Solange Lompa Truda (*)
Muitas coisas mudaram na educação infantil frente aos movimentos de um novo contexto social. Observamos claramente uma nova concepção de infância, de pais mais atentos às necessidades infantis, respeitando as curiosidades e os interesses de seus filhos, e preocupados em garantir um tempo de qualidade para o seu desenvolvimento.
Aparecem cada vez mais a importância do brincar para desenvolver o potencial infantil e uma educação voltada para um mundo mais respeitoso, que garanta conexões afetivas, que estimule a criatividade e a imaginação dos nossos pequenos.
No entanto, estamos numa era digital onde as novas tecnologias atravessam o nosso cotidiano, e nossas crianças parecem já "nascer com chip", mudando também a sua forma de brincar e atuar na realidade. Encontramos muitas crianças que não sabem brincar de amarelinha, de bolinhas de sabão ou de esconde-esconde. Algumas brincadeiras foram substituídas pelos jogos de vídeo game, smartphone e tablet, perdendo a atenção afetiva e a troca com o outro na interação.
As escolas de educação infantil têm o enorme desafio de criar diferentes oportunidades e espaços para nossas crianças atuarem de forma criativa no mais importante direito da infância: o brincar.
Percebemos que existe a necessidade de pais e escolas constituírem uma parceria na qual a criança esteja sendo interpretada, tanto em casa como na sala de aula, como um ser em constante desenvolvimento, com necessidades e características próprias, oferecendo a ela situações de aprendizagem que sejam significativas, contribuindo para sua formação integral e bem-estar da sua saúde emocional.
Mas e se paramos para questionarmos os pais e educadores sobre o brincar? E quanto ao cantar? Quanto à leitura de histórias infantis?
No decorrer da nossa prática profissional, cada vez mais observamos a necessidade dos pais e educadores garantirem esse direito do brincar a criança. Não é fácil, na correria dos nossos dias, garantirmos um tempo de qualidade para brincar ou jogar com nossos filhos. Mas nos esforçamos, estamos dispostos a participar de momentos de integração na escola, onde interagimos com as crianças em inúmeras brincadeiras e outras possibilidades oferecidas.
Quebrar barreiras da realidade
A brincadeira é muito mais do que simples passatempo. Brincar é um recurso fundamental para o desenvolvimento saudável da criança.
Observamos nas escolas inúmeras manifestações por parte dos educadores no momento do brincar: existem aqueles que preferem ficar alheios ao brinquedo, mas atento a reconhecer elementos importantes que a criança mostra no jogo; outros que preferem deixar as crianças mais livres, sem a sua intervenção; e outros ainda que brincam e interagem com as crianças e são capazes de esquecer do restante, entrando na fantasia e no imaginário infantil.
Seja qual for a forma que interagimos com a criança, o que importa é ter a clareza de que é no brincar que a criança se expressa e desenvolve habilidades fundamentais para sua saúde emocional. É através do brincar que permitimos importantes conexões e trocas afetivas.
Quero citar aqui o pediatra e psicanalista Donald Winnicott, que em seu livro O Brincar e a Realidade diz que "o brincar possibilita à criança quebrar barreiras da realidade, viver uma experiência, e é uma forma de viver, transitando entre o subjetivo e o objetivo. Entre o mundo interno e o externo, entre o real e o imaginário".
Fica aqui o desejo de que possamos aproveitar o final de semana para brincar muito com nossas crianças, valorizando a brincadeira, a diversão e espaços de interação que gerem conexão, construindo relacionamentos saudáveis e boas memórias afetivas da infância.
(*) Psicóloga escolar e psicoterapeuta da infância e da adolescência