A sequência de disparos que alvoroçou a silenciosa Paraí, na madrugada desta sexta-feira (6), marcou um plano frustrado de criminosos que pretendiam explodir duas agências bancárias na área central do município de 7,6 mil habitantes da serra gaúcha. A Brigada Militar se antecipou à ação do bando, que acabou interceptado no momento do ataque ao Sicredi e ao Banco do Brasil.
Com armas longas e pistolas, os assaltantes reagiram abrindo fogo contra os policiais militares, que revidaram. Os sete ladrões tombaram mortos.
Além dos armamentos, os criminosos ainda portavam explosivos, que seriam empregados para conseguir acessar os valores dos caixas eletrônicos e cofres. No entanto, não houve tempo para que eles fossem detonados. O Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Brigada Militar foi acionado por conta dos dispositivos, que ficaram no local.
Dois dos assaltantes usavam moletons da Polícia Civil. Com os criminosos, também foram encontradas máscaras e miguelitos — ferros ou pregos retorcidos empregados para furar pneus e impedir a perseguição policial. Os ladrões chegaram ao município em dois veículos, por volta da 1h30min:
— Tem três criminosos mortos dentro da agência do Banco do Brasil e outros quatro nos arredores da agência do Sicredi — descreveu, ainda durante a madrugada, o policial civil do município Silvano Mezzomo.
De casa, a cerca de quatro quilômetros do local do ataque, o prefeito Gilberto Zanotto conseguiu ouvir o tiroteio. O chefe do Executivo recorda que o último ataque a agências bancárias do município havia acontecido em 2013. Daquela vez, não houve emprego de explosivos e nem mortes, completamente diferente dessa madrugada.
— Foi um pânico muito grande. A cidade está mobilizada, pois é uma coisa inédita — afirmou à Rádio Gaúcha, lembrando ainda que o município conta com sistema de câmeras de segurança que pode colaborar na investigação.
Os sete mortos foram identificados, mas não tiveram os nomes divulgados. GaúchaZH apurou que um deles é Eroni Francisco Tauchen Lourenço, 44 anos. Ele estava foragido e era natural de Osório, no Litoral Norte. Mais velho do bando, foi baleado após quebrar as vidraças do Banco do Brasil, invadindo o local com dois comparsas. Nas costas, carregava mochila com seis quilos de explosivos, fitas adesivas e celulares. Segundo a Polícia Civil, os outros seis são tinham menos de 30 anos e a maioria possuía histórico criminal.
A ação da Brigada Militar
O confronto entre a BM e os criminosos não aconteceu ao acaso. A ofensiva faz parte da Operação Angico, ação de prevenção a roubos e furtos de bancos no interior do Rio Grande do Sul. Subcomandante-geral da corporação, o coronel Vanius Cesar Santarosa confirmou que a polícia já tinha informações sobre um possível ataque na região.
— Colocamos nossos agentes próximos de locais estratégicos. Foi uma ação cirúrgica, rápida. Os criminosos optaram pelo confronto. Houve intensa troca de tiros — disse.
Desde a noite de quinta-feira (5), os policiais já estavam preparados para um possível ataque a banco na Serra. Paraí se encaixa no perfil alvo de assaltantes de bancos: entre 2009 e 2018, 60% dos municípios gaúchos com menos de 10 mil habitantes foram alvos de ataques a agências bancárias.
Um dos motivos é que essas cidades, em geral, têm menos policiamento. No caso desta sexta-feira, no entanto, a inteligência policial já havia detectado os movimentos do grupo criminoso.
O período de início de mês é considerado mais crítico, por conta do risco de assaltos. Entre o final da noite e o início da madrugada, 32 policiais de batalhões de Caxias do Sul e Bento Gonçalves foram descolocados a Paraí.
— Talvez tenham achado que seriam guarnições da cidade, mas eram policiais bem armados, e, infelizmente, em decorrência da opção que eles escolheram, acabaram em óbito — definiu o comandante-geral da Brigada Militar, Rodrigo Mohr Picon, em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade.
Por outro lado, o comandante afirmou que a polícia busca interceptar a ação dos bandidos antes que eles cheguem ao alvo e afetem as comunidades do Interior.
