O adolescente de 12 anos assistia à TV em casa com a mãe, uma tia, as irmãs e os primos, em março de 2013, quando homens encapuzados invadiram o local. Os criminosos atiraram seis vezes contra a mãe do menino, mataram a tia com um disparo de calibre 12 na cabeça e atingiram uma irmã dele com um tiro em um dos olhos.
Por telefone, ele pediu socorro à avó materna, que encontrou as crianças em pânico e sujas de sangue. Ao falar com a polícia, o menino fez um pedido peculiar: "Delegado, gostaria que prendesse meu pai". Fábio Fogassa, o Alemão Lico, já estava preso por outros crimes e foi apontado como mandante do ataque à casa em que a família se escondia, por não aceitar a separação da mulher.
Sete anos depois, o jovem é o principal alvo da Operação Rebelde, que coíbe o tráfico de drogas e foi batizada em alusão ao perfil dele: aos 19 anos, Yuri Rohdt Laules Fogassa já foi apontado por envolvimento em seis homicídios, como adolescente, e é suspeito de ser mandante de um assassinato após completar a maioridade. Conhecido como Capiroto, ele foi preso em março do ano passado, sete dias após completar 18 anos, por envolvimento em um assalto, em Rondinha.
O Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) realiza na manhã desta sexta-feira (3) operação para sufocar o tráfico de drogas que seria comandado por Yuri de dentro da Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ). São cumpridas quatro ordens de prisão preventiva e sete mandados de busca e apreensão.
O negócio, segundo a polícia, conta com apoio da mãe do jovem, Joseane Rohdt Laules, que sobreviveu ao ataque de 2013. Conforme a investigação, ela e o filho comandam a venda de entorpecentes em uma região do bairro Agronomia, na Vila Tamanca, em Porto Alegre. Seriam "herdeiros" dos negócios de Fábio Fogassa, apontado por autoridades como líder de facção e que está recolhido ao sistema prisional federal, fora do Estado.
A investigação do Denarc, comandada pela delegada Caroline Barbosa Jacobs, durou um ano e meio e tem outros investigados além dos quatro alvos que tiveram prisão decretada. Em conversa captada com autorização judicial, Joseane diz a um interlocutor que foi o pai que transformou Yuri em matador.
Joseane tem condenação por tráfico e, atualmente, cumpre prisão domiciliar em Sapiranga. A polícia não revelou nomes, mas GaúchaZH apurou que ela, Yuri e mais duas suspeitas são os investigados que tiveram prisão preventiva decretada.
O crime que levou Yuri para a prisão foi um assalto a uma joalheria, em Rondinha, realizado em 2 de março de 2019, um dia após ter completado 18 anos. Ele foi preso dias depois, por porte de arma.
Yuri estava no Interior se escondendo de criminosos rivais por causa de um homicídio em que estaria envolvido. É apontado como um dos responsáveis pela morte de uma menina de 12 anos, ocorrida em janeiro do ano passado, também em decorrência de guerra entre facções.
Quando soube da prisão, a mãe temeu que ele retornasse à Fundação de Atendimento Socioeducativa (Fase), por causa do conflito com a facção que seria a dominante da entidade. Foi então que ela ligou para a polícia para denunciá-lo pelo assalto. Segundo a polícia, Joseane queria que ele ficasse preso no Interior e não retornasse à Fase, de onde era foragido. Teria dito que não "queria que o filho seguisse o mesmo caminho do pai". A estratégia não funcionou.
Além da suspeita do assalto de Rondinha e da de ser o mandante da morte de um ex-aliado no tráfico, ocorrida em 2019, Yuri ainda tem ativos, de quando era adolescente, procedimentos por três homicídios e por um caso de lesão corporal.
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Irmã de Yuri ficou cega em ataque
Na ação de criminosos contra Joseane em 2013, em Viamão, uma filha dela e de Fogassa, que tinha nove anos à época, foi atingida em um dos olhos e ficou cega. A ex-mulher de Fogassa e os filhos sustentaram em depoimentos terem reconhecido como atiradores homens que trabalhavam para Fogassa e, como motorista de um dos carros da fuga, uma mulher que se relacionava com o criminoso.
Yuri disse a autoridades que a mãe havia se separado do pai por estar cansada por ele ter "acabado com várias famílias". E mais: Yuri relatou que um dos atiradores usava preso a um colete à prova de balas um telefone celular ligado e que relatava ao interlocutor a ação na casa.
Uma prima de Yuri foi além e contou ter ouvido a voz de Fogassa, que daria risadas do outro lado do aparelho. Essa menina é filha da irmã de Joseane, que foi morta no local com um tiro na cabeça.
Joseane, atingida com seis tiros, ficou 45 dias internada sob esquema de segurança, pois havia a suspeita de que criminosos tentariam concluir a missão de matá-la. Por mais de uma vez, ela disse a autoridades que era ameaçada pelo ex-companheiro.
Inclusive, conforme o delegado Carlos Wendt, que atuou no caso à época, o mandante do crime teria elaborado uma lista de pessoas que deviam ser procuradas pelos comparsas para que revelassem o paradeiro de Joseane. Quem não colaborasse, devia ser morto.
Segundo Wendt, cerca de 10 homicídios teriam ocorrido por conta disso, até a ex-mulher de Fogassa ser localizada. Depois do ataque, a polícia deflagrou a Operação Águas de Março para prender membros da quadrilha.
Curiosamente, durante a conclusão do inquérito, Joseane voltou atrás, dizendo ter se enganado ao afirmar que o ex-companheiro fora o mandante do crime. Chegou a pedir para ser ouvida novamente na Justiça.
Em um julgamento de outro caso para o qual Fogassa foi trazido ao Estado, em 2019, ela acabou dando depoimento e inocentando ele. Os suspeitos de envolvimento no ataque de 2013, incluindo Fogassa, ainda não foram julgados pelos crimes.
Quem é Fábio Fogassa
- Quando foi transferido para fora do Estado, em 2017, tinha 36 anos a cumprir de uma pena de 54 anos.
- Era considerado um dos principais líderes da facção Bala na Cara, mas hoje já não tem o mesmo prestígio. Tem condenações por roubo e extorsão, tentativa de homicídio, homicídio e porte ilegal de arma. Fogassa foi indiciado duas vezes por tráfico de drogas e uma por associação ao tráfico em investigações do Denarc.
- Segundo autoridades, a partir da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), teria comandado o tráfico de drogas, sobretudo, da Vila dos Sargentos, no bairro Serraria, zona sul de Porto Alegre.
- Em 2016, foi denunciado por envolvimento, como mandante, no ataque que resultou na morte, por engano, do empresário Marcelo Oliveira Dias, 44 anos, executado a tiros no estacionamento de um supermercado do bairro Cavalhada, na zona sul de Porto Alegre. A vítima foi confundida com um rival da quadrilha.