A família de Juliano Flores Soares, 36 anos, está perto de conseguir sepultá-lo. O velório terá início 70 dias após o corpo dele ser encontrado esquartejado em cemitério clandestino de Porto Alegre. A liberação dos restos mortais, que estavam armazenados no Departamento Médico-Legal (DML), ocorreu na tarde desta quinta-feira (24).
— Finalmente vamos conseguir dar um enterro digno. O corpo já está com a funerária. Vamos iniciar o velório agora a noite — relata a irmã Danusa Flores Soares, 34 anos.
O enterro está previsto para ocorrer nesta sexta-feira (25) no Cemitério Pio XII, em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Juliano residia no município com a mãe e desapareceu em 14 de julho. Ele havia saído de casa para ir até uma casa espírita, segundo a irmã. Mas desapareceu neste trajeto. O corpo dele foi encontrado no cemitério clandestino, usado por uma facção criminosa da Capital, para esconder vítimas de execuções.
Entenda o caso
Em 15 de agosto, a Polícia Civil encontrou um corpo esquartejado em cemitério clandestino de Porto Alegre. No mesmo dia, a polícia informou que a vítima era Juliano, desaparecido há um mês. A família foi informada pela polícia que ele havia sido localizado.
O corpo de Juliano foi encaminhado ao DML e no mesmo dia foi feita coleta de digitais. Segundo o DML, três dias depois, o laudo confirmou a identificação. Mas, como o corpo havia sido esquartejado, foi necessário fazer exame de DNA, para identificar se todo o cadáver pertencia a mesma vítima.
O DNA foi realizado e apontou em 26 de setembro que havia compatibilidade genética com os irmãos de Juliano. Mas o DNA não excluía a possibilidade de ser outro irmão. A família procurou o DML e foi orientada a procurar a Justiça. O judiciário pode determinar que o corpo seja liberado, em casos onde a perícia não consegue precisar a identificação. A família procurou a Defensoria Pública, mas só conseguiu agendar atendimento para 23 de outubro.
Em 22 de outubro, a irmã de Juliano retornou ao DML. Segundo Danusa, ela foi informada que o corpo não havia sido liberado ainda por uma falha. No mesmo dia, Danusa obteve a certidão de óbito.
— O funcionário me disse que não tinham se dado conta que ele tinha sido identificado pelas digitais. E a gente todo esse tempo esperando — relata a irmã.
Dois dias depois, nesta quinta-feira (25), a família conseguiu retirar o corpo do DML.
O que diz o DML
Nesta quinta-feira (25), o diretor do DML, Luciano Haas, procurou a reportagem de GaúchaZH para prestar esclarecimentos sobre o caso. Alegou que os procedimentos foram adotados, mas que o DML enfrenta problemas, como a falta de estrutura adequada e de servidores para realizarem todas as funções. Afirmou ainda que caso fosse da rotina e que 98% dos corpos que ingressam no DML são liberados no mesmo dia. Confira:
Identificação - Segundo o diretor do DML, a identificação foi possível a partir da junção do laudo papiloscópico (que teve resultado três dias após a localização do corpo) e dos exames de DNA (finalizado em 26 de setembro).
A demora - Questionado sobre por que o corpo só foi liberado quase um mês após o resultado do DNA, alegou que o trabalho ocorre em regime de plantão e que as informações completas (do DNA e das digitais) só chegaram ao perito em 3 de outubro. Disse que "devido à complexidade", o caso foi discutido em reunião da direção em 09 de outubro. Alegou que, embora o corpo estivesse identificado, o contato com a família foi postergado porque a câmara fria não está atingindo a temperatura correta e precisará passar por reforma. Por isso, os corpos precisaram ser removidos para um caminhão refrigerado.
Falha - Haas afirmou que, em seu entendimento, "não houve falhas" e que "o perito médico-legista fez todos os procedimentos da perícia de forma correta". O diretor alegou que "o caso é extremamente incomum e aconteceu em um momento crítico do DML". Relatou que "a principal câmara fria do Estado (está) estragada e (o DML) com falta de servidores para realizar todas as tarefas".
Câmara fria - Alegou que o DML está "trabalhando para tentar acelerar os trâmites administrativos e judiciais envolvidos na reforma ou construção de uma nova câmara fria". Esclareceu que na próxima semana "está prevista a chegada de um contêiner para armazenar com mais de espaço os corpos". Disse que serão adotadas "outras medidas normativas" para "sepultar alguns corpos antigos com pendência judiciais".