Para evitar um tensionamento na relação com o Legislativo e o Judiciário, o governo de Jair Bolsonaro começou a analisar pontos considerados polêmicos do decreto que flexibilizou as regras sobre o direito ao porte e à posse de armas e munições no país.
Segundo relatos feitos ao jornal Folha de S.Paulo, duas questões que devem passar por estudo, com a possibilidade de alteração, são a regra que prevê a efetiva necessidade de transporte de armas a categorias profissionais, como políticos e jornalistas, e a extensão do porte dos dispositivos letais a todos os praças das Forças Armadas.
Os dois pontos têm sido criticados por especialistas em segurança pública e por professores de direito, para os quais não poderiam ter sido definidos por meio de um decreto presidencial. Eles também foram questionados por uma análise técnica feita pela Câmara dos Deputados.
O processo de reanálise é feito pelo setor jurídico do Palácio do Planalto e é focado em trechos que são considerados sensíveis e com potencial de questionamento jurídico. O objetivo é identificar o que pode ser modificado e que não altere o sentido geral da medida.
Nas palavras de um assessor presidencial, mudanças podem ser feitas caso se chegue ao entendimento de que é possível, ao mesmo tempo, "reduzir a tensão do questionamento" e manter a garantia às "liberdades individuais". A decisão final caberá ao presidente.
Otávio Rêgo Barros, porta-voz da Presidência da República, admitiu a revisão de pontos da medida no final da tarde desta terça-feira (21):
— O governo tem compromisso com a correção dos atos públicos e acolhe as diversas manifestações dos entes responsáveis pelo aperfeiçoamento do arcabouço jurídico.
Sobre a questão do fuzil T4, arma que a Taurus afirma que estará disponível para qualquer cidadão com possibilidade de adquirir armamentos — o que é negado pela Casa Civil — Rêgo Barros também afirma que o caso está sob revisão.
— Esse é um dos aspectos que está passando por avaliação — afirmou o porta-voz.
Problemas constitucionais
No início deste mês, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que o decreto tem inconstitucionalidades e que, caso não seja alterado, ele teria amplo apoio para ser derrubado. O alerta levou o presidente a buscar alternativas.
Na mesma época, o porta-voz Rêgo Barros disse que Bolsonaro considera que a iniciativa é constitucional, mas que ele aceitaria analisar eventuais sugestões de mudanças feitas pelo Poder Legislativo.
A iniciativa pode ser invalidada ou alterada por meio da edição de um projeto de decreto legislativo. Para ser aprovado, precisa do apoio de maioria simples tanto no Senado como na Câmara, sem possibilidade de veto presidencial.
Nesta terça-feira (21), quatorze governadores, de partidos como PT e MDB, divulgaram uma carta aberta contra o decreto de armas. Para eles, a iniciativa pode aumentar os casos de violência e não contribuirá para tornar o país mais seguro.
"Solicitamos aos poderes que atuem para sua imediata revogação. As medidas previstas pelo decreto não contribuirão para tornar nossos estados mais seguros. Ao contrário, tais medidas terão um impacto negativo na violência", pediram.
No documento, eles ressaltaram que a disponibilidade de armas e munições que são usadas de maneira ilícita "representa um enorme desafio para a segurança pública do país" e defendem a implementação de políticas que melhorem o controle dos dispositivos letais.
"Também é fundamental aumentar os meios de controle e fiscalização para coibir os desvios, enfrentar o tráfico ilícito e evitar que as armas que nascem na legalidade caiam na ilegalidade e sejam utilizadas no crime. Reconhecemos que essas não são soluções mágicas, mas são condições necessárias para a melhoria de nossa segurança pública", disseram.
AGU pede prorrogação do prazo para responder esclarecimentos
O decreto, uma promessa de campanha eleitoral do presidente, amplia o acesso a armas de fogo para 19 milhões de pessoas. Ela também faz com que adolescentes não precisem mais de autorização judicial para praticar tiro e aumenta a quantidade de munição que pode ser comprada.
Na quarta-feira (22), acaba o prazo para que o Palácio do Planalto apresente explicações sobre o decreto, em uma ação protocolada pela Rede. O partido pede a suspensão dos efeitos da medida.
A AGU (Advocacia-Geral da União) informou que pedirá ao Supremo a prorrogação do prazo para esclarecimento. "O objetivo é possibilitar que as manifestações a serem apresentadas ao STF já contemplem possíveis revisões no decreto", disse.