O professor de História Vinicius Pompeo, 37 anos, de Santa Maria, foi denunciado pelo Ministério Público por estupro de vulnerável e importunação sexual. O caso veio à tona após série de relatos nas redes sociais e chegou à Polícia Civil por meio de um dossiê, elaborado por um por grupo de jovens da cidade, contando situações constrangedoras vividas em sala de aula entre 2011 e 2019. O material serviu de ponto de partida para a investigação.
Em agosto, GZH publicou o relato de quatro ex-alunas de Pompeo. As jovens contam que, na escola, o professor de História acariciava suas partes íntimas, agarrava-as pela cintura, dava beijos no pescoço e fazia com que elas sentassem em seu colo durante as aulas. As quatro ex-alunas ouvidas pela reportagem ao longo do mês de julho – duas de 23 anos, uma de 20 anos e uma também adulta que prefere não revelar a idade – tiveram sua identidade preservada.
— Nos corredores, ele chegava por trás, abraçava pelas costas, na altura dos ombros, fazia massagem. Beijava meu pescoço e falava que, além de tudo, eu era cheirosa. Tinha abraços longos. Ficava conversando e a mão escorregava para os peitos, bunda, coxa. Ficava apalpando enquanto abraçava. Mexendo, a mão subia e descia. Isso na frente de colegas, em rodas de conversa. Me incomodava com esses toques — relatou uma das ex-alunas a GZH.
A denúncia foi oferecia pelo promotor André Fernando Rigo, integrante da Promotoria de Justiça Criminal de Santa Maria. Como o caso corre em segredo de justiça, Rigo optou por não se manifestar.
A denúncia descreve o fato, analisa todos os depoimentos incluídos no inquérito da Polícia Civil e sintetiza as apurações comandadas pela delegada Roberta Trevisan. O MP indicou sete pessoas como vítimas e outras 27 como testemunhas dos fato. O conteúdo será analisado nesta semana pelo juiz Vinicius Borba Paz de Leão, titular da 4ª Vara Criminal de Santa Maria.
Na fase do inquérito policial, foram ouvidas mais de 50 pessoas e identificadas 21 vítimas. Todas as jovens eram adolescentes na época dos episódios. As situações investigadas teriam acontecido em duas escolas particulares de Santa Maria — no Colégio Marco Polo e no Colégio Franciscano Sant'Anna — e em dois cursos pré-vestibulares — ambos fechados atualmente. As direções das instituições foram ouvidas pela polícia, mas nenhuma delas disse já ter registrado alguma reclamação da conduta do professor. Neste ano, Pompeo atuava no Colégio Marco Polo, mas foi afastado em 23 de junho.
Em agosto, GZH também contatou as instituições. O Colégio Franciscano Sant'Anna preferiu não se manifestar, enquanto o Colégio Marco Polo afirmou que "o assunto deixou a direção, professores e colaboradores e toda comunidade escolar em choque, pois, até então, não tinha recebido registros de reclamações de alunas".
Delegado regional de Santa Maria, Sandro Meinerz explica que a Polícia Civil trabalhou para filtrar os relatos que circulavam nas redes sociais, identificar os indícios de crime, apontá-los no inquérito e responsabilizar o suspeito para que atitudes como essa não voltem a acontecer:
— O inquérito foi muito bem feito, ouviu muita gente e coletou muitas versões. O fato teve enorme repercussão na cidade por se tratar de uma denúncia contra um professor de Ensino Médio que tem contato com adolescentes. O inquérito conseguiu trazer à tona o que era verdade daqueles relatos, filtrou tudo que estava nas redes sociais para dar resposta completa à comunidade. Isso criou um alerta para esses fatos.
Esta denúncia trouxe à tona algo que vinha acontecendo há tanto tempo e que, em alguma medida, as vítimas até acharam que aquilo que era normal. E não é normal. Isso é muito comum no estupro, na violência sexual ou nas formas de importunação: a pessoa não perceber em um primeiro momento.
SANDRO MEINERZ
Delegado Regional de Santa Maria
Na avaliação do policial, a investigação permitiu denunciar situações que vinham ocorrendo há algum tempo sem que houvesse registro de ocorrência. Também promoveu novas denúncias, que estão sendo apuradas em relação a outros professores:
— Quando esse fato acontece em ambiente escolar, onde existe ascendência do professor em relação ao aluno, o adolescente tem receio de reportá-lo em casa ou com os amigos e acha que é o culpado por algo que acontece. Na medida que esse fato veio à tona, outras denúncias acabaram aparecendo e estamos avaliando, estão em análise. Mas o caso grave era o dele (Vinicius Pompeo) — afirma Meinerz.
Para o delegado, a discussão do caso trouxe a oportunidade de as escolas estabelecerem protocolos internos para estas situações com regras que norteiem procedimentos a serem adotados quando se toma o conhecimento de suspeitas como essa. Além de terem dever de comunicar à polícia qualquer suspeita, segundo o Meinerz, cabe às instituições de ensino se mobilizar para verificar os fatos.
— Esta denúncia trouxe à tona algo que vinha acontecendo há tanto tempo e que, em alguma medida, as vítimas até acharam que aquilo que era normal. E não é normal. Isso é muito comum no estupro, na violência sexual ou nas formas de importunação: a pessoa não perceber em um primeiro momento. E o adolescente demora a identificar pois está em fase de desenvolvimento físico e psicológico, passando por um turbilhão de emoções internas.
Representantes de três vítimas, a advogada Magali Flores Rodrigues adianta que ainda não teve acesso à denúncia, mas explica que o modo de agir do professor era sempre o mesmo, com uma série de meninas, em anos e escolas diferentes. E que a relação de professor e estudante inibia as garotas de denunciarem o comportamento de Pompeo:
— Algumas foi de forma mais velada e outras bem explícita. Agora, quando uma menina fala, as outras tomam coragem também de falar.
Contraponto
Em depoimento à polícia, Pompeo negou os relatos e disse que os fatos não ocorreram da forma como foram narrados pelas ex-alunas. O responsável inicial pela defesa do professor deixou o caso. GZH ligou para o educador, mas ele preferiu não se manifestar.