Metade dos homicídios ocorridos este ano na área do 16º Batalhão da Polícia Militar — que atua no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro — foi provocada pela polícia, de acordo com dados do Instituto de Segurança Pública (ISP).
Foi na favela da Fazendinha, uma das que compõem o Complexo do Alemão, que morreu a estudante Ágatha Félix, oito anos. De acordo com testemunhas, ela foi atingida nas costas após dois disparos feitos por policiais. A Divisão de Homicídios investiga a origem do tiro que matou a menina.
Até agosto deste ano, 107 pessoas foram assassinadas na região do 16º Batalhão. Destas, 53 foram mortas pela polícia em supostos confrontos. A proporção supera a média em todo o Estado, onde as mortes provocadas por agentes do Estado representam 30,6% do total dos assassinatos — taxa recorde da série histórica iniciada em 2003.
Para efeito de comparação, dados compilados pelo jornal americano The Washington Post indicam que a polícia dos Estados Unidos (EUA), conhecida como uma das mais letais entre os países desenvolvidos, matou 986 pessoas em 2017, o que representaria 6% dos homicídios no país naquele ano (último dado completo disponível). É 1/5 da taxa fluminense.
A maior participação das mortes provocadas pela polícia do Rio de Janeiro nesse período do ano havia ocorrido em 2008, quando representou um quinto (20,3%) do total. A menor taxa foi em 2013, com 7,6%. Desde 2003, esse índice oscilou principalmente entre 17% e 11% nos cinco primeiros meses do ano.
O alto percentual deste ano combina dois recordes registrados este ano: o maior número de pessoas mortas pela polícia e menor número de vítimas de assassinatos — que não inclui homicídios em decorrência de ação policial. Os homicídios em geral registraram queda de 21,5% neste ano no estado. Foram 2.717 homicídios dolosos de janeiro a agosto contra 3.461 em igual período no ano passado.
A polícia do Rio de Janeiro matou 1.249 nos oito primeiros meses do ano. O número já supera os números anuais desde 2003, exceto de 2018, que registrou 1.534 homicídios decorrentes de intervenção policial. A expectativa é que os números do primeiro ano da gestão Wilson Witzel (PSC) supere o recorde histórico. A participação recorde é também fruto da política de enfrentamento defendida pelo governador, eleito com uma pauta de endurecimento na segurança pública.
Witzel tem endossado as ações policiais que resultam em morte, mesmo antes da conclusão dos inquéritos sobre os casos. Foi o que ocorreu em fevereiro, quando a polícia matou 15 pessoas no morro do Fallet, centro do Rio. A Defensoria Pública aponta indícios de abuso policial na ação e falhas na apuração do caso. Essa operação foi a que deixou mais vítimas em 12 anos, desde uma ação no Complexo do Alemão com 19 mortos em 2007.
No caso de Ágatha, o governador disse esperar o resultado das investigações para se manifestar sobre eventual punição aos policiais envolvidos.