Álvaro Hauschild, 29 anos, doutorando em Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), foi indiciado, na tarde desta sexta-feira (15), pelo crime de racismo qualificado. De acordo com a Polícia Civil, as mensagens e publicações feitas pelo bolsista são de cunho preconceituoso e ferem a Constituição.
O crime prevê pena de um a três anos de detenção. No entanto, além de mensagens enviadas, Hauschild fez ainda publicações em blog e redes sociais, o que qualifica o crime e amplia a pena, estimada em dois a cinco anos, no entendimento da polícia. GZH tenta contato com o bolsista para esclarecimentos.
O caso ficou conhecido depois que o estudante do curso de Políticas Públicas da UFRGS Jota Júnior, 24 anos, expôs, há algumas semanas, conversas que teve com o bolsista. Hauschild fez contato, pelo Instagram, com a namorada do estudante e passou a afirmar que ela estaria "passando vergonha" e fazendo "caridade" por se relacionar com ele. Júnior relata que percebeu que o nível das mensagens indicava racismo, e pediu para a namorada que seguisse conversando com o doutorando.
— O crime está bem caracterizado, inclusive porque ele admite a autoria das mensagens. Entendo que ele atingiu a uma coletividade, é um crime muito mais amplo do que a injúria racial. As mensagens e publicações dele abarcam vários grupos, não só a questão racial, mas de preconceito religioso, de homofobia, contra LGBTs. Ele deixa bem claro que acredita em uma superioridade de raça, traz questões misóginas. É uma discriminação ampla, a toda uma raça — pontua a delegada a frente do caso, Andrea Mattos, titular da delegacia de Combate à Intolerância.
Pela lei, racismo consiste em atingir uma coletividade indeterminada de pessoas, discriminando a integralidade de uma raça, cor ou etnia. É a teoria ou crença que estabelece uma hierarquia entre as raças. Já a injúria racial ocorre quando se ofende a honra de um indivíduo, valendo-se de elementos referentes à raça, cor, etnia ou origem. Ambos configuram crime.
Segundo a delegada, além de cometer o crime de racismo, Hauschild também tenta induzir terceiros, ao compartilhar seus pensamentos, o que também está previsto no artigo 20 da lei que trata do assunto, que diz que é proibido "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional":
— Na conversa, podemos ver que ele tenta convencer a namorada do aluno a concordar com o que ele diz. E nós obtivemos depoimentos de outras alunas também, que relatam a mesma abordagem, por parte dele, em outras oportunidades. São pessoas que têm medo de se identificar, mas afirmam que passaram pela mesma situação com ele.
Hauschild foi ouvido novamente nesta manhã, conforme a delegada, e negou novamente que tenha cometido o crime. Andrea afirma que o bolsista entende que apenas expressou uma opinião, mas que não teria praticado violência.
— É importante que se diga que a liberdade de expressão não é um direito absoluto. No momento em que esse direito violar um direito constitucionalmente assegurado a outrem, deve existir a devida punição e limitação — complementa a delegada.
A polícia informou que Hauschild tem ocorrências anteriores por perturbação da tranquilidade e perseguição, registros que não estão relacionados a questões raciais.
A UFRGS informou que analisa a denúncia encaminhada por Júnior, para decidir se irá abrir processo disciplinar para investigar o caso. Outro processo contra Hauschild foi aberto, no começo do mês, depois que a universidade recebeu um dossiê enviado por alunos. O material traz um compilado de publicações feitas pelo bolsista, que também teriam cunho racista.
Mensagens
Nas mensagens entre os dois, postadas nas redes, Hauschild também teria questionado a namorada de Júnior sobre como seriam os filhos dos dois e afirmado que a jovem seria "descendente de vikings"
"Se a mistura influencia? Mas é óbvio. Isso significa que teus filhos vão perder uma enorme carga genética prussiana. Tu como médica deve saber ainda que europeus têm gens recessivos e negros gens dominantes em boa parte do código genético. Isso significa que o povo europeu é o que é porque foi guerreiro e se purificou, se defendendo contra invasores".
Hauschild também teria dito que a pessoa negra "exala um cheiro típico, libera substâncias no ambiente e na troca com parceiros". Mas que isso poderia ser resolvido se a jovem "ficar alguns anos sem se relacionar com negros" e "então pode ter a certeza de que não haverá influência".
O que diz Álvaro Hauschild
GZH tenta contato com o doutorando para contraponto. No Instagram, ele divulgou nota após a repercussão do caso: "Fizeram uma postagem me caluniando. Os autores inclusive me bloquearam. Tudo será resolvido de maneira limpa segundo a lei."
Em nota, em postagem no último dia 7, o bolsista fez um pedido de desculpas.
"Peço desculpas a todos aqueles a quem ofendi e também ao meu acusador (...) por tê-lo feito se ofender por questões raciais e palavras que lhe tenham causado mal estar. De fato, ofendi meu acusador com expressões de desprezo e gostaria de me retratar. (...) A muitos parece que a mensagem desrespeita pessoas negras e, mais uma vez, peço desculpas se assim, de fato, lhes ocorreu. Não houve esta intenção."