Antes de incorporar o sobrenome da mulher, de Souza, o homem que admitiu à Polícia Civil ter matado Naiara era apenas Juliano Vieira Pimentel. Foi esse o nome que os pais escolheram para dar ao primogênito, quando ele nasceu, em 13 de junho de 1986, em Vacaria. Passado quase um mês do crime que chocou o Estado, o pai, com 70 anos, ainda não entende como o filho mais velho de cinco irmãos deixou de ser o garoto amoroso que nas poucas fotos existentes da família figura junto em seu colo ou agarrado em suas pernas.
A irmã mais próxima a Souza tem um ano a menos e foi a que mais conviveu com ele na infância e em parte da adolescência. Estudaram nas mesmas escolas. A breve vida escolar —ele estudou até o 6° ano e ela até o 5° — teve passagens por quatro colégios da cidade.
Nos primeiros anos de vida, ele e a irmã moraram com os pais, o homem, trabalhador de uma empresa de manutenção de rodovias, depois, nos pomares, e a mãe, funcionária de uma empresa produtora de mudas de flores. Mas as instabilidades e separações do casal fizeram com que os filhos fugissem juntos de casa aos sete (ela) e oito anos (Souza), o que resultou na passagem deles por dois dias em abrigos da cidade e, depois, na concessão da guarda das crianças a um tio (irmão da mãe) que morava em outro bairro de Vacaria. Lá, ficaram por alguns anos, período que não deixou saudade nas crianças, segundo a irmã. Ela conta que eles eram vítimas de maus-tratos pela mulher do tio, quando esse saía para o serviço — ambos já são falecidos. No ir e vir entre um paradeiro e outro, Souza chegou a morar também com o avô materno na adolescência.
A irmã lembra que o primeiro trabalho informal do irmão foi vendendo picolés para uma pequena empresa do bairro. Tinha 12 anos. Mais tarde, trabalhou entregando compras para um mercado que já não existe mais. O último emprego em Vacaria foi em uma floricultura, onde ficou por anos. A empresa segue aberta em outro endereço, com novos donos e funcionários e sem nenhum registro da passagem de Souza por lá.
Antes de completar 18 anos, conheceu a mulher com a qual vivia até o dia da prisão, em 21 de março. À época, eles frequentavam a mesma igreja evangélica, onde se conheceram e onde Souza se batizou. Para se casar, ele precisou da autorização do pai. Depois do casamento, o contato com a família foi escasseando ainda mais. Os pais tiveram mais três filhos, que, atualmente, têm 16, 14 e 10 anos.
A irmã não soube precisar a data em que Souza mudou-se para Caxias do Sul, mas acredita que isso ocorreu há cerca de oito anos. A mudança teria sido motivada por um desentendimento dos familiares da mulher com outros moradores.
Única mulher entre os irmãos, a irmã lembra que a última vez que viu Souza foi no final de fevereiro deste ano. Na ocasião, os familiares relataram que ele chorou ao contar que a mulher havia perdido um bebê — o casal não têm filhos — e que deu conselhos aos irmãos mais novos.
Ele vai ter que pagar o que fez. É irmão de sangue, mas a gente não está a favor dele. A tristeza que ele foi trazer para a família inteira.
IRMÃ DE AUTOR CONFESSO DA MORTE DE NAIARA*
Nome foi preservado
A prisão e a confissão de Souza sobre os crimes chocaram a família que, agora, teme sair de casa e dormir à noite. Eles receiam que a casa onde moram seja incendiada, mesmo que não tenham nenhum envolvimento com o que aconteceu.
— Nem os parentes, nem os vizinhos, nem os amigos dele acreditam no que ele fez. O pai está desesperado. Só fala nele, em por que que ele foi fazer isso? Ele vai ter que pagar o que fez. É irmão de sangue, mas a gente não está a favor dele. A tristeza que ele foi trazer para a família inteira —desabafa, emocionada, a irmã.
Assim como a família, os colegas de trabalho e os vizinhos do bairro Serrano não desconfiaram que Souza poderia estar cometendo algum crime. Pelo contrário, na empresa disseram que a conduta dele era irrepreensível e, na comunidade, uma pessoa tranquila e trabalhadora.
Família enfrenta dificuldades
No final da manhã da última terça-feira, quando a família recebeu a reportagem, repousava sobre a mesa da cozinha, a polenta, recém retirada do fogão a lenha, que serviria de refeição com mais algum alimento que a irmã prepararia para aquele almoço. Na pequena casa de madeira de uma única peça, com divisória para um quarto, e um anexo onde fica um segundo quarto, vivem o casal, os quatros filhos e o neto. Já passava do meio-dia, quando o trio mais novo chegou da escola.
A família vive com um salário mínimo recebido de aposentadoria pelo idoso e outro decorrente de benefício recebido pelo caçula que tem problema de saúde. Além disso, a irmã recebe R$ 124 do programa Bolsa Família. Num total de pouco mais de R$ 2 mil.
A mãe, aos 52 anos, e com problemas de saúde, já não lembra mais dos detalhes da vida da família, confunde datas e parece imersa em um universo protegido do sofrimento que a vida lhe apresenta. O pai, de idade ainda mais avançada, e com saúde debilitada ainda tenta entender o que aconteceu com o filho.