Às 9h29min desta terça-feira (28), uma salva de palmas irrompeu o silêncio no Cemitério Jardim da Paz, no bairro Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre. Pouco antes, amigos haviam ingressado na capela onde era realizada a cerimônia em homenagem à família morta a tiros durante uma discussão de trânsito.
Na tarde de domingo (26), Rafael Zanetti Silva, 45 anos, a esposa Fabiana Silveira Innocente Silva, 44 anos, e o filho Gabriel Innocente Silva, 20 anos, foram assassinados quando retornavam de uma festa de aniversário no bairro Lami, na Zona Sul.
Dentro da capela foi realizada uma corrente de oração e a despedida foi organizada em dois momentos. O primeiro onde amigos puderam prestar homenagem e, na sequência, um ato mais isolado, apenas para familiares e pessoas próximas. Uma longa fila se formou para o adeus aos pais e filho, dispostos em caixões lado a lado. A frase impressa em uma faixa estendida em frente ao cortejo fúnebre, que teve início pouco antes das 11h, resumia o drama das centenas de pessoas no local. "Toda despedida é triste. Mas nenhuma dói tanto quanto aquela que sabemos que não tem retorno".
— O sentimento da família é de dor. É uma revolta muito grande um dano de R$ 500 ou R$ 1 mil levar a matar uma família inteira — lamentou o advogado Thiago Zanetti Küllinger, primo de Rafael, único parente a se manifestar durante a despedida.
Segundo o familiar, a maior preocupação no momento é com o apoio ao caçula do casal. O menino, de oito anos, estava no carro da família quando os pais e o irmão foram mortos. Junto dele também estava a namorada de Gabriel, uma jovem de 18 anos. Nenhum deles foi alvejado. O garoto, que inicialmente ficou sob o cuidado dos padrinhos, agora está com familiares. Ele acompanhou parte da cerimônia, sob assistência de duas psicólogas. Foi levado do local antes do enterro.
A pior dor da família não é nem ver eles no caixão, mas ter uma criança perguntando: e agora, quem vai me levar na natação? Quem vai me levar no futebol? A gente não tem resposta para isso.
THIAGO ZANETTI KÜLLINGER
Primo de uma das vítimas
— Obviamente a família quer justiça, quer que encontrem o assassino, que venha a pagar por isso. Mas a principal dor é ver um pai, uma mãe e um irmão de 20 anos morrerem e restar uma criança de oito anos, com a qual a gente está extremamente preocupado. Está traumatizada. Acho que a pior dor da família não é nem ver eles no caixão, mas ter uma criança perguntando: e agora, quem vai me levar na natação? Quem vai me levar no futebol? A gente não tem resposta para isso — relatou, tentando descrever o drama.
O primo afirmou que amigos e familiares continuam incrédulos sobre o motivo que levou às mortes. Na tarde de domingo, o casal, os filhos e a nora participavam de um aniversário em um sítio na Estrada do Canta Galo. De lá, saíram para retornar para casa no bairro Aberta dos Morros.
No trajeto, o Aircross onde estavam colidiu em uma Ecosport, mas eles seguiram viagem. O condutor alcançou o carro da família 4,2 quilômetros depois, na Estrada do Varejão. Ele estava acompanhado da mãe. Durante discussão, o atirador baleou o casal e o filho com tiros de pistola calibre 9 milímetros. Na sequência, ele fugiu na Ecosport. O atirador, identificado como Dionatha Bitencourt Vidaletti, 24 anos, teve prisão preventiva decretada e está foragido.
— É um absurdo por uma batida de carro isso tudo acontecer. A família e os amigos estão desolados. Ninguém consegue acreditar. Era uma família unida. Nada leva uma pessoa a matar um pai, uma mãe e um filho por uma batida na porta de um carro. É uma banalização da vida humana que a gente está vivendo. Essa é a dor da família — disse Küllinger.
Paixão por veículos
O cortejo fúnebre se iniciou às 11h, com a faixa com fotos da família à frente. Logo depois, os amigos de infância de Rafael carregavam o caixão com o corpo do mecânico, junto dos familiares. Na sequência, o de Fabiana foi transportado em um carrinho e o de Gabriel erguido por amigos e pela namorada.
Na abertura da cerimônia estava um Astra e, no final, um BMW. Os dois veículos pertenciam à família, que era apaixonada por carros. Pai e filho mantinham uma oficina e uma loja especializada em estética automotiva. O carro que fechou o cortejo foi um presente recente do pai para o filho.
— Não sei qual dos dois estava mais feliz com esse presente — contou na segunda-feira o padrinho de Gabriel, Márcio Becker, 45 anos, que junto de outros amigos auxiliou nos trâmites dos serviços fúnebres da família.
Mais cedo, enquanto o velório era realizado, amigos da família se reuniram em frente à loja de Gabriel na Avenida Juca Batista, no bairro Hípica. Os amigos prestaram homenagem e depois saíram em uma carreata de despedida ao jovem e seus pais. No cemitério, vários veículos tinham mensagens de luto nos vidros. Pais e filho foram sepultados juntos, enquanto se ouvia uma última salva de palmas.