Em sete anos, dobrou o número de brasileiros que afirmaram que, se pudessem, teriam uma arma de fogo para sua segurança, na contramão de toda a região, indica o Barômetro das Américas (Lapop), pesquisa de opinião que avalia a percepção sobre democracia, instituições políticas e outros temas no continente americano. Mas eles ainda não chegam a ser maioria.
Entre janeiro e março, o Barômetro entrevistou 1.498 brasileiros em cidades de todo o país. A pesquisa é coordenada pela Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos, e é realizada desde 2006, em geral a cada dois anos. A margem de erro é de 2,5 pontos percentuais para mais ou para menos.
Em 2012, quando a pergunta foi feita pela última vez, 21% disseram que, se pudessem, teriam uma arma. Agora, são 43% — ainda a minoria, portanto.
A mesma pergunta foi feita em outros quatro países: Peru, Equador, El Salvador e Guatemala. Estes dois últimos registram duas das maiores taxas de homicídios do mundo.
Em 2012, o Brasil era o último no ranking de apoio às armas. Agora, fica em terceiro lugar, perdendo para Peru (49%) e Equador (46%). O Brasil também foi o único país que apresentou crescimento no índice. Em todos os outros países não houve variações significativas nos números.
No sábado (2), o Ibope divulgou pesquisa em que 61% dos brasileiros eram contrários à flexibilização da posse de armas (nas periferias, o índice sobre para 70%). É o mesmo percentual de brasileiros que responderam ao Datafolha, em dezembro de 2018, que a posse deve "ser proibida, pois representa ameaça à vida de outras pessoas".
— Quando a gente olha outras pesquisas, vê que quem lida diariamente com as consequências da violência tem menos tendência a apoiar esse tipo de coisa (facilitação do acesso às armas) — diz Melina Risso, diretora do Instituto Igarapé e especialista em segurança pública.
No Brasil, o contexto pessoal de violência, pelo que os dados indicam, parece relevante para a formação de opinião dos entrevistados. Entre as pessoas que se disseram vítimas de crimes nos últimos 12 meses, a vontade de ter armas cresce, chegando a 54%.
A pesquisa não delimita o tipo de crime, podendo incluir situações com violência, como roubo ou agressões, ou delitos mais leves, como furto.
Não posso de cara dizer que é Bolsonaro que está influenciando a vontade de ter armas. Há algo além disso que pode explicar a sensação de insegurança e a vontade de ter arma de fogo
GEORGE AVELINO
Membro do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV
No panorama geral, 19% afirmaram terem sido vítimas de crime no último ano, percentual que permaneceu razoavelmente estável na última década.
O pesquisador George Avelino afirma que, embora o apoio às armas seja maior entre as vítimas de crime, não é a vitimização que explica o desejo de ter uma arma, uma vez que ela permaneceu estável ao longo dos anos. Avelino é membro do Centro de Economia e Política do Setor Público (Cepesp) da FGV, instituição que apoiou a realização do Barômetro no Brasil.
A vontade de ter uma arma também é maior entre aqueles que dizem que se sentem muito inseguros no seu bairro (sobe para 48%), mas não abarca a maioria dos entrevistados.
Avelino diz que, a princípio, o que mais parece estar associado ao aumento do desejo de ter arma é a sensação de insegurança. O maior salto nesse índice foi observado entre 2012 e 2014, quando cresceu 15 pontos percentuais.
— Esse é um cenário sem (o presidente Jair) Bolsonaro. Então, não posso de cara dizer que é Bolsonaro que está influenciando a vontade de ter armas. Há algo além disso que pode explicar a sensação de insegurança e a vontade de ter arma de fogo — afirma.
Em 2019, 54% afirmaram que não se sentem seguros na vizinhança onde vivem, crescimento de seis pontos em relação a 2017. Contudo, esse é o segundo menor valor registrado desde 2008, quando esse quesito passou a ser medido pelo Barômetro.
Desde o início do seu governo, Bolsonaro publicou três decretos mudando as regras que estabelecem quem pode ter uma arma no país. Segundo seu ministro da Justiça, Sergio Moro, a medida não é uma política para a segurança pública, mas o cumprimento de uma promessa de campanha.
Os decretos estão sendo questionado no Supremo Tribunal Federal por supostamente extravasarem os limites estabelecidos pelo Estatuto do Desarmamento, o que não poderia ser feito pelo Executivo.
Confiança na PM e pena de morte
Segundo o Barômetro, a confiança na Polícia Militar cresceu 22 pontos percentuais entre 2017 e 2019, alcançando a metade dos brasileiros. Ela é maior entre os mais escolarizados, e menor entre os indígenas.
Ainda assim, 60% dos brasileiros afirmam acreditar que, se ligassem relatando uma emergência, teriam de esperar mais de meia hora até que um policial fosse atender ao chamado.
Outro ponto que chama a atenção é a aprovação da pena de morte em caso de assassinato: 52% são a favor. O índice apresentou queda acentuada desde 2017, quando 66% eram a favor.
No recorte de religião, os católicos são os mais favoráveis e os espíritas, os mais contrários.
Apesar do apoio à pena capital, a maioria dos brasileiros não acredita na isonomia do Judiciário. Para 68%, os tribunais do país não garantem um julgamento justo.