A Polícia Civil marcou para as 14h desta quarta-feira (29) o novo depoimento da jovem de 18 anos que presenciou a morte do namorado e dos pais dele no bairro Lami, na zona sul de Porto Alegre, no último domingo (26). A jovem estava com o outro filho do casal assassinado, dentro do carro da família, que bateu no veículo do homem apontado como atirador.
O objetivo principal da polícia é verificar se a mulher, que já depôs no dia do triplo homicídio — que ocorreu após uma briga de trânsito —, viu se o sogro estava armado. Uma das alegações de Dionatha Bitencourt Vidaletti, 24 anos, preso na terça-feira (28), é de que agiu em legítima defesa após desarmar Rafael Zanetti Silva, 45 anos.
— Temos que confirmar ou negar, por meio de provas técnicas e também testemunhais, se a vítima tinha uma arma, se houve luta corporal, enfim, montar o quebra-cabeças — explicou o delegado Rodrigo Pohlmann Garcia, responsável pelo caso.
À polícia, Vidaletti disse ainda que jogou a arma no chão, após tirá-la de Zanetti, mas que antes levou coronhadas. Segundo o jovem, a mãe dele, que estava junto, foi agredida.
Depois disso, conforme o depoimento do preso, ela teria pego a arma e atirado no chão na tentativa de cessar a briga. Vidaletti afirmou ainda que tirou a pistola dela e atirou em Zanetti, na esposa dele, Fabiana Silva, e no filho do casal, Gabriel Silva.
A arma, segundo o atirador, ficou no local. Sobre as coronhadas, a polícia aguarda resultado do exame de corpo delito, mas aparentemente, Garcia relatou que não havia sinais marcantes no corpo do homem preso.
Em contato com o advogado de Vidaletti, Marcos Ribeiro de Sousa, GaúchaZH recebeu a informação de que uma nota será enviada à imprensa.
Imagens e perícias
A equipe do delegado também está analisando imagens dos dois carros — das vítimas e do atirador — passando por ruas do bairro Lami, durante perseguição e antes do local onde houve os disparos. A polícia ainda pediu urgência no resultado dos laudos de necropsia e do trecho onde houve as mortes. Garcia informou que o objetivo é verificar a posição dos corpos e a trajetória dos projéteis, tudo para confirmar ou negar a versão de Vidaletti.
Por fim, a polícia negocia com advogado da família para apresentação da mãe do jovem, já que o depoimento dela é considerado fundamental. Por enquanto, ela não foi localizada e está tendo a conduta averiguada.
O prazo para conclusão do inquérito é até o dia 7 de fevereiro, e o caso apurado é, por enquanto, de triplo homicídio duplamente qualificado por motivo fútil e que impossibilitou a defesa das vítimas. Vidaletti foi encaminhado para o sistema prisional — em princípio, em uma cela reservada para preservar a sua integridade.
"Nunca tinha visto uma cena dessas"
A polícia também está ouvindo uma moradora do bairro Lami que presenciou parte dos fatos. Em um áudio divulgado nas redes sociais, ela confirmou que a mãe de Vidaletti havia atirado para o chão e que o autor dos disparos teria brigado com a vítima, além de também ter tentado fugir do local inicialmente.
O delegado Garcia também está buscando mais testemunhas do crime — moradores do entorno —, bem como provas e familiares ou amigos das vítimas para tentar saber se Zanetti usava uma arma, como alega o atirador. Também foi feito contato com a Polícia Federal para verificar se a vítima tinha registro, posse ou porte desta pistola.
Uma testemunha foi ouvida por GaúchaZH nesta quarta-feira. Ela prestou depoimento à polícia na terça.
Quando ouvi, pensei que fossem bombinhas. Depois que percebi que eram tiros. Ouvi a caminhonete (Ecosport) arrancando, olhei pela janela e vi os corpos no chão. A guria estava chorando muito, desesperada.
DONA DE CASA
Testemunha do crime
— Quando ouvi, pensei que fossem bombinhas. Depois que percebi que eram tiros. Ouvi a caminhonete (Ecosport) arrancando, olhei pela janela e vi os corpos no chão. A guria estava chorando muito, desesperada. Estava ao lado do rapaz, do namorado dela. Foi horrível. Nunca tinha visto uma cena dessas. Para mim, ele veio para matar. Atirou na cabeça, no pescoço e no peito — afirmou a dona de casa, de 55 anos, que pediu para não ser identificada.
Uma familiar dela foi quem fez o contato com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) após o crime. O socorro, segundo a moradora, chegou cerca de 20 minutos depois e encaminhou o jovem baleado ao hospital.
Junto de outros parentes, a mulher também ajudou a acudir o caçula da família assassinada. Ela tentou levar o menino de oito anos para a casa, para que ficasse longe da cena do crime.
— Convidamos ele para vir para cá. Mas ele não quis, então só demos água para ele e tentamos acalmá-lo. Ainda bem que a fruteira estava fechada. Sempre tem muitas crianças correndo na volta ali no domingo — contou.
Logo após os disparos, moradores saíram das casas para entender o que estava acontecendo. Em depoimento, o atirador relatou que deixou a pistola usada no crime no local. Essa versão, no entanto, é desacreditada pelos vizinhos.
— Estava cheio de gente, havia mais de 50 pessoas na volta. Então como ninguém achou essa arma que ele diz que deixou aqui? — questiona um morador da Estrada do Varejão.
Ainda que o caso tenha despertado a atenção de quem mora nos arredores, a Polícia Civil tem tido dificuldade para conseguir reunir relatos de testemunhas. A maioria dos que foram procurados pela reportagem não admitiu ter presenciado o crime.
— Acordei com os tiros. Tomei aquele susto. Quando vi já tinha acontecido. Não vi nada da briga em si, se teve. Nesse tempo, nunca tinha visto nada igual — relatou um comerciante que vive no local há mais de 20 anos.
No bairro Nonoai, onde a família de Vidaletti mantém um mercadinho, os moradores também são receosos para falar sobre o caso. Sem se identificar, um vizinho relata que o fato causou perplexidade. Desde o crime, no domingo, o estabelecimento, que funciona anexo à residência da família, permanece fechado, assim como a casa.
—Ninguém imaginava. Ele conversava comigo, parecia tranquilo. Está todo mundo apavorado — relata.
Contraponto
Os advogados Marcos Ribeiro de Sousa e Michelle Costa Brião de Sousa se manifestaram por meio de nota:
"Dionatha já foi condenado pela mídia e opinião pública antes mesmo de ter sido indiciado, processado e julgado. Nosso cliente exercerá o seu direito à ampla defesa e contraditório, os fatos serão demonstrados com clareza.
Ninguém tem o direito de matar, mas ninguém tem a obrigação de morrer sem defender sua mãe e a si próprio. A perícia irá demonstrar a veracidade quanto às alegações de violência física sobre o acusado e sua mãe.
A defesa protocolará um pedido de revogação de prisão preventiva e, se necessário, será impetrado habeas corpus a ser dirigido ao Tribunal de Justiça do RS.
Nossas alegações serão no sentido de que Dionatha Bitencourt Vidaletti é réu primário (ex-militar, sem nenhum antecedente criminal ou policial), possui residência fixa, trabalho lícito, além de ter se apresentado espontaneamente e estar disposto a colaborar com as investigações."