Na cena, homens conversam tranquilamente, pisoteando sacos plásticos pretos. O criminoso que faz a gravação em vídeo explica: "Estou cravando ela todinha, ficou só a caixa".
Para entender do que estão falando, é preciso assistir à gravação macabra que foi espalhada em redes sociais. Os criminosos estão em um imóvel terminando de ensacar partes do corpo de uma mulher esquartejada. A "caixa" citada na gravação é o tronco com roupas que resta caído no box do banheiro. Ao fim da imagem, um homem com uma faca na mão sorri.
A Polícia Civil recebeu a gravação na última segunda-feira (1º). Os desafios eram vários: saber em que cidade ocorrera o crime, o endereço daquele imóvel — para coleta de vestígios —, além da identidade da vítima e dos matadores.
No sábado (6), a Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Canoas desencadeou a Operação Gota D'Água, com apoio da Brigada Militar, para cumprir prisões e buscas.
O apartamento que aparece na gravação fica no condomínio Arlindo Gustavo Krentz, na Rua Machadinho, no bairro Rio Grande. É um complexo residencial dominado por facção criminosa e rotineiramente alvo de ações policiais — em novembro, Polícia Civil e BM fizeram no local a Operação Cativeiro, motivada pelo sequestro da sogra de um policial militar.
Na terça-feira (2), a DHPP de Canoas registrou ocorrência do caso da morte gravada e intensificou a busca por detalhes. Com apoio de informações coletadas na rua pela BM, tiveram a indicação de que o local seria o condomínio conhecido como "Machadinho". A identificação ocorreu a partir de detalhes internos do imóvel, como azulejos.
Mais diligências foram realizadas para tentar identificar o criminoso que sorri com a faca na mão. Ele e o homem que gravou a ação foram identificados e tiveram prisão decretada. Conforme o delegado Robertho Peternelli, o pedido de prisões e buscas foi feito ao Judiciário na manhã de sexta-feira (5) e, no mesmo dia, os mandados foram deferidos.
— Foi um homicídio cruel. Chamou a atenção a maneira descontraída com que os homicidas conversam entre si, parecendo que faziam isso sempre. A operação teve o mérito de encontrar o local e coletar mais elementos para o trabalho — destaca o delegado.
Luminol usado por peritos mostrou sangue espalhado no banheiro
O local identificado por policiais é um apartamento estrategicamente situado no último andar de um dos blocos do condomínio Machadinho, de frente para a portaria. Com essa localização, destaca o delegado Peternelli, é possível ter pleno controle sobre quem acessa o residencial. Inclusive, serve de posto para monitorar ações policiais.
Ao entrarem no local e flagrarem elementos que apareciam no vídeo, como um tênis com detalhes amarelo e um balde azul, os policiais tiveram certeza de ter achado o imóvel em que ocorreu o crime. O condomínio foi tomado com apoio de policiais militares e do helicóptero da polícia.
O Instituto-Geral de Perícias (IGP) foi acionado para buscar vestígios. O luminol revelou muito sangue espalhado pelo banheiro. Os peritos recolheram amostras de sangue — que podem servir para identificar a vítima — e também de DNA, que pode pertencer aos criminosos. Além dos dois identificados, a polícia investiga a participação de mais bandidos na ação.
O homem que fez a gravação usava tornozeleira eletrônica, que foi rompida. Uma mulher foi presa no local por suspeita de envolvimento.
A polícia também apurou que a morte da vítima foi definida como punição por ela supostamente estar passando informações do grupo criminoso a uma facção rival. A gravação parece ser uma forma de prestar contas da ação, em detalhes, a um mandante.
— O que mais choca nesse vídeo, além da barbárie, é a sensação de impunidade dos autores, que filmam um esquartejamento de cara limpa. A ação imediata da Polícia Civil ao receber esse vídeo é a demonstração de que crimes bárbaros como este jamais vão ficar sem punição — destacou a delegada Vanessa Pitrez, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa.
A identidade da vítima ainda é um mistério, pois não há registro de mulheres desaparecidas nos últimos dias. Os pedaços do corpo teriam sido tirados do apartamento dentro de uma mala. Um carro que pode ter sido usado pelos criminosos foi apreendido e será analisado pelo IGP.
Duas hipóteses para o sumiço do corpo já chegaram ao conhecimento da polícia: a mala teria sido jogada com pedras em um rio ou os pedaços do corpo teriam sido enterrados sob concreto. A investigação da DHPP de Canoas continua.
A polícia pede que qualquer informação sobre outros envolvidos ou a identidade da vítima seja repassada. As denúncias podem ser anônimas. Para informações sobre o caso: 0800 64 20 121 ou 9 8416 7109.