O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deverá realizar um novo julgamento dos embargos de declaração apresentados pelo Ministério Público (MP) no caso do assassinato de 111 presos no antigo Complexo Penitenciário do Carandiru, em 1992. O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Joel Ilan Paciornik determinou a apreciação dos pontos indicados como omissos e contraditórios pela acusação.
Segundo o STJ, o recurso analisado pelo ministro foi motivado por uma ação penal instaurada para apurar a responsabilidade dos policiais militares acusados pelas mortes e lesões corporais durante a rebelião. Ao todo, foram apresentadas denúncias contra 120 policiais – desse total, 79 foram a júri em cinco julgamentos, o que resultou em várias condenações.
Em setembro de 2016, após recurso da defesa, o TJ-SP anulou todos os julgamentos realizados no período de 2013 e 2014, sob o argumento de que a denúncia não havia individualizado a conduta dos réus.
No ano passado, o MP opôs embargos, por considerar que as condutas foram individualizadas. A corte estadual rejeitou os recursos em abril de 2017, mantendo a anulação dos julgamentos.
De acordo com as argumentações apresentadas pelos procuradores, o TJ-SP não poderia ter anulado o julgamento do tribunal do júri “simplesmente por discordar do juízo de valor resultado da interpretação das provas”. Ainda segundo o MP, o que foi imputado aos acusados foi a participação no massacre, e não a autoria dos homicídios.
“Dessa forma, todos os que tomaram parte das infrações – mortes em cada pavimento – devem responder por elas, pois contribuíram de modo efetivo e eficaz para a produção da ‘obra comum’, cada qual colaborando conscientemente com a conduta dos companheiros de tropa”, informou, em nota, o MP.
Ainda segundo a nota, foi alegado no recurso apresentado ao STJ que o TJSP “deixou de prestar a adequada jurisdição ao não se pronunciar sobre os vícios de omissão e contradição demonstrados nos embargos”.
Nas argumentações apresentadas por Paciornik, o tribunal de SP rejeitou os embargos “sem sanar os vícios apontados”. Com isso, acrescenta o ministro, é fundamental o esclarecimento das questões apontadas como omissas e contraditórias.
O massacre
No Massacre do Carandiru, como ficou conhecido, 111 detentos foram mortos durante uma operação policial para reprimir uma rebelião no Pavilhão 9 do presídio. Desde então, seis julgamentos ocorreram.
No primeiro, em 2001, o coronel Ubiratan Guimarães, que comandou a operação, foi condenado a 632 anos de prisão pela morte de 102 dos 111 prisioneiros do complexo penitenciário. A defesa do coronel recorreu da sentença, que foi revertida, sendo anulada pelo Tribunal de Justiça em 2006.
Os outros julgamentos aconteceram entre os anos de 2013 e 2014. Por ser um processo que envolvia uma grande quantidade de vítimas e uma grande quantidade de réus, o julgamento foi desmembrado em quatro partes e, ao final, 73 policiais foram condenados pelas 111 mortes a penas que variavam de 48 a 624 anos de prisão. Um quinto policial da Rota, que já estava preso por homicídio de travestis, teve seu caso julgado de forma separada porque sua defesa pediu que ele fosse analisado em laudo de insanidade mental e, em dezembro de 2014, também foi condenado.
A defesa dos policiais recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo, pedindo a anulação dos julgamentos, alegando, como já tinha feito nos julgamentos anteriores, que não seria possível individualizar a conduta dos policiais, questionando se cada um efetuou os disparos ou quais policiais foram responsáveis pela morte de quais vítimas.
No dia 27 de setembro de 2016, três desembargadores da 4ª Câmara Criminal do Tribunal do Júri, responsáveis pelo recurso da defesa dos réus, decidiram anular os julgamentos anteriores entendendo que não há elementos para mostrar quais foram os crimes cometidos por cada um dos agentes. O relator do processo, desembargador e ex-presidente do TJ Ivan Sartori, defendeu que os policiais agiram em legítima defesa.
O Ministério Público recorreu da sentença e, em abril do ano passado, a 4ª Câmara Criminal do tribunal manteve a decisão de anular os julgamentos, mas determinou que os policiais fossem julgados novamente. Agora, o STJ determinou que o TJ refaça esse julgamento.