O segundo dia de julgamento de João Guatimozin Moojen Neto, 28 anos, acusado de ter provocado a morte dos dois filhos, de um vizinho idoso, e de ter tentado matar a ex-companheira, em um incêndio em novembro de 2013 na zona norte de Porto Alegre é marcado pelos debates entre acusação e defesa. O Ministério Público (MP) quer pena máxima ao réu e defendeu que ele estava ciente dos atos que cometeu. O júri deve ser encerrado até o fim da tarde desta quarta-feira (4).
O promotor José Eduardo Coelho Corsini e o assistente de acusação Manoel Castanheira foram os primeiros a falar, num tempo total de uma hora e meia. O promotor mostrou laudos com a causa da morte das vítimas, por asfixia provocada pela inalação da fumaça.
Ele disse, na sequência, que o réu agrediu Bárbara Penna de Moraes e Souza, com quem tinha dois filhos, e usou álcool para atear fogo ao apartamento. O incêndio provocou a morte de Isadora, de dois anos, e de João Henrique, de três meses. Com 19 anos na época, Bárbara também foi atingida pelas chamas e teve mais de 40% do corpo queimado. Um vizinho, de 79 anos, morreu sufocado nas escadas. Ele estaria tentando salvar as crianças.
A defensora pública Tatiana Kosby Boeira rebateu a afirmação de que o réu usou álcool, argumentando que não foi encontrada embalagem dentro do apartamento.
— Até o concreto foi consumido — respondeu o promotor e explicou que uma embalagem plástica não resistiria ao incêndio.
Na sequência, o promotor mostrou imagens do apartamento destruído pelas chamas. Um dos momentos marcantes da manhã aconteceu quando o promotor exibiu imagens de Isadora e João Henrique, mortos após o incêndio. As cenas fizeram Bárbara e a mãe deixarem o plenário em prantos. O réu também chorava.
— Não lembrou de salvar os filhos. Precisou um senhor de 79 anos tentar salvar — afirmou o promotor sobre o fato do réu ter deixado o apartamento sem resgatar as crianças, que dormiam no quarto.
Durante o interrogatório, o réu alegou na terça-feira (3) que não sabia que os filhos estavam no local no momento do incêndio. A versão é contestada pelo depoimento de Bárbara, que disse que o ex sabia que as crianças estavam dormindo no quarto ao lado.
Jurado chorou
Logo depois, o advogado Manoel Castanheira, assistente de acusação no caso, defendeu que o réu receba o tempo máximo possível de prisão, com a soma das penas. Emocionado, mostrou aos jurados as fotos das vítimas, anexadas ao processo.
— Nenhum recurso, nada que eu fizer, mudará isso — disse.
Às 11h, o juiz determinou que fosse feita pausa porque um dos jurados chorou durante a fala da acusação. O Conselho de Sentença foi chamado à sala secreta.
— Está quase — sussurrou Bárbara, sentada na segunda fileira de poltronas, no lado esquerdo do plenário, destinado aos familiares das vítimas.
No lado oposto, encontram-se os familiares do réu. Às 11h4min, ainda durante esta pausa, enquanto Bárbara secava as lágrimas, o promotor Corsini se aproximou dela e estendeu a mão.
— Está tudo bem? — indagou.
— Estou tentando — respondeu Bárbara.
No retorno, alguns minutos depois, o juiz Paulo Irion explicou que a pausa foi necessária:
— Deu-se um fato que é natural. Todos os seres humanos podem se emocionar. Mas entendemos, por bem, fazer essa interrupção.
Quando reiniciou a argumentação, o assistente de acusação afirmou que não mostraria mais as imagens aos jurados.
— São dois clientes que eu não conhecei. Que não tive oportunidade de ganhar um abraço. Quem sabe um beijo de consideração.
"Comportamento psicopata"
A acusação manteve a argumentação de que o réu apresenta “comportamento psicopata”, mas que possuía capacidade de compreender o que estava fazendo. Afirmou que ele recebeu apoio da família, mas “não soube aproveitar”.
— Os senhores vão poder decidir sobre o futuro desse jovem, mas também vão poder dar a resposta para Bárbara, a vítima sobrevivente, e também às duas crianças que morreram e ao senhor que teve a vida ceifada.
Em seguida, virou-se para Bárbara, sentada na plateia:
— Como você Bárbara, ele (Mário Ênio Pagliarini, vítima no incêndio) queria fazer o bem, fazia o bem. Continue na sua luta, para auxiliar mulheres, vítimas da violência, que não querem morrer nas mãos de psicopatas.
Por fim, defendeu a pluralidade de atos, para que sejam somadas as penas.
— Que não cumpra nem um dia a mais e nem um dia a menos.
Após a fala da Defensoria Pública, às 13h15min, o juiz determinou o intervalo, com retorno previsto para 14h30min, para ser realizada réplica e tréplica, de uma hora cada. Depois disso, os jurados se reúnem e, na sequência, será informada a sentença para o caso.
O caso
Em 2013, João Guatimozin Moojen Neto, à época com 22 anos, segundo a denúncia do MP, teria espalhado álcool no apartamento e sobre o corpo da companheira, Bárbara Penna de Moraes e Souza, iniciando o incêndio no imóvel. O crime aconteceu em um apartamento na Avenida Panamericana, bairro Jardim Lindóia, zona norte de Porto Alegre.
Os dois filhos do casal — uma menina de dois anos e um menino de três meses — morreram. Um vizinho, Mário Ênio Pagliarini, 79 anos, também morreu, sufocado pela fumaça no corredor do prédio.
A jovem, conforme a acusação, ainda foi jogada pela janela, do terceiro andar. Ela teve cerca de 40% do corpo queimado e passou por mais de 230 cirurgias reparadoras.
Moojen Neto, que continua preso, responde por tentativa de homicídio (qualificado pelo emprego de fogo e recurso que dificultou a defesa da vítima) e três homicídios, com as mesmas qualificadoras.