A Polícia Federal (PF) deflagrou nesta quinta-feira (13) mais uma operação na região de Passo Fundo, no norte gaúcho, contra um esquema envolvendo fornecimento de equipamentos médicos para hospitais da região e para uma clínica médica catarinense. Desde 2018, é pelo menos a terceira ação e, desta vez, 80 agentes cumpriram 17 mandados de busca em cinco cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.
Três médicos e cinco pessoas ligadas a duas empresas são investigados por um prejuízo ao Sistema Único de Saúde (SUS) estimado em R$ 1,5 milhão através do redirecionamento de produtos neurocirúrgicos.
De acordo com a investigação, empresários pagavam para médicos comissões entre 20% e 25% dos valores de equipamentos utilizados em 84 procedimentos, com prejuízos ao SUS. O valor milionário é referente ao período de 2013 a 2018, considerando apenas os procedimentos realizados através da rede pública.
A apuração indica ainda que parte dos valores era entregue em envelopes, de forma dissimulada, durante eventos médicos realizados no Brasil. Tudo sem qualquer tipo de declaração fiscal. Em alguns casos, o delegado Sandro Bernardi, chefe da Delegacia da PF em Passo Fundo, diz que houve indícios de que produtos vencidos tenham sido implantados em pacientes, já que vários materiais utilizados estavam próximos da data de vencimento.
— A operação é decorrente de outras sobre corrupção médica no redirecionamento de equipamentos e, com isso, descobrimos relações criminosas de um neurocirurgião com duas empresas. Primeiro recebia comissão das duas fornecedoras e depois passou a ser sócio oculto de uma delas, recebendo dividendos pelo fornecimento dos materiais que ele mesmo utilizava, fornecia e direcionava a aquisição para os hospitais — diz Bernardi.
Alvos
São dois médicos suspeitos que atuam nos dois principais hospitais de Passo Fundo. Por enquanto, a PF diz que, apesar de mandados de buscas nas instituições, não foi apurado envolvimento das direções. As ordens judiciais foram relativas à atuação dos dois profissionais da saúde apenas.
O outro médico suspeito atua em uma clínica em Lages, Santa Catarina, e foi apontado por também receber comissão para redirecionamento de equipamentos. Nomes não foram divulgados porque a investigação continua.
A PF também identificou que o principal investigado, um médico, teria se tornado sócio oculto de uma fornecedora de materiais cirúrgicos e que a aquisição desses produtos pelo hospital em que atuava também era submetida a sua influência.
Buscas
Os mandados de busca ocorreram nos hospitais de Passo Fundo, na clínica catarinense, nas sedes das duas fornecedoras de produtos e na casa dos três médicos, assim como nas residências das cinco pessoas ligadas às empresas.
Em Passo Fundo, foram seis ordens judiciais. Em Porto Alegre foram outras seis, como, por exemplo, nas empresas e nas casas dos representantes. Em São Paulo e Florianópolis, nas outras sedes das mesmas fornecedoras, e em Lages, no Estado vizinho, na residência e na clínica de um dos três médicos.
Os crimes são de corrupção passiva, corrupção ativa e sonegação tributária. Mas a PF ressalta que outra fraude também é investigada de forma paralela. Um dos médicos suspeitos teria feito acordo com uma empresa privada para elaborar estudo clínico que apontaria a eficácia de um dos equipamentos cirúrgicos produzidos — usado pelo SUS — e comercializado por ele.
A PF aponta que, devido a um desacordo comercial, o investigado teria alterado de forma deliberada o resultado do estudo e indicado que o produto apresentava complicações superiores a 90% da eficácia. A investigação está no início e ainda não há muitos detalhes.
Outras operações
A operação desta quinta, cuja investigação se iniciou em 2019, é decorrente de outras duas ocorridas no primeiro semestre de 2018, sobre desvio de mais de um R$ 1 milhão do SUS em hospital de Passo Fundo e sobre a criação de uma empresa de fachada, do ramo de consultoria em Santa Catarina, que foi usada na época para repasses irregulares de verbas do SUS.