— Temos de melhorar mais. Não podemos chegar até este ponto de haver confronto. Estamos cada vez mais especializando a inteligência para que antes (da ação criminosa) possamos realizar a prisão, até porque eles andam armados, com veículo roubado — afirmou o comandante-geral.
Conforme o delegado João Paulo de Abreu, titular da Delegacia de Roubos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), pistolas, submetralhadora e espingardas foram encontradas nas agências. Também havia material explosivo nos dois bancos, que não chegaram a ser detonados.
— Eles entram com marretas, quebram as vidraças e depois forçam os caixas com pés-de-cabra. Pelo que vimos inicialmente não deu tempo de acessar nenhum terminal para retirar o dinheiro — explica.
"Filme de terror"
Os moradores de Paraí foram acordados no meio da madrugada com o barulho dos disparos.
— Cena de faroeste. Foram mais de 200 tiros — disse um morador.
Ainda de acordo com moradores, lojas que ficam próximas às agências também tiveram as vidraças quebradas por conta do confronto.
— Foi tiro, tiro e tiro. Olhei para o Banco do Brasil e vi a Brigada escondida nos arbustos. Atiraram, e os caras revidaram. Deu cinco minutos, começou no Sicredi — contou um empresário.
Durante o ataque, quatro dos assaltantes tentaram fugir, invadindo o estacionamento de uma loja de móveis, nos fundos de uma das agências bancárias. Cercados, correram em direção a uma oficina mecânica.
— Antes de entrar a polícia falou para eles se renderem, gritando "perdeu, perdeu", e eles atiraram de volta — disse o dono do estabelecimento.
— Um filme de terror na nossa pequena e calma Paraí — descreveu outro morador.
Ao amanhecer, o resultado do tiroteio ficou ainda mais evidente, com vitrines estilhaçadas e vidros espalhados pelas calçadas. No entorno dos bancos atacados, carros tinham marcas de tiros e pneus furados pelas balas trocadas entre as forças de segurança e os bandidos.
— Não acredito ainda que isso aconteceu em Paraí. Às vezes, nem fecho a porta de casa — disse a dona de uma loja.
— Foi aterrorizante. Cidade pequena, as dez da noite não se ouve mais nada — disse o proprietário de um restaurante.
Próximo das 10h, um robô foi foi utilizado pela Polícia Civil para remover as mochilas que permaneciam dentro do Banco do Brasil. Como os assaltantes foram mortos antes de fugir, e as bolsas podiam conter explosivos, foram recolhidas e levadas a uma área segura.
O confronto
O primeiro tiroteio entre os assaltantes e a Brigada Militar aconteceu no Banco do Brasil, na Avenida Castelo Branco. Três assaltantes foram surpreendidos pelos policiais e reagiram. Eles morreram dentro da agência. Cerca de cinco minutos depois, houve novo confronto no Sicredi, na Rua Sete de Setembro.
Os quatro criminosos que estavam no banco invadiram o estacionamento de uma loja de móveis, aos fundos da agência. Dois foram mortos no trajeto e outros dois tentaram pular a cerca de uma oficina, mas um cachorro no pátio impediu que eles entrassem. Houve nova troca de tiros e eles também morreram.
Explosão no Vale do Rio Pardo
Além do ataque na Serra, houve outro assalto a agência bancária, no Vale do Rio Pardo. No município de Segredo, cinco ladrões encapuzados e armados explodiram um caixa eletrônico do do Banrisul, por volta de 3h30min. Eles fizeram um morador refém na ação.
— A explosão foi muito forte, o que mostra que a ação foi amadora — afirmou o subcomandante-geral da Brigada Militar, Vanius Cesar Santarosa, que esteve no local.
Com a explosão, as paredes da agência ficaram marcadas por tinta vermelha, em razão do dispositivo de proteção que mancha as notas quando um caixa é danificado. Após ouvir o estrondo, um morador saiu de casa. Acabou sendo agredido pelo bando com uma coronhada na cabeça e mantido refém até o fim do assalto. Para o delegado João Paulo Abreu, da Delegacia de Roubos do Deic, não há relação entre esse ataque e o da Serra.
Participaram desta reportagem: Alana Fernandes, Aline Ecker, Bibiana Dihl, Cid Martins, Eduardo Pinzon, Leticia Mendes e Tiago Boff.