Um médico de Cruz Alta, no noroeste do Estado, é investigado pela Polícia Civil por suspeita de violação sexual mediante fraude de pacientes durante consultas no município. A Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) já ouviu o depoimento de 10 mulheres que afirmam ser vítimas do profissional.
No final de julho, duas mulheres procuraram a polícia para denunciar o médico. Ambas apresentaram relatos semelhantes, o que acendeu um alerta para os investigadores. Além disso, em consulta ao histórico do homem, os agentes encontraram outras duas ocorrências também com descrição parecida.
— O que nos chamou atenção é que todas as ocorrências realizadas em oportunidades diferentes por vítimas diferentes eram muito semelhantes, porque elas descreviam as mesmas atitudes em todas as consultas — afirma a delegada Jaqueline Pellegrini.
De acordo com o relato das mulheres, os fatos teriam ocorrido durante consultas de medicina do trabalho, uma das especialidades do profissional.
— O que a gente percebeu é que, a pretexto de fazer um exame, ele estaria tocando nas partes íntimas superiores das vítimas, em situação que deixava elas constrangidas. Não era um exame de mama, por exemplo, que fosse necessário um toque — complementou a policial.
Após ouvir as duas primeiras vítimas, a polícia passou a fazer contato com outras mulheres que haviam contado situação semelhante para amigas ou conhecidas, mas que não haviam tido coragem de denunciar. Com isso, outras oito mulheres foram identificadas. A polícia espera que mais pacientes prestem depoimento após o caso vir a público.
Em 30 de julho, após obter autorização judicial, a polícia esteve na casa e no local de trabalho do médico para cumprir mandados de busca e apreensão. Foram recolhidos computadores e o celular, que estão passando por extração de dados para checagem do conteúdo.
O nome do investigado não foi revelado pela polícia até o momento, sob alegação de que atrapalharia a apuração.
O Conselho Regional de Medicina do RS (Cremers) disse a GZH que recebeu, em 29 de julho, denúncia da Justiça sobre os relatos de abuso sexual feitos por quatro pacientes contra o médico. No mesmo dia, foi aberta uma sindicância e solicitada a manifestação do acusado. O prazo para retorno expirou no domingo (15) e, por isso, será reiterado.
Após a manifestação do médico, pode ser aberto um processo administrativo, que deve ouvir todos os denunciantes para, ao fim, ter uma conclusão sobre a sanção a ser tomada. A decisão é feita por uma câmara que envolve sete conselheiros da entidade.
Enquanto a sindicância tem o seguimento, o profissional segue com a licença ativa.
Perícia psíquica
As vítimas, além de prestar depoimento na polícia, foram encaminhadas para perícia psíquica no Instituto-Geral de Perícias (IGP), em Porto Alegre. A técnica consiste em uma entrevista investigativa composta de dois momentos: relato dos fatos notificados e avaliação do estado mental. No primeiro momento, a vítima é convidada a relatar o que aconteceu. Depois, são feitas algumas perguntas mais específicas, para aumentar a quantidade e a qualidade das informações.
O entrevistador procura perceber se o relato do evento traumático se mantém ao longo da narrativa e qual o impacto psíquico que a situação notificada trouxe à vítima. Também avalia se os sinais e sintomas de sofrimento psicológico apresentados guardam nexo causal com o fato que foi relatado.
O procedimento é realizado por peritos médico-legistas com formação em psiquiatria ou peritos criminais da área da psicologia. Ao final, é produzido um laudo com a conclusão do profissional, que ainda não foi finalizado nesse caso.
Terceiro caso envolvendo médicos
Este é o terceiro caso recente de denúncias de mulheres contra médicos por suspeita de abuso sexual durante consultas. Nos dois anteriores, um fator em comum: após a divulgação na imprensa, mais vítimas encorajaram-se a procurar a polícia.
O primeiro caso envolveu o ginecologista Cairo Barbosa, de Canguçu, no sul do Estado, que virou réu por violação sexual mediante fraude de quatro pacientes. O caso foi divulgado em maio. Em poucos dias, outras 13 mulheres denunciaram que também teriam sido vítimas.
O outro envolve o cirurgião plástico Klaus Brodbeck, indiciado na última quinta-feira (12) por estupro de vulnerável (uma das vítimas era menor de idade na época dos fatos), violação sexual mediante fraude, assédio sexual, importunação sexual e coação no curso do processo. O caso veio à tona quando havia 12 vítimas, em 13 de julho. Em cerca de 15 dias, porém, mais de cem mulheres procuraram a polícia.
Sobre os três casos, o presidente do Cremers, Carlos Isaia Filho, afirma que vê os casos com "extrema preocupação e profunda tristeza":
— Infelizmente, está acontecendo. Nós, recentemente, já suspendemos o exercício profissional de dois médicos também pelo mesmo tipo de queixa. Não podemos, de forma alguma conviver com esse tipo de denúncia e o código de ética médica é muito claro nesse sentido.
Como denunciar
A Delegacia de Polícia Especializada no Atendimento à Mulher de Cruz Alta pode ser contatada pelos telefone (55) 3322-6160. Denúncias podem ser recebidas pelo WhatsApp da Polícia Civil: (51) 98444-0606.
Também está disponível o número da Central de Atendimento da Mulher, pelo número 180.