Por dois meses, familiares de Nelson Fabiano do Amaral Janner, 39 anos, de General Câmara, na Região Carbonífera, tentaram descobrir o paradeiro dele. Em 23 de agosto, um corpo com as mesmas roupas e uma tatuagem idêntica à que ele tinha no tórax, foi encontrado. Estava caído nas proximidades de um atalho que ele usava para retornar ao sítio dos pais. A localização foi o início de nova peregrinação, que se arrasta por mais de um mês. Os pais e a irmã tentam comprovar que o cadáver, mantido no Departamento Médico-Legal (DML) de Porto Alegre, é do familiar. Mesmo com exame de DNA, ainda não conseguiram sepultá-lo. Na quarta-feira (25), a família procurou a Justiça.
— Antes, a gente vivia a angústia de não saber onde ele estava. Agora sabe. Mas não pode sepultar. Não pode viver esse luto. Além da perda, não tem nenhuma perspectiva. É uma coisa muito triste para a família — lamenta a irmã, Itatiane Maríndia Janner, 43 anos.
Nelson Fabiano residia em General Câmara com o pai Nelson Bernardo Janner, 75 anos, e a mãe Maria Evonir do Amaral Janner, 72 anos. No dia 26 de junho, ele saiu da propriedade para ir até uma loja consertar o celular. Depois, nunca mais retornou para casa. O desaparecimento foi registrado na polícia. No dia seguinte, um cadáver foi encontrado carbonizado em Triunfo. A família chegou a se deslocar até o DML da Capital para fazer o reconhecimento, mas o corpo acabou sendo identificado como de outra pessoa.
Quase dois meses após o sumiço de Nelson Fabiano, um morador de General Câmara estava indo pescar com o enteado quando deparou com um cadáver às margens de um córrego. Estava caído de bruços. Junto ao corpo não havia documentos e nem o telefone celular. As vestes, calça jeans, camiseta, par de coturnos e jaqueta, foram reconhecidas pela família do desaparecido, assim como uma tatuagem que ele tinha na lateral do tórax.
— Achava que reconhecendo a roupa e tatuagem que ele tinha, não precisava nem DNA. Eles exigiram, que tinha de fazer. Então fiz — relata o pai, Nelson Bernardo.
Em 29 de agosto, o idoso se submeteu à exame de DNA em Porto Alegre para verificar se o corpo localizado era do filho. Como a esposa é cadeirante e necessita do auxílio do marido, sempre que segue até a Capital, contrata uma pessoa para ficar com ela. Em 18 de setembro, os familiares foram informados de que o laudo havia confirmado a compatibilidade genética. Acreditaram que a angústia estava perto do fim.
— Agora, a questão é porque o DNA não exclui a possibilidade de ser outro filho do meu pai. Mas meu pai só tem dois filhos, eu e meu irmão. O pior é não ter perspectiva nenhuma. Arrastar esse sofrimento. Ele é idoso. Foi quatro vezes ao DML. Passou horas lá esperando. E continua sem poder sepultar o filho — diz a irmã.
Segundo o delegado Nedson Ramos de Oliveira, o caso é investigado pela Polícia Civil, mas não há indicativos de que Nelson Fabiano tenha sido vítima de crime. O corpo estava em avançado estado de decomposição. A causa da morte deverá ser indicada por laudo pericial. Uma das suspeitas é que ele possa ter sofrido mal súbito, por conta da ingestão de antidepressivos e álcool.
— Era um local ermo, embora fosse trajeto para a casa dele. Não há nenhum indicativo de que tenha havido violência. Ele caiu meio que dentro de um córrego. Pode ter até se afogado por conta desse banhado — afirma.
Na quarta-feira (25), último dia em que estiveram no DML, foram orientados a buscar identificação judicial e ingressaram com pedido por meio da Defensoria Pública. A família chegou a acertar os preparativos para o velório e sepultamento no município de Esteio, na Região Metropolitana. Mas por enquanto não há previsão de realizar a cerimônia.
— Tivemos de desmarcar de novo a capela para velar ele. Estamos nessa espera e nem sei quando isso vai terminar — lamenta o pai.
Segundo a assessoria de imprensa do Instituto Geral de Perícias (IGP), em caso de comparação genética, o laudo não exclui a possibilidade de que o corpo identificado seja de outro filho do mesmo pai. Diante desta situação, conforme o IGP, a família pode solicitar um auto de reconhecimento à Polícia Civil, para ser encaminhado ao DML, ou fazer o pedido à Justiça (como já foi feito pela família). Além do DNA, segundo o IGP, foi solicitada perícia da arcada dentária.
A Defensoria Pública ajuizou ação no dia 25 de setembro e aguarda análise judicial.
O vaivém
- 26 de junho – Nelson Fabiano desaparece da casa dos pais em General Câmara. A família registra o desaparecimento na Polícia Civil.
- 27 de junho – Um corpo é encontrado carbonizado em Triunfo, às margens do Rio Jacuí.
- Início de julho - Família vai ao DML tentar fazer reconhecimento. Como corpo está carbonizado, não é possível reconhecimento. Cadáver seria identificado cerca de 20 dias depois, como de outra pessoa.
- 23 de agosto – Corpo com vestes e tatuagem idênticas às de Nelson Fabiano é encontrado nas proximidades do trajeto que ele fazia para a casa dos pais, em mato. Cadáver é encaminhado ao Departamento Médico-Legal (DML) da Capital.
- 26 de agosto – Na Polícia Civil, família reconhece roupas e tatuagens por fotos. É informada de que a identificação poderia ser feita pelas digitais.
- 29 de agosto – Familiares vão até o DML e descobrem que necessitam de exame de DNA para verificar compatibilidade genética com o corpo encontrado. O pai de Nelson Fabiano fornece material para a perícia.
- 18 de setembro – Laudo do DNA comprova que o “perfil genético obtido do cadáver não identificado é compatível com o perfil de um filho biológico de Nelson Bernardo Janner”.
- 19 de setembro – Familiares vão até DML para fazer liberação. Segundo a família, são informados de que a documentação ainda necessitava da assinatura de um legista.
- 25 de setembro – Retornam ao DML e são informados de que não seria possível porque o laudo do exame de DNA não exclui a possibilidade de o corpo pertencer a outro filho de Nelson Bernardo Janner. Por isso, é necessária a identificação judicial. No mesmo dia, procuram o Foro Central e a Defensoria Pública.
Outros casos
Porto Alegre - Após três meses de idas e vindas ao prédio do DML, na Capital, em novembro de 2017, a família de Lisyane Lopes conseguiu enterrar o corpo da adolescente assassinada aos 16 anos. Em 15 de agosto daquele ano, laudo pericial confirmou que era da adolescente o corpo encontrado incendiado no porta-malas de um HB20, no bairro Cascata, na Zona Sul. Os familiares também precisaram buscar autorização judicial para a liberação.
Canoas - Depois de cinco dias percorrendo Departamento Médico Legal da Capital, Defensoria Pública e Tribunal de Justiça, Márcia da Cruz Ferreira conseguiu, em 1º de novembro de 2017 liberar o corpo da filha, assassinada aos 19 anos, para o sepultamento. Thiellen da Cruz Fernandes desapareceu da casa onde morava com o sogro, o marido e o filho de um ano e quatro meses em 5 de outubro.