O inquérito da Polícia Civil sobre a morte do engenheiro Gustavo dos Santos Amaral, 28 anos, em uma barreira da Brigada Militar em Marau, no norte gaúcho, em abril deste ano, inocentou, nesta segunda-feira (22), o brigadiano que atirou. O delegado Norberto dos Santos Rodrigues entendeu que o policial confundiu o celular que o rapaz segurava com uma arma. Por isso, para o responsável pela investigação, o que aconteceu naquele momento foi uma "legítima defesa imaginária", sem nenhum indício de crime.
— Chegamos à conclusão de que houve um erro, com certeza, com uma série de coincidências infelizes, aliado ao comportamento da vítima, que estava em pânico. Acabamos deixando de indiciar o policial militar pelo delito de homicídio qualificado com a fundamentação de uma legítima defesa putativa, que é uma legítima defesa imaginária — disse o policial.
De acordo com o delegado, o que ocorreu é "uma tragédia, e ponto". Rodrigues garante que a investigação foi minuciosa:
— Foram dois meses de muito trabalho. O inquérito tem mais de 200 páginas. Procuramos fazer o inquérito minucioso, cobrindo todos os ângulos do que ocorreu no fato. Foram ouvidas 11 pessoas: 10 testemunhas e o investigado. Desde o início, houve acompanhamento dos advogados das partes. Até foi feito um mapa esquemático muito detalhado, com a posição do carro, das pessoas e os seus deslocamentos.
Ainda segundo a investigação, Gustavo foi atingido por um tiro, pela frente, em um dos ombros. Questionado sobre a legítima defesa mesmo com a vítima desarmada, o delegado pondera:
— As circunstâncias que se apresentaram para o policial militar, naquele milésimo de segundo, naquela ocorrência, o enfrentamento que teve com a vítima nas coincidências infelizes. O criminoso e a vítima usavam casacos similares. A vítima correu em trajeto semelhante ao que o criminoso fez.
O inquérito foi remetido ao Judiciário sem nenhum indiciado. O Ministério Público deve se manifestar se concorda com o entendimento do delegado, pede mais investigações ou denúncia o policial à Justiça. GaúchaZH procurou a promotoria e aguarda retorno.
O caso
De acordo com a Polícia Civil, a Brigada Militar procurava um carro furtado e por isso montou uma barreira. Ao se aproximar, a Amarok que estava com os bandidos bateu no carro em que estava Gustavo e seus colegas de trabalho — eles haviam parado em razão da barreira. Foi dada voz de prisão ao criminoso. Naquele momento, Gustavo teria passado correndo para se proteger em um dos carros e o policial se confundiu.
— Eles usavam jaquetas muito similares uma com a outra. Foi dada voz de comando, o Gustavo não parou e o policial deu a volta nesse carro e encontrou ele (Gustavo) — detalha Rodrigues.
O advogado dos PMs que atenderam a ocorrência, José Paulo Schneider, concorda com o delegado. Ele usa a mesma palavra do delegado: "uma tragédia".
— A gente recebe essa conclusão com naturalidade, mas claro, com pesar pela dor da família. As provas orais colhidas e provas técnicas confirmam que não estamos diante de uma execução. Não houve tiro pelas costas, não houve dois disparos. Foram dados três disparos e um único atingiu a vítima. O que aconteceu é uma tragédia, pela dinâmica dos fatos, que acabou levando o soldado em erro — disse o defensor.
Ainda segundo ele, os depoimentos se complementam e não há contradições no inquérito, que, para ele, foi "incrivelmente profundo".
— Ele acreditou que estava reagindo a uma ameaça. Ele dispara com convicção e o Gustavo estava com as mesmas vestes, ou parecidas, com o motorista da Amarok — alega Schneider.
GaúchaZH tenta contato com o advogado da família de Gustavo. Na última semana, o irmão gêmeo da vítima, Guilherme dos Santos Amaral, disse que o rapaz foi confundido com um bandido durante a abordagem por ser negro.
— Em dois meses, aconteceram dois casos iguais. O caso do Gilberto (Andrade de Casta Almeida, atingido por policiais militares em Gravataí), angolano, e o do meu irmão. Não são fatos isolados — criticou.