Somados, os bairros Rubem Berta e Mario Quintana concentram 17% dos assassinatos de Porto Alegre ocorridos desde 2011, segundo o Raio X da Violência. Não é coincidência que pelo menos dois dos piores índices de desenvolvimento humano municipal (IDHM), que leva em conta aspectos como a longevidade, habitação e educação, estejam em locais como o Loteamento Timbaúva (Mario Quintana) e a Vila Amazônia (Rubem Berta).
— Onde o Estado é ausente, não apenas falando em segurança, mas principalmente em ações efetivas de prevenção e comunitárias, o tráfico ocupa espaço. Mas é importante não pensar só em território, mas em territorialidade. Dependendo da atividade delitiva, como por exemplo o roubo de carros, esse grupo que tomou conta avança para outras regiões geográficas da cidade também — aponta o sociólogo Francisco Amorim, integrante do Grupo de Estudos de Violência e Cidadania, da UFRGS.
Em outubro do ano passado, a adolescente Gisele Lonczynsky, 15 anos, foi encontrada morta com um tiro na cabeça na Estrada Martim Félix Berta, no bairro Mario Quintana. Nesse bairro, pelo menos 24 mulheres foram assassinadas desde 2011. São 12,3% dos homicídios do local. Uma proporção bem maior que os 7,07% de toda a cidade.
Conforme a investigação da 5ª Delegacia de Homicídios de Porto Alegre (DHPP), a menina havia sido atraída para uma emboscada em uma "social" (festa a céu aberto) por integrantes da facção criminosa que controla o tráfico de drogas no local onde os pais recentemente haviam aberto uma lancheria. Segundo a investigação, a adolescente foi julgada e condenada pelos criminosos. Eles acreditavam que ela repassava informações do bando para uma facção rival, que atua em outro ponto do mesmo bairro.
Se na periferia as facções exercem poder sobre territórios, não significa que, na região central, o Estado garanta a ausência delas.
— Quando as disputas entre grupos criminosos rivais fica mais violenta, a tendência é de que outros crimes praticados por eles também fiquem, como, por exemplo, os roubos que resultam em latrocínios. Nos últimos anos, crescem os homicídios e também os latrocínios, não necessariamente em territórios controlados por facções — afirma o sociólogo.
Por isso, Amorim ressalta que não basta a prioridade do poder público no investimento preventivo, de médio e longo prazo, mas também com investimento pesado, e urgente, no policiamento qualificado.
— A investigação policial precisa receber toda a prioridade para desarticular com qualidade e eficiência essas redes criminais. Do contrário, o investimento preventivo, se funcionar, se torna inócuo — aponta.
Para o economista Daniel Cerqueira, o Estado é um dinamizador da violência ao criar as cidades partidas, com muitas disparidades sociais.
Se o rendimento médio do responsável pela casa, no Mario Quintana, conforme o IBGE, é de 1,6 salário mínimo, no bairro Petrópolis, por exemplo, é de 10,7 salários. O carro usado para matar Gisele havia sido roubado em Porto Alegre. Os modelos mais cobiçados estão justamente onde menos ocorrem assassinatos na cidade, mas metade dos latrocínios que ocorrem na Capital são resultado de roubos de veículos. No Petrópolis, pelo menos quatro pessoas foram vítimas de latrocínios desde 2011. São 28,5% dos 14 assassinatos registrados no bairro nesse período. Em toda a metrópole, os latrocínios correspondem a 3,7% das mortes.