A leishmaniose é uma doença infecciosa causada por protozoários do gênero Leishmania. Considerada uma doença endêmica no Brasil (90% dos casos viscerais da América Latiana são registrados no nosso país), está presente em todos os Estados e é transmitida pela fêmea do mosquito flebotomíneo, conhecido popularmente por mosquito-palha, birigui, tatuquira ou cangalha.
Trata-se de uma zoonose, denominação das doenças que são transmitidas pelos animais aos seres humanos. Todos os casos suspeitos precisam ser comunicados às autoridades sanitárias municipais para que haja um controle da proliferação de contaminações.
De acordo com o infectologista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Valdir Sabbaga Amato, é uma doença plural: existem várias espécies de parasitas e por isso há mais de uma maneira de contrair a leishmaniose, que pode ser tegumentar ou visceral.
Leishmaniose tegumentar
Divide-se em duas formas clínicas, a cutânea e a mucosa. A primeira afeta a pele, enquanto a segunda atinge nariz, boca e orofaringe, que é parte da garganta logo atrás da boca.
Leishmaniose visceral
Considerada a forma mais grave da doença, compromete fígado, baço, medula óssea e alguns outros órgãos.
Número de casos
Dados recentes do Ministério da Saúde (MS) mostram que são registrados cerca de 3,5 mil casos de leishmaniose visceral e 21 mil casos de leishmaniose cutânea e mucosa por ano. As crianças são a faixa etária mais acometida com a patologia. No Rio Grande do Sul, de acordo com o Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), de 2011 a 2022, houve 53 casos confirmados de leishmaniose visceral em humanos. Sete deles evoluíram para óbito.
—A leishmaniose é um problema de saúde pública importante. Porque atualmente a forma visceral, que nos anos 1950 e 1960 ocorria na zona rural, está urbanizada. Está sendo transmitida dentro das cidades — destaca o infectologista e professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Marcelo Simão Ferreira.
Causas
A forma predominante de transmissão é pela picada do mosquito. Em raros casos pode acontecer uma transmissão genética, quando a mãe contrai a doença durante a gestação. Alguns casos de contágio por transfusão de sangue já foram registrados também, mas são mais raros ainda. Segundo Ferreira, que também é ex-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), 99% dos casos são decorrentes da picada do inseto.
Porém, para haver a transmissão é necessário que haja reservatórios do parasita, que podem ser selvagens ou peridomésticos.
— Vários animais na natureza como raposas, gambás, bichos-preguiça podem portar o protozoário. Quando o homem entra na mata e acessa um local onde existe transmissão entre os animais, ele é acidentalmente picado pelo mosquito e adquire a doença — explica Ferreira.
O ser humano também pode ser o seu próprio reservatório. Se tiver uma lesão na pele com a presença de parasitas, o mosquito pode captar o sangue dali e transmitir para outra pessoa. Além disso, na forma visceral os principais reservatórios do parasita são os cães domésticos.
Sintomas
Cada forma clínica da leishmaniose tem sintomas próprios. Na cutânea, o principal indício é o surgimento de úlceras na pele com bordas elevadas e fundo granuloso, geralmente indolor. Na forma mucosa, as feridas irão se concentrar na região do rosto. Nestes casos, os sinais são: entupimentos nasais, sangramentos, coriza, aparecimento de crostas, dor ao engolir, rouquidão e tosse.
Já na leishmaniose visceral, os principais sintomas são febre prolongada, perda de peso repentino, falta de apetite, anemia e um aumento de volume do fígado e do baço. É possível notar o aumento dos órgãos pelo tamanho do abdômen, que cresce para comportar o inchaço das vísceras. O infectologista da USP explica que essa forma clínica evoluiu gradativamente, portanto os sintomas vão aparecendo e progredindo lentamente. A variação de tempo para chegar a complicações pode ser de dois a oito meses.
Diagnóstico
Com o diagnóstico precoce, além de aumentar a chances de cura, as sequelas também são reduzidas. A avaliação é feita de maneira clínica ao examinar os sintomas e feridas da pele, por exemplo. Também é necessário realizar exames laboratoriais para confirmar a presença do protozoário no organismo. Os tipos de exames feitos são o de pesquisa em busca do parasita na medula óssea, o sorológico para detectar a presença de anticorpos no sangue e testes rápidos, como os feitos em suspeita de hepatites e aids.
Celebrada anualmente no período que inclui o dia 10 de agosto, a Semana Nacional de Controle e Combate à Leishmaniose tem como objetivo justamente chamar atenção para o diagnóstico.
— Muitas vezes os médicos não pensam nesse diagnóstico. Isso acontece porque antes os mosquitos preferiam climas quentes e úmidos, e os casos se concentravam no norte e nordeste do país. Mas o clima mudou, eles se adaptaram e chegaram a outras regiões recentemente — diz Amato.
Tratamento
Existe tratamento para todas as formas de leishmaniose e, de acordo com os especialistas, essa etapa é fundamental para a doença não ser fatal. Sem tratamento todos os pacientes com leishmaniose, principalmente a visceral, vão evoluir para óbito.
A base do tratamento é através de remédios, todos disponíveis pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O uso das medicações não é contínuo e pode variar de paciente para paciente.
Na cutânea, o medicamento é usado diretamente nas lesões. Já para a mucosa e visceral, os remédios são injetados no sangue. Ainda há a possibilidade de utilizar alguns medicamentos orais. A indicação vai depender das condições clínicas de cada paciente.
Tanto os pacientes com leishmaniose cutânea quanto mucosa evoluem bem com o uso da medicação. Já na forma visceral, apesar do tratamento, há uma taxa de mortalidade entre 5% e 10%, conforme Ferreira.
* Produção: Rochane Carvalho