O Tribunal do Júri de Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro, absolveu, na manhã desta quarta-feira (13), Carlos Ubiraci Francisco da Silva, filho afetivo de Flordelis, pela morte do pastor Anderson do Carmo. Acusado, entre outros crimes, de homicídio triplamente qualificado, Carlos Ubiraci acabou condenado a quatro anos e seis meses de prisão, em regime semiaberto, por associação criminosa. Outros três réus também foram sentenciados, nenhum por homicídio.
Outro filho biológico de Flordelis, Adriano dos Santos Rodrigues, foi condenado a quatro anos e três meses por uso de documento falso e associação criminosa. O ex-PM Marcos Siqueira Costa, por sua vez, foi condenado a cinco anos por uso de documento falso e associação criminosa. A mulher deste, Andrea Santos Maia, foi condenada a quatro anos e três meses de prisão pelos mesmos delitos.
Outro filho adotivo de Flordelis, André Luiz de Oliveira, também seria julgado, mas o advogado dele passou mal. O julgamento dele foi suspenso e será remarcado.
O julgamento no Fórum de Niterói durou mais de 20 horas, sendo que o veredicto foi anunciado pouco depois das 9h desta quarta-feira. O julgamento havia começado às 10h45min de terça-feira (12), e os jurados ficaram reunidos por mais de duas horas para decidir o caso.
Desde que iniciou o julgamento, na manhã de terça-feira, 12 testemunhas — incluindo os dois delegados que participaram da investigação — e os quatro réus prestaram depoimentos no Fórum de Niterói, o que acabou alongando o depoimento por quase um dia.
Em novembro de 2021, Flávio dos Santos Rodrigues, filho biológico de Flordelis acusado de disparar os tiros que mataram Anderson, foi condenado a 33 anos e dois meses de prisão por homicídio triplamente qualificado, porte ilegal de arma, uso de documento falso e associação criminosa armada.
Na mesma ocasião, Lucas Cézar dos Santos de Souza, filho adotivo que teria ajudado a comprar a arma do crime, foi condenado a sete anos e meio de prisão por homicídio triplamente qualificado. A pena foi reduzida porque ele colaborou com as investigações.
No dia 9 de maio, ocorrerá o terceiro e mais aguardado julgamento: o da própria Flordelis, que está presa e por conta da acusação teve o mandato parlamentar cassado. Ela nega ter sido a mandante do assassinato do marido.
Assim como havia ocorrido no julgamento de novembro, também neste que terminou nesta quarta-feira o envolvimento de Flordelis foi mais debatido pelas testemunhas e pelos réus do que a própria participação daqueles que eram julgados.
A primeira a testemunhar foi a delegada Bárbara Lomba, que no dia do crime era a titular da Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí, responsável pela investigação. Ela esteve na cena do crime e coordenou a primeira parte das investigações.
Ao longo de um testemunho de quase três horas, respondendo perguntas da Promotoria, da assistência de acusação e dos advogados de defesa, a delegada declarou que as investigações apontaram para uma divisão na família da pastora, com uma parte dos filhos tendo regalias em relação aos outros. Disse ainda que um grupo, incluindo a própria Flordelis, estava descontente com a conduta de Anderson do Carmo. Segundo ela, o pastor era o gestor financeiro da família e determinava todos os passos da deputada.
A segunda testemunha foi o delegado Allan Duarte, responsável pela conclusão do inquérito, com o indiciamento dos acusados. Respondendo a uma pergunta formulada por um dos jurados, Duarte afirmou que o crime "foi iniciativa da Flordelis" e que "ela foi a mentora" do assassinato.
Depois prestaram depoimento filhos adotivos de Flordelis, duas netas e uma mulher que empregou Lucas, o filho condenado em novembro. Todos fizeram críticas a Flordelis e lançaram suspeitas ou acusações sobre a conduta dela.
— Aquilo não era uma casa, era um hospício — disse Regiane Ramos, ex-patroa de Lucas.
Uma neta de Flordelis — filha de um filho adotivo da pastora — afirmou que quem era adotado tinha que fazer todas as tarefas domésticas, enquanto os filhos biológicos não trabalhavam. Ela afirmou ainda que todos os moradores da casa sabiam que Flordelis e alguns de seus filhos estavam tentando matar Anderson do Carmo por envenenamento.
— Todos sabiam, até ele sabia, mas ele não queria acreditar — afirmou.
Histórico
Flordelis nasceu e foi criada na favela do Jacarezinho, na zona norte do Rio de Janeiro. Aos 14 anos, perdeu o pai e um irmão em um acidente de carro. Nessa época já acompanhava a mãe nos cultos de uma igreja evangélica da favela e cantava no coral. Começou a ajudar crianças envolvidas com o tráfico de drogas, fundou uma igreja (o Ministério Flordelis) e fez sucesso como cantora.
Anderson era 16 anos mais novo que ela e, ao se aproximar da família de Flordelis, primeiro namorou uma filha dela. Depois acabou se casando com a pastora. Segundo a Polícia Civil e o MP-RJ, era ele quem comandava as carreiras política, religiosa e artística da mulher. Flordelis e alguns de seus filhos estariam discordando das decisões de Anderson, e por isso teriam tentado matá-lo envenenado, sem sucesso.
Por volta das 4h de 16 de junho de 2019, o casal chegou de um passeio e Flordelis entrou em casa, no bairro de Pendotiba. Anderson foi abordado por criminosos e levou mais de 30 tiros. Ele chegou a ser socorrido para o Hospital Niterói D'Or, no bairro de Icaraí, mas morreu. O pastor tinha 42 anos.
Segundo o MP-RJ, Flordelis foi responsável por arquitetar o homicídio, arregimentar e convencer o executor direto e demais acusados a participarem do crime e simular um latrocínio (roubo seguido de morte). A deputada também financiou a compra da arma e avisou da chegada da vítima no local em que foi executada, afirma a denúncia.