— Não contei para ninguém. O valor só estou dizendo para ti.
A confidência de mais uma vítima do golpe do book fotográfico, que tem entre os alvos mulheres idosas, revela um dos aspectos do conto: o constrangimento que impede de procurar a polícia. Após a Operação 15x21, desencadeada durante a semana, no centro de Porto Alegre, no entanto, mulheres se encorajaram a denunciar. Pelo menos, 52 ocorrências são investigadas pela Polícia Civil. Outras empresas foram apontadas pelas vítimas.
— Continuamos recebendo mais e mais vítimas. Começamos a identificar outros estúdios, além daqueles já investigados. É importante que elas se encorajem e venham denunciar — alerta a delegada Larissa Fajardo, da Delegacia do Idoso da Capital.
A policial foi responsável por coordenar a operação que cumpriu 15 mandados de busca e apreensão na terça-feira (30) em seis estúdios. Um deles, na Rua dos Andradas, é onde uma aposentada, de 60 anos, foi ludibriada no fim de agosto.
— Sou uma pessoa esclarecida. Não dou conversa a estranhos na rua, mas também não sou mal-educada. Mas essa jovem me abordou e conseguiu me induzir. Não tenho nem ideia porque eu fui. A menina "falava pelos cotovelos" — recorda.
Dentro do pequeno estúdio, a mulher foi maquiada. Primeiro pensava que se tratava de um teste de maquiagem. Em seguida, começaram as fotografias e trocas de roupas.
— Como tu troca de roupa? Coloca roupa que não é tua. Faz uma série fotos. E vai indo, sendo levada por aquilo ali. Não dava tempo nem de pensar — conta.
Ao fim da sessão, foi repassada para outra sala, onde em um computador a jovem mostrou as 60 fotografias. Então veio a cobrança: R$ 1,5 mil pelo serviço. A mulher disse que não tinha dinheiro e recusou a oferta:
— Não quero, não tenho como pagar — respondia.
— Tu está linda, maravilhosa, fotogênica — insistia a jovem.
Ao longo da conversa, no entanto, acabou convencida que as fotos estavam boas e que poderia presentear o marido com o álbum. O custo: R$ 800 por 14 fotografias. O valor costuma variar de acordo com o que cada vítima pode pagar. Nas ocorrências registradas há relatos de R$ 600 a R$ 4,5 mil.
Sem cartão, a aposentada seguiu até uma agência bancária, acompanhada de uma das jovens. Quando ingressou no banco, entregou a bolsa para ela. Dentro da agência, sem a jovem no entorno, começou a se dar conta que podia estar sendo ludibriada. Ainda assim, saiu e entregou a quantia para a estelionatária.
— Ela me disse que eu não precisava voltar no estúdio. Aí eu me dei conta que era golpe. Como eu entreguei minha bolsa para uma pessoa que não conheço? Fiquei louca de vergonha — diz.
Quando voltou ao estúdio, três dias após, para conseguir recuperar o álbum e o CD com as fotos, uma outra idosa estava no local, passando pela mesma situação. A vítima insistia para que lhe deixassem sair porque tinha horário marcado no médico, mas as golpistas não permitiam.
— A menina fez ela sentar umas três vezes na cadeira. Falavam sem parar em volta dela. Esse é o ponto: não deixar raciocinar — conta.
A aposentada entregou o álbum de presente para o marido, mas nunca contou o verdadeiro valor pago. O sentimento de vergonha, segundo a delegada Larissa, é frequente entre as vítimas, que não se encorajam a contar o ocorrido nem mesmo para os companheiros. Após ler as reportagens sobre o golpe, a aposentada que foi ludibriada na Rua dos Andradas decidiu procurar a Polícia Civil, mas ainda não conseguiu contar para a família.
— Quem passou por isso não precisa de críticas, precisa é de um abraço de um familiar, que alguém diga que essas coisas acontecem e que elas não estão sozinhas. Que o amor e a atenção que receberam de pessoas estranhas têm em casa. Infelizmente, esta falta de carinho nos faz frágeis, para sermos as próximas vítimas — conclui.
Materiais apreendidos serão periciados
Durante a operação, ninguém foi preso, mas a polícia recolheu materiais e documentos para análise, que auxiliarão na investigação. Algumas vítimas relataram aos policiais que se sentiam inebriadas. Até perfumes e aromatizantes encontrados nos estúdios serão periciados. A análise deve indicar se houve uso de alguma substância para confundir mentalmente as idosas.
Computadores, documentos e outros materiais apreendidos também estão sendo analisados. A polícia tenta identificar os proprietários desses estúdios. Os golpistas devem responder por estelionato contra idosos e por extorsão, já que as vítimas eram coagidas a fazerem o pagamento.
Fique atento
Como funciona o golpe:
Aliciadores, em geral mulheres ou homens jovens, abordam idosas, com cerca de 70 anos na rua. Prometem brindes, maquiagens e fotos de graça. Assim, são convencidas a ingressar nesses prédios comerciais, onde estão os pequenos estúdios. Lá, fazem diversas fotos. Na hora da saída, no entanto, vem a cobrança, com valores exorbitantes. As vítimas são coagidas a fazerem o pagamento.
Como evitar:
O principal meio de se proteger é não conversar com estranhos. Não dar oportunidade para os golpistas. Eles têm capacidade de persuasão muito grande. Quando as vítimas se dão conta, já estão dentro do estúdio fotográfico.
Onde denunciar:
Quem foi vítima de algum golpe, deve procurar a Polícia Civil. Na Capital, o registro pode ser feito nas delegacias distritais ou na Delegacia do Idoso, localizada na Avenida Ipiranga, número 1.803.