seu sócio — explica Nonnenmacher.
Outro alvo nesta quarta-feira, um gerente financeiro preso em São Paulo, movimentou R$ 55 milhões em seis meses em suas contas como pessoa física e jurídica, além de manusear as contas de empresas em Ponta Porã. A polícia ainda apurou que, boa parte de todos os 58 investigados é de regiões de fronteira ou onde há portos e aeroportos.
— Esse trabalho é de extrema relevância para o Estado porque a polícia identificou a rota do dinheiro que vem transformando a configuração do narcotráfico no Rio Grande do Sul. Não é um esquema novo, mas com diferenciais e com aumento do volume de dinheiro em milhares de transações financeiras — diz o diretor do Denarc, delegado Carlos Wendt, que está em Brasília comandando a operação no Ministério da Justiça.